Jaqueline 16/06/2012Atenção: esta resenha pode conter spoilers para quem ainda não leu "Destino", obra que dá início a série de mesmo nome.
Sequência do sucesso distópico "Destino", "Travessia" é o lançamento do mês de Junho da editora Suma de Letras. Depois de um primeiro livro tão marcante, confesso que fiquei um pouco decepcionada com esta continuação, principalmente em decorrência da mudança de cenário e da própria situação do livro - uma obra de passagem, ou simplesmente de construção, para um novo rumo da trilogia.
Na saga criada pela americana Ally Condie, a Sociedade - grupo que governa a população - proporciona uma vida confortável e segura aos Cidadãos exercendo um extremo controle da vida cotidiana de cada pessoa. Seu emprego, suas formas de lazer, sua alimentação e até mesmo seus sonhos são monitorados e regulados pelo Estado. Apesar de toda essa rigidez, as pessoas seguem suas vidas completamente satisfeitas - ou era isso o que Cassia, a nossa corajosa protagonista, pensava.
Após descobrir o lado sujo da Sociedade, com toda as injustiças, mentiras e crueldades que a mantem soberana, Cassia partiu em busca de Ky nas Províncias Exteriores, um local onde jovens anômalos são enviados para a morte por ordens da Sociedade. Porém, além de buscar aquele que lhe ajudou a abrir os olhos para enxergar o mundo como ele verdadeiramente é, a nossa mocinha tem um outro objetivo, alimentado desde a morte de seu avó: descobrir mais sobre as pessoas que não aceitaram as normas da Sociedade e formaram a Insurreição.
O desenrolar da história de "Travessia" se passa nas Províncias Exteriores, uma região desolada e repleta de cânions que há muitos anos abrigaram as pessoas que há muitas décadas atrás escolheram não fazer parte da Sociedade, mantendo-se à margem das regalias e mentiras que sustentam essa forma de organização social. Lá, a vida é dura e as pessoas morrem cedo, sejam pelos mal-tratos da natureza ou pelos ataques da Sociedade, que polui rios e massacra agricultores apenas porque eles se recusam a viver dentro dos limites esperados. Segredos ganham vida quando pistas sobre a Insurreição surgem a cada capítulo, e esse foi o aspecto que mais chamou a minha atenção durante toda a leitura.
Diferentemente do primeiro livro da série, este livro é narrado em pontos de vista alternados entre Cassia e Ky. Essa mudança me agradou, mesmo fazendo com que eu detestasse certos aspectos da personalidade do garoto. Descobrir suas motivações, medos e anseios teve um efeito ambíguo em mim: sim, foi bom desvendar um pouco mais sobre sua família e seu passado, mas seus receios e convicções me decepcionaram muito, principalmente quando eles entraram em choque com os objetivos de Cassia, uma vez que esses conflitos consomem a maior parte do livro. Em vários momentos eu apenas torcia para que o bonzinho Xander voltasse logo, especialmente depois que um segredo muito perigoso sobre o melhor amigo e primeiro Par de Cassia veio à tona, o que me fez vibrar sozinha de tanta empolgação. De qualquer modo, a resolução deste estranho triângulo amoroso ainda me parece distante, uma vez que resta apenas mais um livro programado pela escritora para finalizar esta série e o final de "Travessia" se mostra inconclusivo em relação a isso.
O ritmo da narrativa é um pouco mais frenético do que no seu antecessor, mas isso não se consagrou como um grande diferencial para mim: o aumento da carga dramática do livro no meio "do nada" me pareceu sem propósito e eu senti falta de um foco maior nas maquinações da Sociedade, como os ataques aos jovens inocentes das Províncias e o monitoramento que ela mantem até mesmo sobre as anomalias. Com novos personagens, como a misteriosa e esperta Indie, e um cenário "à parte" da Sociedade, eu achei este livro estimulante e bem interessante, mas só isso. Em grande parte, isso foi causado pela minha alta expectativa, mas eu também senti falta daquilo que me cativou durante a leitura de "Destino": a engenhosidade da própria sociedade distópica criada pela autora.
>>Resenha publicada no site www.up-brasil.com