luan_dal 27/05/2022
anita malafatti e oswald de andrade se retorcendo no caixão, e monteiro lobato e miss marple aplaudindo
Já pensou você indo a um maravilhoso hotel em Cancun, Milão, Nova York ou Gramado Serra Gaúcha preparade para desfrutar de suas merecidas férias e desejando um descanso tranquilo, mas aí chega uma celebridade no hotel, e tem velhinhas fazendo fofoca, e tem adolescentes irritantes, e tem mentira, traição, feitiçaria e muitas outras coisas mais, incluindo um desaparecimento?
Se você pensou nisso tudo, você é um pouco desequilibrade mental, e se você nunca pensou você também é desequilbrade pois o perigo está aí, só não vê quem não quer.
Mas o caso é que Miss Marple tá nesse hotel onde tem de tudo e aí, como ela é fofoqueira e velhinha, vai ficar ouvindo a conversa alheia e conversar com a polícia para solucionar todos os crimes que acontecem no Hotel Bertram (de tanto crime parece até mesmo o Palácio do Planalto and i oop!)
O livro é um dos últimos que a Agatha escreveu, quando ela já tava meio velhinha, meio cansada, e dá pra perceber. Os personagens não cativam, a história não é muito empolgante; a solução é fraca e anticlimática, mas faz sentido e tem alguns pontos interessantes.
Algo notável no livro é o discurso sobre modernidade e tradição/costume, entre presente e passado. Logo no início da história, numa conversa entre Miss Marple e lady Selina, é demonstrado o desgosto com o progresso, com a revitalização e modernização do hotel Bertram (que, sobrevivendo à guerra, foi restaurado de forma que mantivesse o aspecto eduardiano/vitoriano, mas oferecesse o conforto moderno, para agradar tanto os hóspedes ingleses quanto os estrangeiros - viva a globalização e desejo por lucro!!!).
O "disparate modernista" volta no final do livro para se referir a uma mulher, a femme fatale do livro. Descrita como muito bonita e inteligente, independente e indomável, essa mulher é vista como uma ameaça, capaz de cometer atrocidades "das quais não se pode nem falar" mais apropriadas à época em que "cada um tinha que cuidar de si mesmo, um tempo em que todos tinham de lutar para se manterem vivos", segundo o policial Davy.
Esse discurso sobre as femme fatale não ocorre só na ficção, mas também na vida real. Desde o século XIX as mulheres passaram a ter mais direitos sociais e autonomia, o que as transformou em perigo ao matrimônio e ameaça ao poder e ordem masculinos.
"O caso do Hotel Bertram" insere essa personagem como alguém complexo, que vivencia um paradoxo e toma decisões pensando em quem ama. Seria tudo tranquilo se ela não fosse punida por ir contra as normas sociais, à lei e ordem, e descrita como indomesticável.
No geral, "Hotel Bertram" não é um dos melhores livros de Agatha, mas tem seu charme e pode agradar quem gosta de uma história tranquila, divertida e previsível.