spoiler visualizarIngrid752 21/05/2023
Que livro!!
Essa história me atravessou com uma força e identificação tão fortes que eu ainda não consegui, e nem sei se vou, assimilar o turbilhão de percepções e reflexões que me foram provocadas.
O enredo é infelizmente comum na vida da população pobre brasileira, mas não tem nada de comum na coragem e potência com as quais Eliana descreve essa narrativa. Ela amplia e escancara o cotidiano dolorido de pessoas negras, que trabalham para brancos, e são expostas a atitudes às vezes explicitas e outras disfarçadas, que impacta e molda suas vidas de forma real, triste e cruel.
É sobre relação entre mãe e filha, preconceito, escravidão, racismo, pacto da branquitude, injustiças, dor, solidão, silêncio, sobre vida.
Durante toda a leitura eu engoli sapos, me desmanchei em lágrimas, senti raiva, muita raiva, fiquei triste, revoltada, orgulhosa, tive muitas lembranças, algumas felizes, a maioria de ausência.
E é por essas e por muitas outras que a literatura é imprescindível, é necessária. E quando me deparo com a escrita absurdamente magistral de Eliana, sobre algo que não é falado, não é muitas vezes sequer notado na sociedade, eu me emociono, me entrego, e indico muito, porque se tem um caminho que sempre funciona é a arte! E como eu costumo dizer: a arte pode ser linda, e nos gerar desconfortos e incômodos ao mesmo tempo, e isso é um talento singular, que Eliana domina de forma majestosa.
A ?explicação? do título e os "narradores" finais são surpreendentes!
Não é uma leitura tranquila, é dedo na ferida! Mas na minha opinião leitura obrigatória para vida!
? "Hoje penso por quantos séculos uma mulher mais velha como minha mãe teve que consolar outra mais nova por prantos parecidos e naquele mesmo espaço, a cozinha, dizendo aquelas mesmas palavras."
? "Eu e mamãe continuávamos ali, na gaiola dourada do edifício Golden Plate. Éramos pássaros dentro de um viveiro luxuoso, mas uma jaula deixa de ser a vilã da liberdade só porque é pintada de dourado? Tínhamos asas condicionadas que vez ou outra nos levavam para outros pousos: nossa casinha no subúrbio distante ou para algum outro lugar, mas o retorno ao ?criadouro? era certo."