Fernanda631 23/01/2023
Perdão, Leonard Peacock
Perdão, Leonard Peacock foi escrito por Matthew Quick e foi publicado em 13 de agosto de 2013.
A história é um pouco forte. Basicamente, trata-se do seguinte: Leonard, um adolescente, quer matar seu ex-melhor amigo (atual colega da escola) e, em seguida, se matar ambos com uma P-38, herdada do avô que combateu os nazistas. Neste mesmo dia, ele entregará presentes para algumas pessoas e reviverá memórias dos bons e maus momentos que tiveram, chegando na justificativa de seu homicídio e suicídio.
Mas, antes de tudo, ou seja, cometer 2 ações que mudará a vida de muitas pessoas, ele quer deixar algumas lembranças para as pessoas de quem mais gosta. Nisso, inclui-se a mãe, que não dá muita bola para ele, e um velho amigo, com quem passa todas as tardes vendo filmes com seus atores preferidos.
No começo, fiquei um pouco confusa porque Leonard não diz o motivo pelo qual quer se suicidar e matar o ex-amigo. No meio do livro, ele conhece uma menina que o encanta bastante e aí as coisas mudam. Um professor de sua escola também o ajuda.
Acredito que ao mesmo tempo em que devemos agradecer por termos saído ilesos do ensino médio, também temos que cuidar daqueles que carregam grandes sequelas causadas pelo abuso e por bullying tão comum entre os jovens. Para muitos o ensino médio, ou o período escolar como um todo, é extremamente cruel.
Portanto, gosto de livros que falam sobre as típicas dificuldades de um jovem adulto e incitam no leitor a vontade de mudar e de refletir sobre suas ações. Assim, é claro que estava com altas expectativas para a leitura de Perdão, Leonard Peacock.
Afinal, Matthew Quick promete discorrer sobre temas complexos e dolorosos que podem levar um jovem a cometer o suicídio – o que por si só foi capaz de alimentar minha curiosidade. Entre grandes expectativas e muitas surpresas, a história do jovem Leonard cumpriu o prometido e, além de me ensinar valiosas lições, foi capaz de marcar meu coração.
Leonard seria um adolescente como qualquer outro: não é o aluno mais brilhante, também não é o mais popular, muito pelo contrario, ele é absolutamente normal. Não fosse o fato de ter experiências em sua vida que o fazem se questionar constantemente se vale a pena ainda continuar a viver.
A trama gira em torno do aniversário de dezoito anos do Leonard Peacock, dia em que ele decidiu matar um colega de escola – um valentão cruel disfarçado de popular – e se matar.
O livro se passa basicamente em 24 horas: nesse tempo nós vemos a vida através dos olhos de Leonard e todas as nuances e momentos que o levaram para o exato momento em que ele está: é o dia do seu aniversário (que absolutamente ninguém lembrou) e ele não está apenas decidido a acabar com a própria vida, mas também levar junto com ele o seu algoz: Asher, que um dia foi seu melhor amigo e hoje é a pessoa que mais causou mal a Leonard.
Durante o dia, Leonard vai lembrando as coisas e explicando aos poucos, sem nenhuma romantização dos fatos, tudo que aconteceu enquanto ele procura as pessoas que ele ama para se despedir e deixar lembranças para que saibam que ele se importava com elas, apesar de escolher aquele final tão infeliz para si próprio, mas ao mesmo tempo tão libertador.
A grande pergunta é: Leonard conseguirá alguma ajuda para sair do buraco de dor onde se encontra e talvez assim resolver seguir sua vida ou realmente ninguém se importa com ele ao ponto de não se darem conta do que o garoto pretender fazer?
Nessa obra nós vemos um garoto sofrendo por tudo que aconteceu no passado e o que acontece ainda no presente (como o fato da mãe dele ser completamente relapsa ao que acontece com ele) e ao mesmo tempo temos um vislumbre do que ele poderia ser no futuro, se ele se permitisse viver: e isso é uma tarefa do colégio, o professor favorito dele fez com que todos os alunos escrevessem cartas para eles mesmos como se fossem personagens de um futuro, pessoas que eles ainda encontrariam na vida e que fariam toda a diferença quando a escola acabasse e tudo aquilo ali ficasse para trás.
A narrativa mescla: o dia que Leonard está tendo e a forma como ele se despede de algumas pessoas importantes, memórias do personagem sobre fatos e dias fundamentais para sua formação, o passar das horas e o esperado momento em que ele espera atirar no seu alvo e depois explodir seus próprios miolos, e algumas cartas de pessoas do futuro que conhecem Leonardo e apelam para que ele tenha fé e não se mate.
Inicialmente, intercalada entre fatos e memórias, a narrativa aparenta ser ilógica e confusa. Entretanto, conforme vamos mergulhando na mente do protagonista, descobrindo os motivos por trás de sua vontade de cometer suicídio e enxergando nele seus verdadeiros medos e anseios, passamos a amar a história e cada um de seus mistérios. – Por que será que Leonardo quer se matar? Por que ele quer matar apenas um determinado colega da escola? E, a pergunta principal, será que ele terá coragem de colocar seus planos de suicídio em prática?
O interessante na narrativa é interpretar os apelos por trás da figura de Leonard. Desde o começo senti que o suicídio foi escolhido pelo garoto como válvula de escape, como fuga da solidão, do abandono e desprezo da mãe, dos traumas do passado, e do medo do futuro não melhorar. Portanto, ficou fácil perceber que Leonard está buscando, com todas as forças, um motivo para ter esperança. Mesmo no fundo do poço ele quer acreditar que o futuro será diferente, o problema é que ninguém parece se preocupar o suficiente com ele para conceder ao jovem uma migalha de fé no amanhã.
Essa característica, sem dúvida, foi o que mais me marcou: os apelos silenciosos do protagonista, sua forma simples e direta de ver a vida, e suas tentativas desenfreadas de lutar por algo ou por alguém, por qualquer coisa semelhante à felicidade. Leonard me deu várias lições; ele me ensinou a valorizar a vida, a aproveitar cada dia que me é dado, a enxergar o quanto a vida é limitada e o quanto é fundamental fazermos o que realmente amamos (principalmente quando o assunto é trabalho), e reavivou em mim a importância de respeitarmos e entendermos às diferenças.
Leonard é o tipo de personagem que nos faz refletir, mudar e enxergar nossas falhas.
Leonard julga o mundo adulto como infeliz e para ele os sacrifícios que passa na juventude não valerão ao crescer. Quando isso ocorre somos convencidos a querer entrar no interior de mais um jovem suicida. O dizer de querer se matar não é o suficiente para nos saciar até o final, tal como de querer matar. Mas o desenvolvimento que se cria explorando razões para viver, não só nos pensamentos e diálogos, mas nas ações da história, é o que nos faz não fechar o livro.
O autor consegue nos apresentar, com firmeza, um jovem instável e nos prender até o fim da história não mais pela curiosidade em saber o que levou Leonard às suas decisões, e sim se ele encontrará um motivo que o convença a querer ser adulto. O que o faria valer aguentar as dores da juventude?
Esta busca que fazemos nas memórias de Leonard, para aqueles que presenteia, é nossa maneira de tentar achar um motivo convincente para ele continuar. Só que Matthew Quick sabe construir um ritmo, e em cada página sentimos o dia do aniversário passar e o tempo acabar, nos levando ao ato mais esperado. E se nem Leonard ou o leitor acharem um motivo suficiente para lhe convencer de viver até este ato, criará uma tensão perigosa, melancólica e lamentável quando o momento chegar.
Após inúmeras formas que procuramos, chegamos ao fim da noite. Grandes tragédias se passam num único dia. Neste momento conclusivo, a introdução faz jus. Sabemos que nosso personagem ouve mais a si mesmo do que a qualquer outro.
O autor nos joga as cartas mais procuradas para ajudarmos Leonard, ele nos dá um arsenal de meios, através das memórias do protagonista. Portanto, ao mesmo tempo que conseguimos pensar em formas de ajudar Leonard, a obra tenta respondê-lo de acordo.
Além de um protagonista emocionante e verdadeiro (até mesmo em suas falhas), o livro aborda temas importantes como preconceito, bullying, abandono familiar e suicídio. E o bom é que o autor fala sobre tais assuntos com propriedade e simplicidade, mostrando ao leitor os fatos sem rodeios e meias-verdades; e é disso que precisamos, de livros que falem sobre experiências negativas sem romantização ou dramatização excessiva. Amei essa característica do livro, assim como amei sua narrativa.
O livro não discute de maneira declarada a questão de adolescentes armados nos EUA, embora toda a composição da história só seja possível graças a este contexto. O suicídio não é vindo a jogo como uma doença que Leonard desenvolveu, ele vem como resposta a buscar de um motivo que faça valer a pena crescer infeliz. E a vontade de matar Asher relaciona questões que inúmeros jovens passam, e que quando revelada, não vem para seduzir o leitor a favorecer o homicídio-suicídio, mas para nos deixar sem palavras, recorrendo, quem sabe, à fé como meio de salvar Leonard.
No fim, ficamos reféns de que Leonard tome uma decisão. Depois de tantos esforços da nossa participação na história entendemos não ter autoridade, percebemos que o garoto pode estar realmente sozinho e voltamos a ser meros leitores, esperando que um protagonista fictício deseje viver.
O único defeito da obra é o final. Já sabia (ou melhor, tinha quase certeza) como seria o desfecho, portanto não foi a previsibilidade que me irritou, mas sim a maneira abrupta da narrativa terminar. Claro que o autor fez seu ponto e respondeu parte de nossas perguntas, mas sinto que merecíamos saber mais – não só para saciar a curiosidade do leitor, mas também para auxiliar outros jovens na mesma situação.