O último voo do flamingo

O último voo do flamingo Mia Couto




Resenhas - O Último Voo do Flamingo


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Daniel 11/11/2016

Mia Couto e A Arte de Narrar o Inenarrável Africano
Em O Último Voo do Flamingo, Mia Couto, através de uma linguagem bastante poética e que visa apresentar, sem desvendar, os mistérios das histórias africanas, nos revela uma narrativa ambientada em Tizangara, após a guerra de Independência. O governo, tentando desvendar os mistérios das mortes que rondam o pequeno vilarejo, vai aos poucos colocando os participantes em mais mistérios ainda. Mistérios esses que envolvem as lendas e as histórias que são passadas e repassadas através das gerações. Assim, gera-se um conflito entre os habitantes locais, já acostumados às coisas que sempre acontecem de sobrenatural em sua terra; e os forasteiros, estrangeiros enviados à Tizangara para tentar desvendar os mistérios da localidade, que se acentua, quando eles entram em contato. Dessa maneira, Mia Couto constrói uma narrativa sólida, poética e cheia de tipos representativos da cultura moçambicana.
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Marcus Vinícius Sales 10/04/2016

"Fiscal do horizonte"
Mia Couto é inegavelmente um ótimo escritor. É possível chegar a essa conclusão, mesno só tendo lido uma obra sua. "O último vôo do flamingo" é um livro de passagens. O que significa isso? Um livro em que o autor dedica especial atenção a trechos, pontuando a obra com verdadeiras pérolas literárias. Ocorre, entretanto, que não se consegue bem desenvolver a história ficando, justamente, marcado, mais pela beleza de dados trechos e seguimentos do que a coesão integral da narrativa.
Me pareceu, algumas vezes, que o autor não sabia ao certo para onde conduzir sua história, que se apóia no realismo fantastico e os estranhíssimos acontecimentos (ou desacontecimentos, como fala o povo de Tizangara) para discutir a seu modo a visão dos colonizados pelos colonizadores, o retrato de uma África com seus ressentimentos, belezas e peculiaridades
Mia falhou um pouco nesse sentido. Poderia ter construído sua história de modo a não ficar tão presa à fina ironia.
Um bom livro, no qual depositava maiores esperanças.
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DIRCE 01/03/2016

Valioso, mágico e simbólico
Brincando com as palavras, ora me levando ao riso com seu humor ácido, ora me deixando intrigada e ora curiosa, Mia Couto , mais uma vez, me proporcionou uma leitura de indiscutível valor literário e muito simbólica.
O livro se abre com uma espécie de prefácio, um tanto quanto solene, que me levou a pensar: se havia algo de podre no reino da Dinamarca, o mesmo se pode dizer em relação a Tizangara (MOÇAMBIQUE ). De fato: sim, havia algo de muito podre em “Ti-zangara” e tudo começa com as explosões dos boinas azuis – os fazedores de concórdias: força de paz da ONU. Mas teria mesmo explodido os fazedores de concórdia? Quem seriam os responsáveis? É a interrogação que nos acompanha durante toda a leitura e que cria certo suspense. Mas esse não é o objetivo do Mia Couto: fazer uma obra de suspense. Sua intenção era denunciar a corrupção que assolava o país e essa denúncia se inicia de modo, no mínimo, curioso. Chegaram a conclusão que os capacetes azuis tinham explodido porque foram encontrados capacetes azuis e órgãos genitais que não seriam de nenhum homem de Tizangara. Significativo. Seria os órgãos genitais uma metáfora do modo que o país foi violentado? Bem provável.
Mia Couto impregna as páginas com o realismo mágico o que torna a obra mágica, principalmente quando o narrador evoca a estória que sua mãe contava sobre o flamingo e o seu vôo que deu origem ao primeiro poente. E é o flamingo quem deixa entrever a esperança na desesperança de um povo que foi castigado pelo deus diante das corrupções, das guerras, da manutenção da miséria em prol do proveito próprio e que por isso pagou um alto preço.
Terminei “O último vôo do flamingo” , melancólica, pois não pude deixar de pensar no nosso Brasil. Pensei de como ele foi transformado em um jeito tão Tizangara de ser. Ouviremos uma “ canção” que nos permitirá acreditar que sairemos do abismo que nos colocaram? Qual o preço que teremos que pagar?
Eu quero atribuir a essa obra 27 estrelas, tal qual o número de estrelas existentes na nossa Bandeira, desejosa que elas se tornem "a nossa canção" de dias melhores.
Nanci 02/03/2016minha estante
Que bonita resenha, Dirce.
Até agora, esse é meu romance favorito do Mia Couto. Mas estou ansiosa pela continuação de Mulheres de cinzas.




Rodrigo 06/01/2016

Um mergulho na África
Numa pequena vila de Moçambique soldados de paz da ONU misteriosamente começam a "explodir", porém não no sentido literal. Um missionário italiano é enviado para investigar os acontecimentos e tenta entender aquela realidade tão diferente da sua. Uma estória muito interessante que desnuda um pouco dos países africanos numa era "pós-colônia", nos levando a uma crítica sobre a real dimensão de suas independências.

O estilo de Mia Couto é bem fluido, muito boa a leitura! A seguir algumas passagens que destaquei:

-A guerra ja chegou outra vez, mãe?
-A guerra nunca partiu, filho. As guerras são como as estações do ano: ficam suspensas, a amadurecer no ódio da gente miúda.

...esses chefes deveriam ser grandes como árvore que dá sombra. Mas têm mais raiz que folha. Tiram muito e dão pouco.

Regressei à minha velha casa, e ali, sob a sombra do tamarindo, me deixei afogar em lembranças. Olhei a imensa copa e pensei: nunca fomos donos do tamarindo. Era o inverso, a árvore é que tinha a casa. Se estendia, soberana, pelo pátio, levantando o chão de cimento. Eu olhava aquele pavimento, assim enrugado pelas raízes, se erguendo em placas, e me parecia um réptil mudando de pele.

Conhece a diferença entre o sábio branco e o sábio preto? A sabedoria do branco mede-se pela pressa com que responde. Entre nós o mais sábio é aquele que mais demora a responder. Alguns são tão sábios que nunca respondem.

Para si, meu filho, para si que estudou em escola, o chão é um papel, tudo se escreve nele. Para nós a terra é uma boca, a alma de um búzio. O tempo é o caracol que enrola essa concha. Encostamos o ouvido nesse búzio e ouvimos o princípio, quando tudo era antigamente.
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Nélio 17/12/2015

Não é o melhor que li dele, mas foi uma boa leitura. Esse foi, com certeza, o que melhor mostra a veia política do autor, mostrando um Moçambique oprimido por brancos - Europa, ONU, EUA etc. - ao mesmo tempo que ele revela a mística de um povo africano que tem muito para mostrar ao mundo.
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Wagner 12/12/2015

MORADAS

(...) É preciso consultar um demônio para se saber a morada de outro demônio (...)

In: COUTO, Mia. O ultimo voo do flamingo. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. página 125.
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Gildo 05/08/2015

Críticas e almas
Fosse uma carta de Pero Vaz de Caminha para descrever a África e teríamos incontáveis detalhes de sua exuberância, diversidade, cores, intensidades. Fosse uma passagem bíblica, talvez fosse descrito o Éden, com seus pecados, incertezas, inícios e fins. Mas é Mia Couto. Então, temos a alma africana.

O Último Voo do Flamingo é uma alegoria sobre os negócios da guerra e a guerra nos negócios, como ele mesmo diz. Num vilarejo de Moçambique, lotado de minas terrestres, soldados da ONU começam a explodir, misteriosamente. Sim, explodir. Sim, misteriosamente. Deles, nada sobra, nem sangue, nem restos mortais. De alguns, fica apenas o órgão genital. A intriga surreal é apenas um ponto de partida para a visita de um italiano ao vilarejo, enviado para investigar os crimes.

Acompanhado por um tradutor local, Massimo começa a conhecer as estranhas crenças do povo, recheadas de histórias sobre feitiços, homens que retiram o esqueleto, flamingos que voam para criar o por do sol, mulheres novas com corpos velhos.

Parece apenas um romance fantástico, mas é uma viagem analítica sobre o relacionamento entre homens e mulheres e também sobre as políticas de exploração e corrupção que correm soltas no continente africano. Mia Couto é soberbo na linguagem, na precisão, na descrição, nos neologismos. Um vocabulário surpreendente, ainda que em Português claro, evidencia que as tradições africanas devem ser contadas de outra maneira, com outra lógica. Interessantíssimo, por exemplo como um ancião do vilarejo descreve um gravador: uma máquina de fotografar a voz. Esse tipo de conceito revela muito falando pouco: a restrição de conhecimento, as referências que se tem e a crença de que aquilo não era necessariamente bom. Rico assim, é um livro que desnuda tudo, com pouca roupa na linguagem.
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Felipe 16/06/2015

Médio, mas vale a pena.
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Tenda dos Livros 05/02/2015

Triste ausência do voo
É a primeira vez que leio algo do escritor moçambicano Mia Couto, estou impressionada com a facilidade que o autor tem de nos conduz a entender e entrar nessa história que perpassa ficção, poesia e críticas embasadas na realidade de um país.
Demorei um pouco pra iniciar essa leitura por acreditar que seria um livro muito difícil, com uma narrativa chata e cansativa. Eu estava certa? Não, não mesmo.
A história de O último voo do flamingo acontece alguns anos depois da conquista da independência de Moçambique, o país ainda vivia crise econômica e social em busca da reorganização e reestruturação. É nesse contexto de pós-guerra que acontecimentos estranhos assombram o vilarejo fictício, Tizangara. O primeiro capítulo me fez rir muito, não imaginava que a história fosse começar com um pênis decepado no meio da estrada. Eis os acontecimentos estranhos: soldados das Nações Unidas explodiam sem nenhum motivo aparente, e as únicas coisas que sobravam eram seus capacetes e seus órgãos sexuais.
Por conta de todo esse mistério, foi enviado à Tizangara o inspetor Massimo Risi, para entender e explicar tais acontecimentos aos seus superiores. Chegando na vila, Massimo é apresentado ao administrador local Estevão Jonas. O administrador trata logo de arranjar um "tradutor" para o estrangeiro, que na verdade nem precisava de tradutor, a pessoa seria muito mais uma espiã do que qualquer coisa, a intenção de Estevão era deixar alguém "de olho" em Massimo.
Para desvendar o mistério das explosões, Massimo passa a ouvir muitos moradores e as suas mais variadas formas de explicações, todas baseadas em suas crenças locais. Para tentar entender, o inspetor mergulhava cada vez mais na cultura e conhecimento daquele povo, só que quanto mais fundo ia, mais perdido ficava. Não fosse o tradutor que o acompanhava para tudo quanto era canto e lhe contava histórias daquele terra, Massimo já teria enlouquecido.

O livro é repleto de personagens ilustres, como a prostituta Ana Deusqueira que fazia os velórios dos pênis falecidos, ou padre Muhando que tinha uma relação tão próxima de Deus a ponto de lhe dá sermão... Cada personagem com sua peculiaridade foi ganhando espaço na narrativa. Mas houve um grande personagem que desde que apareceu, encheu as páginas de sabedoria, filosofia e poesia, esse personagem era o pai do tradutor, Sulplício.
Mia Couto põe a mesa a desgraça e pobreza do povo Moçambicano que vive à margem e ainda governados por corruptos. Mas em contrapartida, nos mostra um povo que ainda luta por suas tradições e que tenta resgatar a todo custo os destroços dos seus antepassados.
A narrativa é em primeira pessoa, feita pelo tradutor e é incrível como vemos o reencontro desse personagem com suas origens, no decorrer da história, ao relembrar seus diálogos com sua mãe (já falecida) e o retorno do seu velho e sábio pai.
Outra coisa que encanta é o lirismo depositado no flamingo, uma ave que simboliza esperança e paz para aquele povo.
Quem protagoniza toda a história é a ausência, daquilo que pertencia aquele lugar, mas que foi levado, ou evaporado, junto com o suor dos escravos e as lágrimas da libertação de um povo que ainda vive preso na triste ausência do voo.
Pra quem procura uma leitura intensa, cheia de humor e requinte crítico, faço mais que uma indicação, leia O último voo do flamingo.

- Daiana Ayalla

site: http://www.tendadoslivros.com.br/2014/09/resenha-livro-o-ultimo-voo-do-flamingo.html
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Aninha 12/11/2014

Fantasia, magia & arte
"Não vê os rios que nunca enchem o mar? A vida de cada um também é assim: está sempre toda por viver." (Página 49)

Viajando para Bertioga, me deparei com esse exemplar do Mia Couto na biblioteca do SESC. Não pensei duas vezes em pegar pra ler, já que estava de férias e tinha todo o tempo do mundo para pôr a leitura em dia.

"...a terra é um ser: carece de família, desse tear de entrexistencias a que chamamos ternura." (Pág 110)

Em resumo, eis a trama: a pequena cidade de Tizangara (Moçambique) está com um grande problema. Vários soldados das Nações Unidas começaram a explodir e não se sabe o motivo.

O delegado da ONU, o italiano Massimo Risi, vai até a cidade para investigar esse mistério e conta com a ajuda de um jovem para ser o tradutor.
Ali ele conhecerá um pouco da cultura local, as histórias da terra e da sua gente.
Gente como o administrador Estevão Jonas e sua esposa Ermelinda, o adjunto Chupanga, a prostituta Ana Deusqueira, a jovem-velha Temporina, o padre Muhando, o velho Sulplicio e o feiticeiro Zeca Andorinho. Cada um tem o seu mistério, a sua história de vida - seja real ou fruto de sonho, seja passível de ser verdadeira ou fantasiosa. Com Mia é assim: a fantasia se sobrepõe à narrativa e o resultado sempre surpreende.

"Do que me lembro jamais eu falo. Só me dá saudade o que nunca recordo. Do que vale ter memória se o que mais vivi é o que nunca se passou." [Sulplicio - pag. 209]

Vale a pena a leitura!


site: http://cantinhodaleitura-paulinha.blogspot.com.br/2014/11/o-ultimo-voo-do-flamingo.html
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Zana 23/10/2014

Impressionante semelhança
Numa pequena vila imaginária chamada Tizangara, soldados das Nações Unidas, que estão em Moçambique para acompanhar o processo de paz depois de um longo tempo de guerra civil, simplesmente explodem, restando deles apenas vestígios dos seus órgãos genitais e boinas azuis. Cabe então, a um italiano representante da ONU desvendar os misteriosos acontecimentos.

Mia Couto conta essa história através de uma fábula, fazendo alusão a ausência dos flamingos no Sul de Moçambique que na tradição do lugar é símbolo de esperança. O escritor faz uma crítica acre aos disseminadores da guerra e da miséria, um empenho moral, que segundo ele, cabe a todos os escritores.

"O último voo do flamingo fala de uma perversa fabricação de ausência _ a falta de uma terra toda inteira, um imenso rapto de esperança praticado pela ganancia dos poderosos..."

A enigmática escrita em forma de fábula e sua admirável narrativa, recheada de lirismo, metáforas poéticas e humor apurado terminam colocando em segundo plano o argumento do livro, não obstante a importância e verdade do assunto ilustrado. O teor social assim meio que se perde nos meandros do realismo fantástico e das inúmeras metáforas poéticas.

Um aspecto interessante que saltou visivelmente aos olhos em O Último Voo do Flamingo é a impressionante semelhança da escrita poética de Mia Couto com a do escritor brasileiro Manoel de Barros, e guardado as devidas proporções, com alguns personagens de Dias Gomes e Aguinaldo Silva, que poeticamente brincavam de descontruir e construir palavras.

"Cortaram esta coisa do homem ou vice-versa?"

"naquele tempo não havia antigamentes"

"Só quero ser contemplável"

"Agora eu já não sou sujeito de nada. Me irresposabilizo"

"Agora é que vem aí chuva de molhar vento"

"Duvidam? Sou puta legítima. Não uma desmeretiz, dessas"

A fábula em si não convenceu, mas pela poesia, da qual Mia Couto se faz mestre, vale a leitura!
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Jacqueline 08/10/2014

Agora meu filho, eu já não falo língua nenhuma, falo só sotaques. Entende?
Inspirado pelo achamento de uma pena de flamingo, pela ausência e pelo significado dessa ave para uma comunidade de pescadores de uma praia do Sul de Moçambique (que a viam como anúncio de esperança), Mia Couto escreve um romance sobre uma cidade inventada que poderia ser muitas das existentes na África ou em outros continentes ou regiões historicamente marcadas por colonizações. Nesse contexto, Mia chama a si a responsabilidade de escritor:

O último voo do flamingo fala de uma perversa fabricação de ausência a falta de uma terra toda inteira, um imenso rapto de esperança praticado pela ganância dos poderosos. O avanço desses comedores de nações obriga-nos a nós, escritores, a um crescente empenho moral.
Contra a indecência dos que enriquecem a custa de tudo e de todos, contra os que têm as mãos manchadas de sangue, contra a mentira, o crime e o medo, contra tudo isso se deve erguer a palavra dos escritores.

Em Tizangara, soldados da ONU desandam a explodir. Um italiano, integrante das forças de paz, é enviado para investigar essas estranhas explosões. Um habitante negro do local é nomeado seu tradutor, mais de cultura do que de língua, já que o italiano falava e compreendia a língua local. Acompanhando a essa investigação somos apresentados a tipos ao mesmo tempo comuns e singulares a prostituta Deusqueira, o padre Muhando, o feiticeiro Zeca Andorinho, Temporina, uma mulher de corpo jovem e feições de velha, um pescador que desossa e por aí vai. O curso da investigação se cruza com a história do próprio tradutor, narrador da história, e na relação que tem com seu pai (por ocasião de um abraço dado entre os dois em um momento de emoção, o narrador nos deixa entrever o espaço existente entre eles: Nem eu sabia se era despedida ou chegada)

Para a maioria da população de Tizangara, a exemplo de tantas outras, após guerras e guerrilhas sucessivas, o que muda é quem manda, mas suas ausências permanecem as mesmas.

Trata-se de um fábula sobre a ganância humana, sobre as relações de poder e a deterioração da política:

__Mas pai, esse italiano nos está ajudar.
_ A ajudar?
_ Ele e os outros [representantes da ONU].Nos ajudam a construir a paz.
_ Nisso se engana. Não é a paz que lhe interessa. Eles se preocupam é com a ordem, o regime desse mundo.
_ Ora, pai...
_ O problema deles é manter a ordem que lhes faz serem patrões. Essa ordem é uma doença em nossa história.

Que bom que escritores como Mia couto existem e que uma das muitas sem-razões da literatura possa ser essa!
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Camila(Aetria) 16/08/2014

Último voo.
Esse foi o primeiro livro de Mia Couto que li, e depois de lido, não sei porque demorei tanto pra pegar um dele. Foi o que resolveu minha ressaca literária de Persuasão, embora esse não tenha me deixado com ressaca, mas sim uma vontade de ler todos os outros dele.

A escrita dele, o ritmo da leitura, tudo compõe um conjunto maravilhosamente escrito. É um livro que dá pra ler em 1 dia, como estava correndo que nem uma desesperada, levei 3 HAHA

"A administratriz de novo se interpôs, deixando invisível o esposo. Falava ajeitando o turbante e sacudindo as longas túnicas. Ermelinda clamava que eram vestes típicas da África. Mas nós éramos africanos, de carne e alma, e jamais havíamos visto tais indumentárias."

O último voo do flamingo, Mia Couto, pg 19

O que achei mais interessante foi quão delicadas e sutis as críticas foram posicionadas no livro, como uma realidade que deveria ser vista por todos, mas que por comodidade a gente releva e deixa passar. As situações políticas onde países ditos de primeiro mundo vão "trazer a paz" para os que estão em situação precária, como isso também se tornou um mercado viável. E a habilidade dele de trazer 500 opções de palavras para um significado, como ocorre quando trata dos órgãos dos soldados explodidos, senti um Guimarães Rosa naquele momento haha

"- Mas pai, esse italiano nos está ajudar.
- A ajudar?
- Ele e os outros. Nos ajudam a construir a paz.
- Nisso se engana. Não é a paz que lhe interessa. Eles se preocupam é com a ordem. O regime desse mundo.
- Ora, pai…
- O problema deles é manter a ordem que lhes faz serem patrões. Essa ordem é uma doença em nossa história."

O último voo do flamingo, Mia Couto, pg 188

É um livro que transpira cultura, transpira história e realidade de uma forma bem humorada e delicada, é quase uma poesia em prosa.

"- Com o devido respeito, Excelências: é se chamássemos Ana Deusqueira?!
- Mas, essa Ana, quem é? - Inquiriu o ministro.
Vozes se cruzaram: como se podia não conhecer a Deusqueira? Ora, ela era prostituta da vila, a mais competente conhecedora dos machos locais."

O último voo do flamingo, Mia Couto, pg 26

Ele consegue misturar as crenças, as lendas, com uma realidade da terra local, e mesmo essa mistura de folclore e "realidade" são feitas de forma tão natural, como deveria ser sempre que analisamos a cultura de qualquer lugar que seja, e não com olhos ocidentais e ditos civilizados.

"O confronto ficou-se por ali. Porque os estrangeiros rodearam a prostituta, fungando da intensidade dos seus aromas. A delegação se interessava: seria zelo, simples curiosidade? E pediram-lhe documentos comprovativos da sua rodagem: curriculum vitae, participação em projetos de desenvolvimento sustentável, trabalho em ligação com a comunidade."

O último voo do flamingo, Mia Couto, pg 29

site: http://www.castelodecartas.com.br/index.php/2014/08/16/ultimo-voo-flamingo-ogs-80/
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Ivna 24/05/2014

O último voo do flamingo - um bom livro para se ler.
Numa mistura de real e imaginário, Mia Couto é brilhante ao unir a realidade desastrosa do pós guerra com uma certa medida de metáfora. Alguns críticos costumam classificar O último voo do Flamingo como "realismo mágico", e isso faz muito sentido.
Particularmente, eu não achei um livro muito fácil de entender, pelo uso dos dialetos locais e pelo conteúdo metafórico. Muito embora, a narrativa seja muito simples, corriqueira, e de certo modo até cômica.
Mesmo com toda descontração da obra, Mia Couto explana muito bem a realidade de Moçambique no contexto do pós-guerra. Um país desolado pela colonização europeia, e pela ganância e autoritarismo dos próprios conterrâneos.
A narrativa circunda em torno das misteriosas explosões dos soldados da ONU, que sem razão aparente deixam pra trás apenas o órgão genital. A história se segue com o depoimento dos moradores de Tinzangara, que enriquece ainda mais a narrativa.
É um livro para vida, visto a riqueza das reflexões de Mia Couto sobre o cenário da narrativa.

Recomendo! Vale muito a leitura!
Lucas 03/01/2020minha estante
Excelente resenha. Estou no início da leitura e nos primeiros 2 capítulos achei muito legal. Me veio a mente a comparação com O auto da compadecida.




Diógenes - Estr 03/04/2014

Porque Paulo Coelho é ruim...
Várias vezes ouvimos, pelos críticos e não críticos, que os livros de Paulo Coelho são ruins, Nicholas Sparks tem livros medíocres com histórias banais, ou que John Green escreve clichês, e muitas outras coisas de autores que estão abalando no cenário da literatura. Muitos não entendem o porquê dessas criticas, já que ao ler não vêem e não percebem nada de “estranho” nas obras desses e de outros que também são criticados juntamente com toda a literatura “Chick lit”. Para essa parcela que não consegue enxergar a distância de qualidade que uma obra tem de outra, o livro O último vôo do Flamingo, do escritor moçambicano Mia Couto, é uma excelente obra para esclarecer como um escritor pode ser incrivelmente fantástico e ter ao mesmo tempo qualidade necessária para ser considerado um grande escritor. No livro citado, o autor com a maestria de quem sabe lapidar palavras, narra a história de um pequeno vilarejo moçambicano que após o término da guerra civil do país sofre com uma série de estranhas explosões, soldados da ONU que explodem, de forma súbita, só restando o pênis e a boina azul que usam, diante desse problema o italiano Massimo Rissi é designado a resolver o caso. A escrita de Mia Couto é que chama atenção com uma prosa apurada e rica, o leitor é levado a contemplar personagens singulares e enredo com verdadeira facilidade sem recorrer a uma escrita banal e uma descrição cansada e pobre. Algo marcante e que acrescenta mais sabor a história é um misto de realidade e magia, muito se assemelhando ao famoso realismo fantástico.
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