Dri Ornellas
07/04/2011A solidão dos números primos. O título diz muito sobre a história. Uma solidão a dois. Uma solidão incompleta e que nunca cessa.
O livro de Paolo Giordano tem uma linguagem simples, mas com significados profundos. Conta a história de Alice e Mattia, dois amigos marcados por tragédias durante a infância que compartilham o deslocamento do mundo e, como opostos (menino/menina - homem/mulher), se atraem e como se semelhantes (com a mesma dor), se repelem.
Alice não conseguia se impor com seu pai. Em mais um dia fazendo uma atividade por gosto dele, ela sofre um acidente que mudará permanentemente e suas relações com sua família.
Mattia vê em sua irmã gêmea um obstáculo à normalidade. Ela é a pressão que o mantém à margem daqueles que poderiam ser seus amigos e o estigmatiza como diferente. Em um dia, isso acaba; mas Mattia não se desvencilha de seu incômodo interno.
No começo da adolescência, eles se encontram e durante boa parte de suas vidas estarão entrelaçados. Ao mesmo tempo em que desejam ficar juntos, uma vontade invisível os mantém separados. Os dois se sentem esquecidos do mundo, vivem em luta para se manterem à parte do comum, do normal; querem ficar esquecidos. Apesar disso, cada um a seu modo (ela através de distúrbio alimentar e ele por meio de autoflagelação), eles gritam por ajuda para se livrarem do sentimento de impotência permanente de não poderem mais alterar os episódios de seu passado que definiram o modo deles enxergarem suas vidas.
Nesse ponto, eles brigam com seus sentimentos, mas acabam se deixando levar pelas situações. Ficar junto significar renunciar de vez à sociedade e se entregarem à um mundo particular. Ficar separado é admitir a necessidade de adaptação ao mundo e tentar seguir em frente mesmo com seus fantasmas do passado.
Pode parecer um pouco confuso, mas o livro é apenas a narração de fatos de uma história que pode ser considerada até sem graça, mas que a luz dos sentimentos de seus protagonistas revela uma grande profundidade. Para tentar entender, só há o caminho subjetivo.
No livro há uma parte (muito bonita, por sinal) onde há uma pequena explicação para o título do livro.
Os números primos são divisíveis apenas por um e por si mesmos. Estão em seus lugares na série infinita dos números naturais, comprimidos entre dois, como todos, mas um passo adiante em relação aos outros. São números suspeitos e solitários, e por isso Mattia os achava maravilhosos. (...)
Em um curso do primeiro ano, Mattia tinha estudado que entre os números primos existem alguns ainda mais especiais. Os matemáticos os chamam de primos gêmeos: são casais de números primos que estão lado a lado, ou melhor, quase próximos, porque entre eles sempre há um número par, que os impede de tocar-se verdadeiramente. (...)
Mattia achava que ele e Alice eram assim, dois primos gêmeos sós e perdidos, próximos mas não o bastante para se tocar de verdade.
Na resenha do site Orgia literária, é levantada a metáfora feita pelo livro da vida com a matemática, sendo mais uma interpretação (muito bem acertada) com o título.
A história é trágica, mas bonita e com um texto poético. Uma ótima leitura! O livro tem uma adaptação cinematográfica que foi muito elogiada no Festival de Veneza em 2010, com roteiro escrito pelo próprio Paolo Giordano.