Leitora Viciada 08/01/2012Iniciando a leitura do livro, e ciente de que foi escrito para jovens, pensei que teria uma boa dose de diversão numa leitura simples e rápida. E foi assim, mas a leitura não se prendeu a apenas isso. O livro é muito mais que um chick-lit teen. Existem muitos sentimentos profundos e complexos nas entrelinhas.
Uma escola tipicamente americana, garotos idiotas do time de futebol, garotas fúteis desfilando pelos corredores, competição para alcançar (e se manter) no mais alto patamar da "cadeia alimentar" do ambiente estudantil. Sim, ser popular é uma luta selvagem e diária. Embora poucos cheguem lá, existem aqueles que apenas querem se manter vivos, mesmo estando no degrau mais baixo da hierarquia. Ninguém quer ser alvo de piadas grosseiras, algumas tão poderosas que podem acabar com uma vida social durante toda a permanência na escola. Fatos que podem decidir um futuro, uma vida.
É nesse cenário adolescente com os nervos à flor da pele que Siobhan Vivian escreveu seu romance. Escrita própria, diferente, com detalhes interessantes, narrativa ágil e sensivel. Ás vezes ela é sarcástica, possui um humor afiado, em outros momentos dramático. Sempre na medida certa, como cada cena necessita. O que mais gostei no livro, certamente foi a forma como a autora escreve. A premissa me pareceu tão comum de filmes dos Estados Unidos que não me chamou a atenção. Por isso sempre digo que nem sempre o mais importante de um livro seja o enredo; o essencial para mim é o talento do escritor, que pode transformar um tema batido ou comum em algo maravilhoso, como se fosse inédito.
A história é contada em primeira pessoa, sob a perspectiva da protagonista.
Através de três adolescentes diferentes mergulhamos no mundo da Academia Ross. Aonde manter uma boa fama pode ser complicado. Natalie Sterling, a protagonista, prefere não arriscar. Ela pensa em sua vida na faculdade, almeja um futuro profissional brilhante e essa é a sua verdadeira meta na vida: estudar. Uma garota que coleciona notas perfeitas e medalhas e é completamente dedicada a vida escolar. Não desperdiçará pensamentos com as típicas futilidades adolescentes. Ela não é do tipo de garota comum. Tanto que é a nona presidente do comitê estudantil mulher em toda a história da escola. Para que perder tempo em festas, garotos e diversões normais dessa idade? Afinal tudo vai passar e o que importa mesmo é a vida adulta, não é?
Ela é feminista e nem consegue se imaginar com algum desses rapazes infantis e sem futuro. Prefere nem arriscar. Ainda mais com o que ocorreu com sua única melhor amiga Autumn.
Autumn já foi alvo de fofocas pesadas pelos corredores da escola, o que a deixou abandonada e isolada dos outros estudantes. Uma mentira que arruinou sua vida. O culpado? Um garoto por quem Autumn era apaixonada.
Ela é doce e traumatizada com o ocorrido, e assim nasceu a amizade tão forte entre as duas: Natalie foi a única que a apoiou e a ajudou. As amigas se fecham num mundo particular, realizando passeios e programas sozinhas, estudando como ninguém mais na escola estuda.
A amizade das duas veteranas sofre abalos e provas. Será que as novas diferenças entre as amigas acabará com a amizade? Será que as mudanças bruscas sofridas por ambas influenciará suas vidas e relacionamentos?
Nesse conflito inicial existem outros detalhes. Spencer, a caloura dançarina super confiante e ciente da atração que provoca nos garotos chega para abalar o mundo de Natalie e de todas as meninas da escola. Ao contrário da protagonista, Spencer quer curtir muito sua adolescência, controlando os garotos, influenciando as meninas e vivendo intensamente todos os momentos. Spencer acha que as garotas não devem reprimir sua sexualidade. Devem ser provocantes e nada preconceituosas.
Spencer quer quebrar as regras impostas às alunas do colégio, e a cada ousadia choca a diretoria. Natalie, que foi babá da moça mais nova, se sente responsável e tenta de todas as formas dar bons conselhos e fazer Spencer compreender que seu futuro numa faculdade pode ser afetado pelas atitudes impensadas durante a escola.
Mas Natalie, tão controlada e certinha pode mesmo ser um exemplo para Spencer ou Autumn? Mesmo quando é ela quem mais precisa de ajuda? Quando ela é a mais errada de todas?
Natalie acaba passando dos limites, sendo possessiva, teimosa e controladora. Ela acha que pode controlar tudo a sua volta, que pode planejar cada passo. Inclusive seus relacionamentos.
O que Natalie não esperava seria que ela se apaixonaria, logo por um rapaz do tipo que ela tem aversão.
Connor, o garoto lindo que todas desejam. Ele joga futebol e não possui grandes expectativas na vida além de assumir os negócios do pai (que é lenhador) e da mãe (que é cozinheira) nos próximos dois anos: uma fazenda que vende pinheiros natalinos, legumes, geléias e doces caseiros. Não seria o par ideal para Natalie, nada como ela imaginou, ainda mais com os amigos bobalhões que ele possui.
Em vários momentos ela mantém seu autocontrole com tanta força que não percebe que está sendo infeliz e até mesmo preconceituosa. Ela se sente dividida entre seguir a razão ou a emoção. Se pergunta se está sendo hipócrita, por fazer algo que ela tanto critica nas garotas. Ela é muito culta e inteligente, porém abafa seus sentimentos e repreende suas vontades - que fujam dos planos de ir para a faculdade. Se apaixonar não faz parte dos planos!
Destaque do livro para a Srta. Bee. Em vários momentos eu a admirei por dar valor ao papel da mulher na sociedade e querer ensinar isso às estudantes; em outros a condenei por querer fazer de Natalie uma cópia do que a professora foi no passado, sem se preocupar com os sentimentos da moça.
Faltou alguma coisa? Talvez mostrar detalhadamente o relacionamento de Natalie com os pais, coisa que ficou em último plano.
Resumidamente, o livro é sobre: conflitos interiores; a capacidade de distinguir o certo do errado; a transformação de adolescente a adulto; o equilíbrio entre ser feminina e feminista; como aproveitar o presente sem comprometer o futuro; como escapar dos julgamentos duros que todos nós sofremos dia após dia.
Será que Natalie, Autumn e Spencer, que simbolizam diferentes tipos de meninas tão comuns, conseguirão alcançar o amadurecimento sem grandes sofrimentos? Mesmo seguindo caminhos diferentes, as adolescentes conquistarão o equilíbrio emocional e a satisfação pessoal? Natalie se permitirá amar o rapaz simples que tanto a atrai? Conseguirá deixar de se preocupar com o tipo de garota que ela é ou deveria ser?