Um defeito de cor

Um defeito de cor Ana Maria Gonçalves




Resenhas - Um Defeito de Cor


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Francisco240 13/01/2023

A melhor Ficção histórica brasileira
Uma das melhores leituras do ano já no primeiro mês, sem sombra de dúvidas a escrita envolvente, a trama e o seus personagens super complexos fundidos com elementos históricos fazenda narrativa ? Angustiante, intrigante, interessante, convidativa e tocante.
Em minha sincera opinião o ponto forte do livro são as mesclar agem históricas e diversos citações da história do Brasil durante a narrativa e o mais interessante é a forma de Como usar acontecimentos históricos influenciam diretamente e indiretamente na vida dos personagens ou no ambiente no qual os personagens estão inseridos.
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Ana Carolina 28/02/2022

Um defeito de cor- Ana Maria Gonçalves
Escrevo no momento em que termino esse livro. Acredito que é um livro essencial na vida e que tem o momento certo a ser lido.
Desde a primeira a última página esse é um livro de busca. Busca de liberdade, de amor, de dinheiro, da religião, dos filhos de um significado para a vida.
A parte mais perturbadora foi o início livro.
Senti raiva, dor, agonia, tristeza entre outros.
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Henrique Fendrich 30/06/2022

Há coisas muito boas, excelentes mesmo, nesse livro, mas também problemas graves.

Inicialmente, eu aprendi muito com essa história. Nosso conhecimento sobre o período da escravidão é cheio de generalidades e superficialidades, tratando a grande massa de pessoas escravizadas como se fosse um único bloco de mesma cultura, crenças e tradições, vindas todas de uma genérica "África", como se o continente não tivesse várias realidades.

Para a maioria das pessoas, entre as quais eu me incluía, ainda é uma surpresa quando se diz que vários escravizados eram muçulmanos (os malês ou os muçurumins) e que, além disso, sendo eles bastante cultos, estiveram por trás de revoltas importantes no país. Por não conhecer as distinções entre os africanos, também não costumamos saber nada a respeito das eventuais rivalidades entre eles ou como os diferentes grupos interagiam entre si. E isso o livro oferece, um painel bem interessante sobre a interação entre várias culturas africanas.

Principalmente em suas primeiras partes, também é possível que alguém que ainda não tem qualquer conhecimento específico sobre religiões de matriz africana fique um pouco mais informado sobre elas. Uma das que se sobressaem é a religião iorubá, com uma mitologia muito rica que, inclusive, iria inspirar o candomblé. Entre as crenças da cultura iorubá que mais gostei de conhecer pelo livro está a dos "abikus", crianças que "nascem pra morrer".

O livro também é muito útil para tomar conhecimento de eventos históricos que quase não são abordados em aulas de História fora da Bahia, como a Revolta dos Malês e a inusitada "Cemiterada", quando, literalmente, a população baiana declarou "morte ao cemitério".

Outra situação praticamente ignorada pelos brasileiros e que aparece com destaque no livro é a existência na África (Benim, Nigéria e outros países) de comunidades de "retornados" do Brasil, ou seja, ex-escravizados que, ou por serem expulsos ou por outra contingência, voltaram à terra de origem. A história mostra que então havia uma rivalidade entre esses que estiveram no Brasil e os que nunca haviam saído de lá. São informações bem interessantes.

Ler o livro, então, permitiu que eu aumentasse consideravelmente o meu conhecimento sobre a história da escravidão em geral, ou, ao menos, na Bahia (embora a trama também se desloque para vários lugares no Brasil, sem falar naqueles na África). Nessa perspectiva é que estão as coisas que chamei de "boas" e "excelentes" no livro.

Agora os problemas. A relação entre ficção e realidade me parece problemática.

A autora conta que a história do livro estava escrita em uns papéis velhos que uma criança, sem saber, usava para desenhar. Havia partes ilegíveis ou faltando e ela então completou com ficção. Ela diz na introdução que "algumas partes" do livro foram inventadas, sem precisar quais, e que "quase tudo" corresponde à história narrada pela mulher nos papéis.

Com isso, pensei em dar crédito histórico à maior parte do que lia. Entretanto, comecei a duvidar quando notei o que me pareceu uma tentativa de "forçar" a relação da personagem com figuras famosas, como a história do Tiradentes e depois com o Joaquim Manuel de Macedo, a ponto de dizer que "A moreninha" foi inspirada nela.

Alguns detalhes de eventos históricos também me pareceram bem duvidosos, e houve ao menos um momento com uma escorregada cronológica feia, quando, em 1848, um homem dizia que o pai do seu pai havia chegado à África em 1624 (uma distância impossível).

A desenvoltura e a minúcia com que a personagem narra em detalhes eventos do passado, citando sempre corretamente nomes que não diziam respeito ao seu cotidiano, sugerem não uma memória extraordinária, mas a intervenção da autora da história. É bem difícil imaginar que uma pessoa "real" entrasse em tantos detalhes como a narradora do livro, o que, por vezes, faz com que o livro se torne enfadonho, pelo excesso de descrições sem relação com a trama principal (e ao estilo da narração parece faltar o que uma amiga chamou de "alma").

Então eu não sei o que exatamente havia nos papéis que a autora encontrou (e que são passíveis de erros também) e o que veio da autora. É bem possível também que leitores citem certos detalhes do livro como verdade histórica, quando não o são. Isso é um mal de todo livro de ficção histórica, mas esse sugere que "quase tudo" é real. Eu preferiria que a autora dissesse que fez adaptações para que a história que encontrou se transformasse na de Luiza Mahin, figura cuja existência ainda não foi comprovada.

Isso me incomodou durante a leitura, que me parece bastante útil para se conhecer certos eventos históricos, mas então pesquisá-los e aprofundá-los em outra parte. Talvez se esses eventos e as abordagens que privilegiam a voz do negro como agente da história no Brasil fossem mais conhecidos e disseminados, o livro não faria o mesmo sucesso, porque aí se sobressairiam mais as questões de estrutura e estilo.
Edicleia 29/10/2023minha estante
Concordo com muita coisa que vc falou,mas no programa Roda Viva a autora fala que essa história dos papéis achados é tudo ficção, ela usou para realizar a escrita de propósito,estou tentando terminar esse livro mas está sendo bem cansativo.




Rodrigo 04/05/2022

Um defeito de cor
Um calhamaço de pouco menos de mil páginas que dispensa comentário.

Uma linda história onde a autora mexe profundamente com nosso sentimento.

Conseguindo arrancar sorrisos das nossas faces, lágrimas das nossas vistas.

Um livro que mexeu profundamente comigo, mudando literalmente meu modo de pensar e agir.

Esse vai ficar como troféu de grande valor não só na minha estante, mais na minha vida.

Amei.

Está de parabéns.

Ana Maria Gonçalves ( Um defeito de cor).
João Paulo 04/05/2022minha estante
perfeito esse livro




Janaina 04/03/2022

O livro da vida
Não tenho a menor pretensão de resumir esta gigante obra que, como eu previa, foi elevada à categoria de favorita da minha vida!

O primoroso romance histórico conta a saga da protagonista Kehinde, desde seus últimos dias na África, ainda criança, quando é capturada, por ser ibeji (gêmea), para ser transportada num tumbeiro ao Brasil, onde é considerada um objeto de sorte, até a sua velhice, quando consegue retornar à África, depois de transitar entre o fundo do poço da dignidade e o auge do empreendedorismo em terras brasileiras.

A riqueza e profundidade com que é retratada a vida de Kehinde, que, em partes, ilustra a de tantos negros escravizados em nosso país, também é encontrada na descrição da nossa história e geografia, principalmente nas cidades por onde nossa personagem passa.

Foi um imenso prazer fazer uma viagem no tempo dentro da minha amada cidade Salvador, e, transportando-me ao século XIX, reconhecer ruas, igrejas, casas, à medida em que notava crescer em mim uma deliciosa sensação de pertencimento. E imagino que moradores do Rio, São Paulo, São Luís experimentem igual sensação.

A construção da personagem é tão poderosa que é impossível não se apaixonar por ela, chorar junto por suas tristezas, revoltar-se com as injustiças sofridas, comemorar suas conquistas, torcer pelo sucesso do seu caminho... É um livro que transborda emoção e que, sem dúvida, transforma o leitor.

Sei que a quantidade de páginas pode assustar, mas digo sem medo de errar: vale cada linha e, no fim, ainda ficamos querendo um pouco mais. Então se ainda não leu, recomendo calorosamente que o faça o quanto antes. Não vai se arrepender.
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Layla.Ribeiro 04/12/2021

Desafio literário 2021- Calhamaço
História da grande jornada de Kahinde uma mulher que foi capturada na África e escravizada no Brasil quando criança, além de ser um romance de ficção histórica também é um romance de formação porque vamos acompanhado a evolução e maturidade da personagem. Uma trajetória de vida que perpassa por vários momentos da história do Brasil, momentos esses desconhecidos para muitos e de grande importância, o que mostra o quanto a autora estudou pra escrever esse livro tornando-o riquíssimo. Uma linguagem fácil e fluida que vai te envolvendo na história e que faz você não querer parar de ler o livro. O tema religioso presente nesse livro, religião islâmica , cristãs e de matriz africanas muito bem trabalhada , eu amei conhecer sobre a religião africana muitas coisas eu não fazia ideia e me ajudou muito a desconstruir algumas visões errada e me fez buscar e procurar mais sobre na internet. Sem dúvida virou meu favorito e quando cheguei ao final dessa jornada ficou um vazio , uma saudade da Kehinde. Acredito que futuramente esse livro se torne um clássico da literatura nacional e ao meu ver ele tem a mesma importância para o Brasil da mesma forma que Os Miseráveis tem para a França. Leiam esse livro!
Joao 04/12/2021minha estante
Layla, adorei a tua resenha. Não conheço essa obra mas pela sua resenha e essa analogia com Os Miseráveis, já pretendo ler.


Layla.Ribeiro 04/12/2021minha estante
Que bom! Fico feliz !!


Lina_2013 04/12/2021minha estante
RT, me deixou muito curiosa para ler tbm.


Vivi Martins 27/05/2022minha estante
Gostei muito da resenha. Comecei essa leitura ontem. O que vc ainda não leu, Layla? ?


Layla.Ribeiro 27/05/2022minha estante
Obrigada Vivi, ainda preciso de mais duas vidas para ler tudo que eu gostaria haha




Jéssica 25/12/2021

Apenas leiam esse livro!
Um defeito de cor é um romance histórico que narra a saga de Kehinde, uma idosa cega, a beira da morte, raptada ainda criança na África e trazida para ser escravizada no Brasil. É um relato incrível, rico em fatos históricos e religiosos, e muitos detalhes sobre a escravidão no Brasil.

Uma leitura que me causou angústia e desconforto em vários momentos, mas ainda assim não me tirou o prazer de ter conhecido a história de Kehinde, ver seu crescimento e desenvolvimento ao longo da narrativa.

Gente, esse livro contém TANTAS histórias, tantos personagens interessantes. É uma verdadeira riqueza, e é nosso! Deveria ser leitura obrigatória a todos. Apenas leiam!
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Leila 24/02/2023

Terminei agora Um defeito de cor e posso dizer que estou aliviada com esse término de leitura. Comecei amando e sofrendo muito, no decorrer da obra me emocionei e chorei em vários momentos, mas a historia vai perdendo a força em um dado momento e a autora me perdeu pelo caminho e no fim já estava amaldiçoando as 952 páginas num livro que dava para contar em 500 páginas o que era de fato essencial ser contado e não precisava "contar até a cor da cueca de tudo quanto era gente que aparecia no caminho da personagem". A primeira parte do livro, por assim dizer é primorosa e perfeita, a segunda é boa, mas a terceira eu li revirando os olhos, confesso, condenei a Kehinde em vários momentos e achei muita coisa meio fantasiosa, parecia até que estava assistindo filminho da Disney (a essa altura já estou sendo apedrejada na rua, eu sei). E o que mais me irritou é que em um livro tão prolixo que por boa parte dele que girou em torno de um "plot", a autora no final final, deixou o leitor a ver navios, nem se dignou a finalizar mesmo a coisa. Ah me poupe! Faz a gente ler essa quase bíblia e nem dá um fim condizente ao conto de fadas que ela estava criando ao despirocar a historia? Enfim, nota 3,5 para 4. como disse um amigo, porque eu sou muito generosa e porque sei que mesmo não tendo amado a obra como um todo, várias passagens dela foram marcantes e ficarão comigo por uns tempos. Massss, venciiiii. Foi minha segunda tentativa de ler esse livro e agora posso tirá-lo da minha estante como leitura concluída. Agora, simbora pro próximo que a fila aqui tá giganteeee.
Alexandre663 19/03/2023minha estante
Minha experiência de leitura está bem parecida. Nas primeiras 500 páginas a história flui bem e até que li rápido. Mas depois o livro começa a ficar maçante demais. Parei na página 630 e vou dar uma pausa de alguns dias pra retomar a leitura, que já não está mais atrativa.


18/04/2023minha estante
A parte que se passa na África é bem difícil.. acho que a essa altura já estamos cansados de decorar nomes de personagens e nos envolver com cada história mesmo. Amei o livro e tudo o que ele me ensinou até ela sair do Brasil, agora tô só a força do ódio pra terminar ?


Thayná Krueger 26/04/2023minha estante
Concordo totalmente. O final foi muito cansativo, mas acho que os últimos 10% ficam excelentes outra vez


@Estantedelivrosdamylla 19/07/2023minha estante
Até 80% eu estava achando bom, mas depois disso eu revirei os olhos inúmeras vezes kkkk. Além de passagens mt chatas, a protagonista virou outra pessoa com valores bem diferentes, o que me incomodou demais.


Edicleia 29/10/2023minha estante
Estou chegando no final e estou com o mesmo pensamento kkk bom que não estou sozinha, fiquei procurando uma resenha que me representasse kkk


Thayná Krueger 29/10/2023minha estante
Edicleia fica tranquila que melhora ?


Edicleia 05/11/2023minha estante
Agora que a protagonista chegou no Rio de Janeiro, melhorou um pouco,estou gostando.




Juliana Rodrigu 19/04/2023

Todo brasileiro deveria ler para aprofundar em suas origens! Nos mostra que existe dificuldades sim , preconceitos mas não limites. Uma africana veio criança para o Brasil e com a sua determinação escreve uma história maravilhosa da sua vida! Cada capítulo é um aprendizado onde nos mostra resiliência! Obrigada Sinhá Luísa por me ensinar tanto!
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Thayná Krueger 04/12/2023

Obra Prima da Literatura Brasileira
Esta foi a resenha mais desafiadora que já fiz neste aplicativo. Falar sobre os defeitos ou as questões que nos incomodam em um livro é muito mais simples do que expressar todas as maravilhas que tornam uma obra uma das favoritas de nossa vida.

Reconheço que quase mil páginas podem parecer assustadoras à primeira vista, mas garanto que vale a pena, pois este livro retrata a história do nosso país, especialmente um capítulo terrível: a escravidão, narrada por uma autora espetacular.

A Ana Maria Gonçalves consultou documentos oficiais como fonte para retratar o Brasil durante a era da escravidão, revelando um país caracterizado pelo racismo, pela imposição de trabalho forçado, pela presença diária de violência e por frequentes rebeliões. A Ana conseguiu criar uma personagem (a Kehinde) de forma comovente, demonstrando o que significava ser arrancado de sua terra natal e trazido como escravizado para o Brasil.

Se há um livro que eu adoraria reler, é este. São tantos detalhes sobre nossa história que vale a pena dar uma oportunidade a esta grandiosa obra.
Bruno 04/12/2023minha estante
Fiquei curioso pra ler! ?


Thayná Krueger 04/12/2023minha estante
Eu sou suspeita para falar, já que favoritei. Mas esse livro é maravilhoso, dê uma chance e você irá se apaixonar por esse livrão.


CPF1964 05/12/2023minha estante
Não entendi. Não iríamos reler este livro em 2024 ?


Thayná Krueger 05/12/2023minha estante
E vamos reler em 2024.


CPF1964 05/12/2023minha estante
E você fez a resenha agora ?


Thayná Krueger 06/12/2023minha estante
Eu li esse livro esse ano, mas fiquei enrolando em fazer a resenha pois é difícil falar do livro quando ele é bom. Mas como está chegando o final do ano e quero bater a meta de resenhar 50 Livros, peguei um que eu amei para fazer a resenha.


CPF1964 06/12/2023minha estante
Entendi, Thayná. A resenha ficou ótima.


Thayná Krueger 06/12/2023minha estante
Obrigada. Eu queria falar muito mais sobre o livro, mas ao mesmo tempo não quero entregar muito sobre a estória. Acho que ir se surpreendendo é uma parte bacana de todo livro.


CPF1964 06/12/2023minha estante
Com certeza absoluta, Thayná. Dizer que o mordomo é o assassino estraga a experiência do leitor....??


Thayná Krueger 06/12/2023minha estante
Quando o autor é preguiçoso, a culpa é dele o culpado ser tão evidente ???


Thayná Krueger 06/12/2023minha estante
Quando o autor é preguiçoso, a culpa é dele o vilão ser evidente nas primeiras páginas


Thayná Krueger 06/12/2023minha estante
Mas tem muito livro que entrega tudo na sinopse. Ainda bem queeu leio a sinopse e esqueço tudo no outro dia ???


CPF1964 06/12/2023minha estante
Memória Seletiva....????




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Fabio.Nunes 04/05/2024

O grande clássico brasileiro contemporâneo
Um defeito de cor ? Ana Maria Gonçalves
Editora: Record, 2022

Ao amigo que se aventurar a ler esta resenha, peço-te paciência. O livro é rico demais para que eu escreva pouco.
Planejei a leitura deste livro mais à frente, ainda este ano, mas aí veio o carnaval da Portela de 2024 e mudou tudo:

Salve a lua de Benin
Viva o povo de Benguela
Essa luz que brilha em mim
E habita a Portela
Tal a história de Mahin
Liberdade se rebela
Nasci quilombo e cresci favela!

Foram 2 meses e meio diante desse monumento da nossa literatura. Um clássico com cê maiúsculo. Um romance histórico que nos leva numa viagem ao século XIX por meio de Kehinde (leia-se Keindé), nossa protagonista e narradora. Escrito quase de forma epistolar, Kehinde busca com a narrativa de sua própria vida apresentar ao seu filho perdido sua própria história.
Aqui é onde a ficção já se encontra com a realidade, pois, embora Kehinde seja uma representação ficcional de Luísa Mahin (com pouquíssimos registros historiográficos), seu filho é nada mais nada menos que Luís Gama, um abolicionista que combateu e denunciou o racismo no Brasil, conseguindo libertar mais de 500 negros escravizados ao longo de sua vida.

A ideia magistral de Ana Maria Gonçalves foi conseguir nos ensinar tanto sobre nossa história, sobre nosso povo, nossa cultura, sobre os povos africanos escravizados e suas culturas; tudo isso por meio da vida íntima, do cotidiano e das experiências de sua personagem ficcional.
Este é um livro que talvez preencha um vazio de conhecimento que nosso povo tem sobre esta época, pois nos permite viver as agruras de um escravizado, desde sua captura até sua libertação.
E esse tema da escravidão é tratado com muito carinho pela autora, desnudando para nós todas as suas nuances e complexidades.
Embora a trajetória de Kehinde seja a meu ver uma história de vitória, ela está preenchida de sofrimento. Ela é a mulher que luta, que não aceita ser inferior, que aprende a ler e escrever por puro gosto, que cai e se levanta, que sabe pensar, que empreende, que vence, mas também que se humaniza diante de nós com suas contradições e defeitos (e não são poucos e nem fáceis de lidar). Uma Jane Eyre melhorada.

Vamos à história (sem spoilers).

E eis que o século XIX se descortina diante de nossos olhos.
Iniciando com a captura de Kehinde, ainda criança, em Uidá, reino de Daomé (atual Benim), passando por todos os sofrimentos da travessia do atlântico até a chegada na cidade de São Salvador da Bahia, onde é enviada para trabalhar numa fazenda na ilha de Itaparica.

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"O Benevides tinha se matado, e muita gente disse que ele tinha feito o certo, que antes virar carneiro de bicho do mar, pois provavelmente seria lançado ao mar, do que carneiro de branco no estrangeiro."

"Eu estava com muito medo, pois até então só tinha ouvido histórias terríveis sobre o selvagens da senzala grande, contadas pela sinhá ou pela sinhazinha. Só mais tarde percebi que nada poderia deixar alguém mais selvagem do que a travessia da África para o Brasil?"

"Para os brancos fiquei sendo Luísa, Luísa Gama, mas sempre me considerei Kehinde. O nome que a minha mãe e a minha avó me deram e que era reconhecido pelos voduns, por Nanã, por Xangô, por Oxum, pelos Ibêjis e principalmente pela Taiwo. Mesmo quando anotei o nome de Luísa por ser conveniente, era como Kehinde que eu me apresentava ao sagrado e ao secreto."
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Cresce nessa fazenda, experienciando toda a injustiça e violência a que eram submetidos os escravizados, inclusive ela mesma, de onde sai acompanhando a sinhá para a cidade de São Salvador, um lugar efervescente de inquietação social. Ali tomamos conhecimento das revoltas abolicionistas, como a revolta dos Malês (muçulmanos), das lutas pela independência do Brasil e das revoltas federalistas e republicanas separatistas (cabanagem, farroupilha, sabinada).

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"Achei o assunto interessante mesmo não entendendo, pois era como se os argumentos que usavam contra a dominação portuguesa também valessem contra a dominação que eles tinham sobre nós, os escravos. A mesma liberdade que eles queriam para governar o próprio país, nós queríamos para as nossas vidas."

"fiquei sabendo que os ingleses eram contra a escravatura. Não porque fossem bonzinhos e achassem que também éramos gente, Como de fato faziam pensar nos tratando melhor que o senhor os portugueses ou brasileiros, mas porque tinham interesse em que fossemos todos libertos."
(...)
"Era isso que os ingleses mais queriam, que todos tivessem dinheiro para comprar as mercadorias produzidas nas grandes fábricas construídas em Inglaterra."
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Consegue a muito custo e trabalho comprar sua liberdade e a de seu filho. Relaciona-se com um português, com quem tem o segundo filho (Omotunde), deixando-o depois aos cuidados do pai e de uma amiga para viver 7 anos numa comunidade de sacerdotisas vodúnsi (sacerdotisas jejes no culto da grande serpente).
Descobre que, apesar de livre, seu filho Omotunde é vendido como escravo pelo próprio pai ? aqui eu peço licença em dar o spoiler, visto que é a história de Luís Gama.
Assim, embarca numa busca pelo filho perdido, que a levará a São Sebastião do Rio de Janeiro, Santos, São Paulo e Campinas, sem sucesso.
Identifica os diferentes povos que desembarcaram na Bahia (fons, eves, iorubás, muçulmanos e outros) e no Rio de Janeiro (angolas, moçambiques, monjolos e benguelas) apresentando, contudo, as semelhanças entre suas culturas e seus cultos.

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"Não sei se era bem tristeza, mas os pretos da Bahia pareciam ter mais esperanças de felicidade, não sei se dá para entender, e os de São Sebastião pareciam mais conformados. Acho que essa é até uma palavra melhor que tristeza, a palavra conformismo, porque é uma palavra que acaba com os sonhos das pessoas."
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Sobre esses cultos, preciso abrir um parêntese: que coisa maravilhosa aprender sobre os voduns, orixás, eguns, nkisis, quimbanda, candomblé. São mitologias animistas que guardam semelhanças e uma beleza artística extraordinária, embora tão malvistas pelos brancos cristãos à época, senão hoje. E quanta não é a maravilha da nossa cultura brasileira, que misturou tanta riqueza num só lugar!

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"Ìyá Won, a nossa mãe suprema, a mãe de todas as coisas e para toda a eternidade, a que dá continuidade a tudo que existe ou venha a existir. Olodumaré disse a Oduá que, a partir de então, o homem nunca mais poderia fazer nada sem a colaboração da mulher. Com o poder dos pássaros, as mulheres receberam de graça e de nascimento o axé, que é uma energia que os homens têm que cativar."

"eu não sabia a quem pedir o agradecer pelos acontecimentos. Se não tivesse saído de África, provavelmente teria sido feita vodúnsi pela minha avó, pois respeitava muito os voduns dela. Mas também confiava nos orixás, herança da minha mãe. Porém, cozinhava na casa de um padre e estava morando em uma loja onde quase todos eram muçurumins."

"Eu sabia que o mesmo tinha acontecido com a religião dos orixás, pois em África, cada orixá é cultuado em uma determinada região, da qual é o protetor. No Brasil, por causa da falta de liberdade e de espaço para que cada orixá tivesse seu culto separado, foram todos misturados no candomblé."
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Depois do insucesso em encontrar o próprio filho, decide retornar a Daomé, já liberta e rica, onde consegue se casar e enriquecer ainda mais. E é aqui que as contradições da personagem mais saltam à tela:

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"Os brasileiros faziam questão de se afastar ainda mais dos selvagens conversando sempre em português e dizendo que não cultuavam mais os deuses dos africanos, que professavam a fé dos brancos, o catolicismo. Gente que, no Brasil, provavelmente tinha orgulho de não se submeter à religião católica e fazia questão de conversar em línguas de África, como forma de dizer que não tinha se submetido aos brancos, mas que, de volta à terra, negava esses costumes."

"Às vezes eu ficava um pouco constrangida por me relacionar com mercadores de escravos, mas logo esquecia, já que aquele não era problema meu. Eu não conseguiria resolvê-lo mesmo se quisesse, e também não poderia ficar com muitos escrúpulos depois de fornecer armas para o rei Guezo, sabendo que seriam usadas em guerras que fariam escravos, quase todos os mandados para o Brasil."
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No fim, zarpa de volta ao Brasil, com a esperança de entregar em mãos sua história ao filho.

Concluindo, e agradecendo a quem aqui chegou, este é um livro para se ler com calma, talvez em mais tempo do que eu levei, tamanha a riqueza que ele possui. E se eu falhei em narrar tudo o que essa obra nos brinda, em mim não carrego culpa, pois desconheço quem o faça.

?Saravá Kehinde! Teu nome vive!
Teu povo é livre! Teu filho venceu, mulher!
Em cada um de nós, derrame seu axé!?
Ana Sá 04/05/2024minha estante
Fabio, acho que você venceu o desafio que é resenhar uma obra deste porte (eu nunca soube nem por onde começar!), com direito a trechos generosos que me levaram às ótimas lembranças que tenho desta leitura! Foi muito bom revisitar o livro assim!

Não menos importante: "Jane Eyre melhorada" foi ótimo! haha


Jóice D. 04/05/2024minha estante
Parabéns pela resenha, Fabio!
Uma vez que se conhece Kehinde, levamos ela sempre no coração.
Maravilhoso recordar todos esses trechos!


Fabio.Nunes 04/05/2024minha estante
Ana, muito obrigado pelo elogio. Importante saber que essa resenha conseguiu te fazer revisitar essa obra. Missão cumprida.
E sim:
Kehinde > Jane Eyre rsrs


Fabio.Nunes 04/05/2024minha estante
Muito obrigado Jóice!


Craotchky 05/05/2024minha estante
Essa ideia de que o livro consegue preencher um vazio de conhecimento sobre essa parte da história, por si só parece suficiente pra justificar a obra e sua leitura. Quanto ao cultos de origem africana, sempre lembro que é possível ter belos vislumbres dos principais deles em Jorge Amado.


Fabio.Nunes 05/05/2024minha estante
Falou bem Filipe! Concordo plenamente. Jorge Amado só li Capitães da areia, e achei sensacional.


Regis 06/05/2024minha estante
Já tinha visto alguns colegas do Skoob fazendo essa leitura, mas confesso que foi essa resenha esplêndida que conseguiu despertar meu interesse por essa obra, que, já prevejo, vou gostar muito. Como sempre, Fábio sua resenha está perfeita! ????


Fabio.Nunes 06/05/2024minha estante
Ôh Regis, muito obrigado!


Flávia Menezes 06/05/2024minha estante
Fábio, isso não é uma resenha: é uma verdadeira análise literária. Uma aula, onde nos sentamos para aprender, e quando vemos, estamos plenamente encantados mesmo desconhecendo muitas partes da história.
Ter lido sobre o quanto o samba-enredo da Portela te motivou, me fez lembrar da beleza daquele desfile e do quanto o mais belo do cantar foi o incentivoà leitura. E assim como o carnavalesco, você fez o mesmo comigo (se sem dúvida com muitos mais) me deixando ansiosa para ler essa magnitude.
Parabéns, meu caro! Que resenha digna de uma bela coluna em um jornal! ????????


Fabio.Nunes 06/05/2024minha estante
Flávia, seus olhos vêem a beleza que neles habita. Receber um elogio desses de uma pessoa como vc é algo tão bom, mas não sei se sou digno. Ainda assim, obrigado de coração.
No mais, quem escreve colunas de jornal aqui é você, uma das melhores resenhistas desse Skoob.




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jaquesant0s 30/10/2022

Jornada épica
Um livro incrível que narra uma jornada épica. Ao longo da leitura temos muito aprendizado sobre história, principalmente sobre lutas e revoluções da população negra e de escravizados, além de muita informação sobre religiões de matriz africana. Infelizmente a história se torna um tanto arrastada pelo excesso de informação e de pesquisa que a autora decide incluir ao longo da jornada da protagonista, o que não tira a importância que essa obra carrega.
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Leandro190 01/06/2023

"Mama África, a minha mãe é mãe solteira"
O livro é uma mistura deliciosa de ficção e realidade. Juntando romance e história essas quase mil páginas ensinam, divertem e emocionam. Achei muito interessante e rico conhecer essa estória/história a partir de um protagonismo feminino. Kehinde é mais que uma mulher, é uma entidade formada por tudo que é inerente ao humano. Desejos, medos, angústias, coragem, fé, razão. A forma como a personagem vive intensamente cada dia nos coloca sempre numa posição de leitura reflexiva. Se você leu Torto Arado gosta de ler e estudar sobre as origens do povo brasileiro e das nossas ligações com a África é bem possível que vá gostar de Um defeito de cor também. O canal do youtube "Ler antes de morrer" fez uma leitura coletiva desse livro e no final houve uma discussão com a própria autora. Sensacional ouvir a escritora falar um pouquinho sobre como se deu o "parto" desse livro.
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