@livrodegaia 03/04/2012
Cheio de Charme – Marian Keyes – Editora Bertrand.
Terminei “Los Angeles” e não consegui resistir a “Cheio de Charme” que estava piscando para mim na estante do meu quarto. Esse é um daqueles livros individuais da autora, ou seja, não faz parte da série sobre a família Walsh.
Sou suspeita para falar de qualquer livro da Marian, uma vez que, como todos já devem saber, sou fã declarada da irlandesa. Mas como não elogiar um Chick Lit tão cheio de conteúdo como esse? Não digo isso por ser uma obra de 784 páginas tão pesada quanto um Vade Mecum, mas pela estória sem si.
“Cheio de Charme” traz um enredo rico em assunto, visto que, apesar de ter como temas centrais alguns clichês, quais sejam, término de relacionamento, desilusões amorosas e suas consequências, os mesmos são trabalhados de forma muito peculiar e não caem na vala comum do mundo literário, pois a partir deles se desdobram questões sérias e/ou bem atuais como: violência doméstica, alcoolismo, câncer, tabaco, politicagem e cross-dressing.
Quanto à narrativa, continua irreverente e informal, mas não é tão jocosa quanto às demais obras da autora, aliás, apesar de ter passagens muito divertidas (não poderia ser diferente, estamos falando de um livro da Marian), não encontramos muito aquelas frases memoráveis dignas de serem grifadas que são tão características da escritora, mas a trama é tão envolvente que a gente perdoa esse fato. Acredito que isso ocorra em virtude da seriedade de alguns dos assuntos abordados. A questão do alcoolismo por exemplo, dá para sentir a agonia daqueles que estão em torno da alcoólatra, e convenhamos, Marian sabe tratar do assunto com propriedade, visto que ela já sofreu desse mal, logo, a questão é descrita de forma muito realista.
Temos quatro protagonistas: Lola (minha preferida), uma consultora de estilo dona de um cabelo roxo, ou melhor dizendo, bordô, como faz questão de corrigir; Grace:, uma Jornalista casada, com personalidade forte e cheia de atitude que vai se envolver em questões políticas que se misturam com assuntos amorosos; Marnie, irmã de Grace, mãe e esposa com uma vida aparentemente perfeita, mas que esconde sérios problemas; e Alice, a noiva mais invejada/odiada de toda Irlanda.
A narrativa de cada uma delas tem uma letra diferente e é alternada ao longo da estória. A da Lola é em forma de diário. Ao final de cada uma somos surpreendidos com um assunto pendente que enche o leitor de curiosidade e aflição. Suspenses! Muitos suspenses que me fizeram devorar as 784 páginas em pouco tempo para tentar juntar as peças do quebra cabeça. A estória flui facilmente e é repleta de tensão.
A peça chave da trama atende pelo nome de Paddy de Courcy, vulgo “imprevisível”, um político solteiro e absurdamente lindo que tem qualquer rabo de saia aos seus pés, mas que vai finalmente pendurar as chuteiras. Ele é o elo que vai conectar as vidas das nossas protagonistas.
Seu noivado fora noticiado nos jornais pegando a mulherada de surpresa, mas uma em especial: Lola, sua namorada até então. Depois de ficar sabendo que o seu amor está noivo de outra pela imprensa escrita, Lola recebe um telefonema do cachorro, digo, político em questão, alegando que o relacionamento deles era apenas diversão. Em outras palavras, ela não passou de um objeto sexual nas mãos dele que, diga-se de passagem, é um pervertido/manipulador incorrigível. Na sequência, nossa estilista cai naquele estado de negação, autocomiseração e de humilhação rasgada (vergonha alheia dela plantada na frente da casa dele pedindo para a amiga levar sopa). Cadê o orgulho? Cadê o amor próprio? Esses se tornam detalhes sem importância depois que você se envolve com Paddy de Courcy e seus belos olhos azuis.
A parte mais divertida do livro definitivamente é quando Lola - que está mais derrubada que o Muro de Berlim (rs) - é forçada pelos amigos e por sua assistente oportunista a tirar um período sabático para: 1) tentar esquecer o safado que lhe dera um chute, 2) parar de estragar seus trabalhos por causa dele e 3) para fugir de Grace que está atrás dela para conseguir uma exclusiva sobre seu relacionamento com Paddy. Isso tudo enquanto o circo pega fogo em Dublin. A garota do cabelo bordô vai para uma cabana em Knockavoy, uma cidade litorânea no interior da Irlanda, e além de fazer novos amigos excêntricos, se vê obrigada a receber homens (heterossexuais) que gostam de se vestir de mulher para uma reuniãozinha nas sextas-feiras (cross-dresser). Tudo em nome do seguro-desemprego! Preciso dizer: o Considine me conquistou. Ele é um fofo!
E assim como temos momentos engraçados, mergulhamos também em outros de puro horror sofrendo junto com as personagens que são submetidas a situações de extrema agonia, mas que infelizmente são reais e rotineiras no mundo atual. Marian desenvolveu a estória ligando a vida de todas as protagonistas de forma espetacular. Sem enrolação e com coerência ela vai entregando os segredos aos poucos deixando o leitor surpreso a cada revelação. Isso foi o que eu mais gostei. Ela força o leitor a juntar as pistas, a prestar a atenção nos diálogos e deixa algumas passagens em aberto, ou seja, o leitor só fica sabendo com quem o fato narrado aconteceu mais para o final e até lá, nós desconfiamos de tudo e de todos! Perfeito!
Enfim, estou cheia de dedos com essa resenha. Não quero entregar muitos detalhes para não estragar a leitura de ninguém. Se você é, assim como eu, fã de Chick Lit, não pode deixar de devorar “Cheio de Charme”! Recomendadíssimo!!!