Andresa 07/02/2020"(...) nunca existiu um menino mais arrogante nesse mundo."Acredito que quase todo mundo cresceu assistindo aos filmes infantis da Disney, e Peter Pan é um de seus mais famosos. O tão popular menino que não queria crescer é conhecido por todos e encanta tanto jovens quanto adultos que se identificam com a filosofia do livro (quem nunca também ouviu falar em Síndrome de Peter Pan?).
Confesso, no entanto, que essa nunca foi um das minhas histórias preferidas, principalmente pela personalidade de Peter. O personagem é um dos mais controversos que já conheci, sendo extremamente vaidoso e cruel, o que a princípio não parece se encaixar com as características infantis da bondade e inocência que esperamos encontrar nas histórias para crianças.
A história, na verdade, sequer foi iniciada como um livro. Seu autor, antes de colocá-la no papel, a contava para os filhos pequenos de seus amigos como uma forma de recordar de seu irmão, que faleceu ainda muito jovem. Além disso, a história antes tornou-se uma peça, na qual o filme foi baseado, para só então poder virar páginas de um livro.
Existem diversos elementos fantasiosos no enredo, bem típicos das histórias infantis, como voar, conversar com estrelas, fadas ciumentas, uma babá que na verdade é uma cachorra e muitos outros!
Os pais das crianças Darling são de uma crítica incrível, principalmente o Sr. Darling, homem vaidoso, tolo e que gostava de ostentar o que não tinha. Há diálogos surreais, como quando os pais fazem cálculos e teorias se ficam ou não com as crianças devido a como a permanência delas na casa ia afetar as finanças da família.
É justamente por isso que ele possuem uma babá canina que, apesar de cuidar muito bem das crianças, foi escolhida para a função apenas por representar um custo a menos. A redenção do Sr. Darling foi um dos pontos fortes pra mim na leitura!
Outro ponto interessante é que, para a época em que foi escrito, o livro possui elementos bastante machistas, como a necessidade de se levar Wendy a Terra do Nunca para que seja mãe dos meninos perdidos. Por mãe, entende-se cuidar das crianças e da casa. Assim, Wendy quase não participa das brincadeiras e aventuras, aparecendo constantemente a remendar roupas, fazer comida e cuidar dos garotos. Ao mesmo tempo, existe o contraste de apresentá-la sempre como a personagem mais sensata, onde as meninas são constantemente elogiada como mais inteligentes que os meninos.
E por falar em aventuras, temos aqui bastante crueldade para um livro infantil. Os garotos, que tem como inimigos os piratas e seu chefe, o famoso Capitão Gancho, disputam episódios sangrentos, com direito a espadas, mortes e sangue! Confesso que fiquei chocada de encontrar esses elementos, mas, em contrapartida, o conflito a bordo do navio pirada foi a minha parte preferida da história.
Para finalizar, a mensagem do livro (que, sendo honesta, só captei após a discussão com os outros leitores do clube) é essa visão de que a infância deve ser bem aproveitada, ignorando-se o futuro que nos espera enquanto adultos, onde a magia e a forma simples e leve de ver a vida, acreditando no impossível, acabam desaparecendo dos nossos corações, dando lugar a uma existência monótona e sem aventuras.
O único que parece imune a essa ação do tempo é o próprio Peter, que representa, então, o clico infinito da magia presente na infância, que nunca se acaba enquanto novas gerações de crianças que acreditam nele vão surgindo no mundo.
Foi uma experiência muito interessante ter lido esse livro. Gosto muito de reler contos de fadas e perceber que, na vida adulta, a gente acaba tendo uma visão muito literal sobre o que lemos, reforçando a teoria do livro de que perdemos o encanto com a idade. Discuti-lo foi mágico, pois pudemos nos relembrar da nossa infância e do quanto essa leitura seria mais bem aproveitada na nossa mente infantil - embora as lições morais, as pequenas críticas sociais e o sarcasmo da escrita só sejam compreendidos pelos adultos.
Como disse, não é meu conto de fadas preferido e não simpatizei com o personagem novamente. Há trechos um pouco confusos, que admito não ter entendido, mas acredito que é uma leitura muito válida para crianças que estão iniciando sua vida leitora e adultos que gostam de ler um bom clássico que atravessa gerações - não só para apreciá-lo, mas entendê-lo em seu contexto histórico e de criação por trás da obra, muitas vezes mais interessantes que ela própria.
site:
https://umdiamelivro.com/2020/02/06/resenha-peter-pan-de-j-m-barrie