Carla.Parreira 30/04/2024
O Curso do Amor (Alain de Botton). Melhores trechos: "...Um casamento não começa com o pedido, nem no primeiro encontro. Começa muito antes, com o nascimento da ideia de amor, e, sendo mais exato, com o sonho de uma alma gêmea... O amor é a admiração pelas qualidades do ser amado que prometem corrigir nossas fraquezas e nossos desequilíbrios; o amor é a tentativa de se completar... O amor também é, na mesma medida, uma questão de fraqueza, de se deixar tocar pelas fragilidades e mágoas do outro, especialmente (como acontece nos primeiros momentos) quando não corremos o risco de ser responsabilizados por elas. Ver quem amamos desanimado e em crise, aos prantos e se sentindo incapaz, pode nos tranquilizar no sentido de que, apesar de todas as virtudes, ele também não é detestavelmente invencível. Muitas vezes também se sente confuso e desorientado, constatação que nos confere uma função de apoio, reduz a vergonha de nossas próprias inadequações e nos aproxima dele com base em uma experiência comum de dor... O amor chega a seu ápice nos momentos em que o ser amado se revela capaz de entender, com mais clareza do que os outros foram capazes — e talvez até melhor do que nós mesmos —, nossas partes caóticas, embaraçosas e vergonhosas. O fato de alguém entender quem somos e, ao mesmo tempo, demonstrar empatia e perdoar o que vê está por trás de toda a nossa capacidade de confiar e nos doar. O amor é um dividendo da gratidão que sentimos pelo que a pessoa amada é capaz de perceber de nossa própria psique confusa e perturbada... Antigamente, quando (em teoria) as pessoas só podiam fazer sexo depois do casamento, os observadores mais sensatos sabiam que haveria quem se sentisse tentado a se casar pelos motivos errados — argumentando, assim, que os tabus em torno do sexo pré-conjugal deviam ser descartados para ajudar os jovens a fazerem escolhas mais calmas e menos impulsivas. Porém, se esse empecilho específico ao bom julgamento deixou de existir, outro tipo de ânsia parece ter tomado seu lugar. O desejo de companhia não é menos poderoso ou irresponsável, em seus efeitos, do que a motivação sexual foi um dia. Passar cinquenta e dois domingos seguidos sozinho pode acabar com a prudência de uma pessoa. A solidão também pode provocar uma repressão e um surto nada desejável de dúvida e ambivalência a respeito de um cônjuge em potencial. O êxito de qualquer relacionamento deve ser determinado não apenas pelo grau de felicidade de um casal quando juntos, mas pelo grau de preocupação de cada um dos parceiros com a eventualidade de não estar em nenhum relacionamento... Acreditamos estar buscando a felicidade no amor, mas o que queremos mesmo é familiaridade. Tentamos recriar em nossos relacionamentos adultos aqueles exatos sentimentos que conhecíamos tão bem na infância — e que raras vezes se limitavam a ternura e afeto. O amor que a maioria de nós experimentou bem cedo vinha misturado a outras dinâmicas mais destrutivas: o sentimento de querer ajudar um adulto fora de controle, de privação do afeto de um dos pais ou medo de sua raiva, ou de não ter segurança suficiente para comunicar nossos desejos mais complicados. Como parece lógico, então, que na idade adulta rejeitemos certos candidatos não por serem errados, mas por serem um pouco certos demais — no sentido de parecerem, de alguma maneira, excessivamente equilibrados, maduros, compreensivos e confiáveis —, já que, em nosso coração, essa adequação parece estranha e imerecida. Saímos em busca de pessoas mais interessantes, não por causa da crença de que a vida com elas será mais harmoniosa, mas pela sensação inconsciente de que, de uma forma tranquilizadora, elas vão parecer familiares em seus padrões de frustração... O romantismo não apenas aumentou o prestígio do sexo monogâmico; também contribuiu para fazer com que qualquer interesse sexual por estranhos pareça insensato e cruel. Redefiniu, de maneira poderosa, o significado do desejo de dormir com uma pessoa que não seja nosso parceiro habitual. Transformou todo interesse extraconjugal em uma ameaça e, não raro, em algo próximo de uma catástrofe emocional... O que faz com que as pessoas se comuniquem bem é, basicamente, a capacidade de não se intimidar com os aspectos mais problemáticos ou incomuns do próprio temperamento. Elas conseguem encarar sem problema algum sua raiva, sua sexualidade e suas opiniões impopulares, estranhas ou fora de moda sem perder a autoconfiança ou desmoronar de vergonha. São capazes de falar com clareza porque desenvolveram uma percepção inigualável do que é aceitável nelas. Gostam o suficiente de si mesmas para acreditar que são dignas da boa vontade dos outros e que podem conquistá-los, se forem capazes de se apresentar com o devido grau de paciência e imaginação. Na infância, esses bons comunicadores devem ter tido a sorte de contar com responsáveis que sabiam amá-los sem exigir que tudo neles fosse apropriado e perfeito. Esses pais eram capazes de conviver com a ideia de que seus rebentos poderiam às vezes — por algum tempo, pelo menos — parecer estranhos, violentos, raivosos, maus, exóticos ou tristes, e ainda assim merecer um lugar no círculo do amor familiar. Dessa forma, os pais criavam um inestimável manancial de coragem ao qual essas crianças poderiam um dia recorrer, em busca de apoio às confissões e conversas diretas da vida adulta... Os bons ouvintes não são menos raros ou importantes do que os bons comunicadores. Neste caso, também é fundamental um grau incomum de confiança — uma capacidade de não se deixar desconcertar ou de não vergar ao peso de informações capazes de contestar certos pressupostos bem assentados. Os bons ouvintes não se preocupam com o caos que os outros possam criar por um tempo em suas mentes; já passaram por isso e sabem que no futuro tudo pode voltar ao seu devido lugar... A monogamia é o estado natural do amor. Uma pessoa equilibrada só pode querer amar uma outra pessoa. A monogamia é o carro-chefe em matéria de saúde emocional... Ser maduro, segundo nos dizem, é ir além da possessividade. Ciúme é para bebês. A pessoa madura sabe que ninguém é dono de ninguém. É o que as pessoas sábias nos ensinam desde nossos primeiros dias: deixe o Jack brincar com o seu caminhão de bombeiros, não vai deixar de ser seu se ele brincar um pouco. Pare de se atirar no chão e de socar enfurecido o tapete com seus pequenos punhos. Sua irmãzinha pode ser a queridinha do papai. Mas você também é o amor do papai. O amor não é como um bolo, quando a gente dá amor a uma pessoa, não significa que haja menos para os outros. O amor está sempre aumentando toda vez que chega um novo bebê à família. Depois, o argumento faz ainda mais sentido nas questões do sexo. Por que pensar mal de um parceiro só porque ele se afastou durante uma hora para esfregar determinada área do corpo na de um estranho? Afinal, você não ficaria furioso se ele jogasse xadrez com uma pessoa que você não conhece ou entrasse para um grupo de meditação cujos membros conversassem de maneira íntima e à luz de velas acerca de suas vidas, não é mesmo?..."