Naty__ 26/01/2017“– Não conte para a mamãe – disse ele, dando-me uma breve sacudida. – Isso é um segredo nosso, Antoinette, você me ouviu?
– Está bem, papai – respondi. – Não vou contar.
Mas contei. Eu sentia segurança no amor de minha mãe. Eu a amava, e ela, eu sabia, me amava. Ela o mandaria parar.
Mas não mandou.” (p. 55)
Parece algo surreal, mas o índice de abuso sexual infantil é alarmante, não apenas aqui no país como no mundo. No Brasil, cerca de três denúncias de abuso e exploração, por hora, foram registradas em 2014, fora os que não foram notificados. O estupro está cada vez mais comum em países desenvolvidos. Numa pesquisa realizada, pode-se constatar que os Estados Unidos, Canadá, Suécia e Reino Unido estão no topo da lista de países com maior índice de estupro.
Pessoas deveriam ser fortes para não chorar... mas, o mais importante, outras deveriam ser humanas o suficiente para não fazer tanta crueldade com uma criança.
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O nome dela era Antoinette e tinha 6 anos quando tudo aconteceu. Seu pai, um crápula, abusou sexualmente dela e, agora, adulta, resolve mudar seu nome para ver se as lembranças são apagadas também. Mas é assim que ela, agora chamada Toni, se engana. E, com essa dor latente, ela decide escrever este livro com memórias de uma infância perdida.
É impossível esquecer tamanha crueldade.
É impossível apagar tantas dores.
E, nós, reles leitores, o que queremos? ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Chorar.
Chorar.
E chorar.
Chorar porque queremos salvá-la, queremos dar um mundo melhor para aquela garotinha, mas não é possível.
Abusada pelo pai, abandonada pela mãe que se recusa a ajudar, a garotinha se sente sozinha, desamparada, apenas com suas duas cadelinhas e uma galinha. O que uma menina, de apenas 6 anos, poderia esperar de uma família horrível, de uma casa quase abandonada e de uma vida perdida?
Ela só deseja a noite, que chegue a noite e o silêncio para pegar seu livro e ler, ler até não aguentar mais. E assim poder viver em outros mundos, em outra realidade bem distante da sua.
Antoinette nos ensina que nada que vivemos é tão ruim quanto realmente parece, sempre existirá alguém que está pior do que nós. Parece até clichê falar isso, parece que virou moda. Mas, nesse caso, é isso mesmo. Ninguém poderia reclamar de uma situação ruim se observasse o que essa garota, de apenas 6 anos, teve de passar.
As descrições no livro são fortes o suficiente para deixar o leitor comovido e despreparado para o que virá a seguir. Quando parece que tudo vai acabar, que todas as lágrimas serão secadas, então Antoinette engravida e toda a esperança de felicidade, de infância feliz, se vai. Ela é só uma criança, mas o que poderiam pensar? O que poderiam exigir de uma garotinha que mal tem estímulo para viver, pois é um objeto sexual pelo pai e uma escrava pela mãe?
Saber que essa história é real causa um desconforto e ficamos nos perguntando como um ser humano, que se diz ser PAI, pode fazer uma coisa dessas com a sua própria filha. A gente não quer saber de prender o desgraçado, de prender a mãe ou de tirar a menina daquela casa, o leitor deseja a morte do pai, da mãe e a morte de uma lembrança tão dura e cruel.
A gente deseja uma Antoinette renovada, que acorde sem recordar do órgão penetrando em seu corpo e machucando-a de forma desumana, do sangue escorrendo por entre as pernas, da saliva descendo em sua garganta e dos tapas ardendo sua pele. Desejamos uma infância feliz, como toda criança deveria ter. Mas o desvio da realidade nos atinge e somos despertados de um sonho. É impossível imaginar um sorriso naquela face ou uma sensação de paz em sua vida.
A capa do livro consegue passar uma dor indescritível. Um olhar triste, que demonstra sofrimento, angústia; o nome da autora, bem na região dos lábios, denota que é para se calar, não dizer nada à mamãe, conforme o título. A diagramação é simples, porém bem confortável. Revisão? Bom, essa parte eu não consegui prestar atenção de forma detalhada; grande parte da leitura foi feita com os olhos embaçados, então fica difícil indicar erros. Não lembro de ter encontrado.
É necessário estômago forte para ler este livro e um pacote de lenços para secar tantas lágrimas que hão de cair. É impossível não chorar, leitores. Sim, impossível.