Faty. 05/06/2024
Aline Bei me pegou. Li seus livros num curto intervalo de tempo, de forma imersiva, apaixonada, como quem devora o alimento de que precisava para sobreviver. Na solidão de suas personagens vi que não estou, afinal, tão só.
O peso do pássaro morto é um livro sobre alguém que se constrói na dor, na solidão e em meio a mortes. A personagem sem nome está sempre às voltas com esse morrer um pouco por dia e as vezes um tanto de uma só vez.
Fiquei me perguntando do porque Aline ter escolhido não nomeá-la e mesmo certa de que ela possivelmente já respondeu a essa pergunta em algum canto, me atrevo a interpretar à minha maneira: nomear é dar vida, dar corpo, dar sopro a algo/alguem, colocá-la no mundo, inseri-la em alguma parte. Mas tive a impressão de que aqui acompanhamos décadas, nesse romance de formação, de alguém que esteve sempre à deriva, sem chama que lhe vibrasse às entranhas, sem um lugar, sem companhia, sem parte alguma. De forma que, ainda que se passe os dias e ela exista, talvez lhe falte algo de vida.
Aqui acompanhamos a vida de uma criança que se defronta algumas vezes com a morte e é destroçada por ela. Sem saber como elaborá-la, vai deixando aquela singeleza própria das crianças e conforme cresce, se depara com outras ?mortes?, diferentes, mas talvez ainda mais violentas e traumáticas. A perda é uma constante.
Não chorei lendo, mas, pior, senti aquele nó na garganta de quem lê a solidão nas páginas de um livro. Um livro que fala sobre o luto, sobre bullying, sobre fé e a perda da fé, também sobre violência contra as mulheres e como suas consequências podem nos acompanhar por toda a vida e, ainda, sobre o peso de algumas maternidades. Um livro pra se ler com cuidado, com alerta de gatilho para assuntos delicados. Cheguei ao fim sem palavras.
Eu que tenho descoberto amar a prosa poética, encontrei na autora uma amiga, a leio como quem lê as cartas de alguém que se tem bem próximo. Ansiosa por seu próximo livro.
Tenho com a Aline Bei, as histórias viscerais de que tanto procuro. Uma autora já aclamada, mas que me foi uma surpresa. Grata surpresa.