Lê Golz 28/09/2018Existem diversas formas de escravidão e apenas uma de liberdade!Sempre quis ler os livros de Francine Rivers e começar por esse livro foi a melhor escolha. Uma voz ao vento é o primeiro livro da trilogia A marca do Leão. Trata-se de uma ficção cristã, então obviamente agradará ao público que gosta do gênero, embora deva ser lido por todos, conforme a intenção da autora. Não irei me estender na descrição da história, já que a sinopse nos revela o que nos aguarda na leitura.
O livro é dividido em quatro partes conforme a passagem dos personagens em cada território: Jerusalém, Germânia, Roma e Éfeso. A narrativa é feita em terceira pessoa e os capítulos divididos inicialmente entre a história de Hadassah e a família Valeriano e Atretes. Histórias tão diferentes, mas que irão se unir conforme os propósitos de Deus.
"Tenho medo de dizer que eles estão errados e que eu estou certa. Quem sou eu além de uma escrava? Como posso explicar que sou a única livre, e que são eles os cativos?" (p. 237)
" (...) Oh, Marcus, você não pode esculpir Deus numa pedra. Não pode limitá-lo a um templo. Não pode aprisioná-lo no topo de uma montanha. O céu é seu trono; a Terra, o banquinho para acomodar seus pés. Tudo que você vê é dele. Impérios se erguerão e cairão. Só Deus prevalecerá." (p. 303)
A autora narra com riqueza de detalhes, sem tornar a leitura cansativa, o cenário dessas cidades setenta anos depois de Cristo. As descrições e as influências culturais na vida dos personagens foram tão bem desenvolvidas, que é perceptível em toda a obra, a pesquisa minuciosa de Rivers para escrever esse livro. A destruição de Jerusalém e o império romano em sua decadência espiritual. Confesso que acrescentar esse teor histórico tão rico aumentou minha expectativa em avançar as páginas. Embora, alguns capítulos iniciais possam tornar a leitura mais lenta.
A construção dos personagens foi de longe o melhor desse livro! Hadassah é a pureza em pessoa e possui a fé mais inabalável. Marcus, lindo, rico e vive para seus prazeres mundanos. Julia é um poço de egoísmo e busca incansavelmente por uma felicidade que nunca encontra. Febe e Décimo, pais de Julia e Marcus, apesar de terem tudo ao seus pés, escondem um vazio dentro de suas almas que nenhum de seus deuses de pedra podem preencher. Atretes, um bárbaro de sua tribo, vive a agonia da escravidão que o prende nas arenas e sonha com a liberdade. É incrível a sensibilidade da autora em dar vida ao seus personagens, sejam eles protagonistas ou secundários. Eles são críveis, eles podem ser eu ou você. A vida de todos esses personagens, entre outros não citados, se enlaçam de uma maneira perfeita, trazendo salvação e também destruição.
O mais tocante e inspirador em Uma voz ao vento é o que Rivers nos ensina através de Hadassah - uma judia-cristã que teme levar a Boa-Nova de Cristo em um tempo que ser cristão era crime e poderia custar sua vida. Ela também luta com seu próprio coração para resistir a esse amor que cresce a cada dia por Marcus, não apenas pela diferença social, mas principalmente pela incredulidade dele. Eu, particularmente, achei lindo como o amor de ambos foi crescendo aos poucos, especialmente por ver como um sentimento verdadeiro pode quebrar as barreiras do coração mais indiferente. Ficamos na torcida para que Marcus perca sua cegueira espiritual. Não espere aqui um romance água com açúcar ou um conto de fadas. Como citei, os personagens e as situações são críveis demais e é isso que torna o livro tão incrível. Deus tem caminhos muito misteriosos para nos aproximar dEle.
O livro traz muito sobre o cenário de Roma daquela época - um cenário bem semelhante aos tempos de hoje diga-se de passagem. Então veremos como os inúmeros prazeres sexuais, a ânsia por sangue humano nos jogos na arena, deuses de pedra (incontáveis) e muita manipulação estavam enraizados no império romano. E fiquem tranquilos, pois a autora não traz descrições explícitas sobre a sexualidade.
Uma voz ao vento foi minha melhor leitura de 2018 e afirmo com antecedência que nenhum livro ocupará esse posto até o final do ano. Uma história sobre colocar a boa e agradável vontade de Deus acima da nossa, sobre o porquê vale a pena viver. Sobre as diversas formas de escravidão que existem e apenas uma de liberdade. Sobre olharmos para nossa própria fé - Hadassah é o exemplo de cristão que estamos nos esquecendo de ser hoje. Um livro lindo e inspirador com um desfecho que me levou as lágrimas. Um desfecho que nos angustia, mas também nos enche de esperança em nossa fé, assim como nos deixa ansiosos para acompanhar a jornada de Marcus no próximo volume. Só leiam!
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