Marcus 14/12/2021
Aurelianos, Josés Arcádios e Macondos.
Desde que terminei o livro quero escrever uma resenha, mas não consegui até agora porque não tinha ideia do que dizer. É um livro muito denso, é difícil acreditar que ele tem 400 páginas, e não +1000, e narra um período longo com muitos acontecimentos: crianças nascendo com rabos de porco, mortos voltando para este mundo, chuvas que duram anos, borboletas que seguem um garoto, uma menina que um dia decide voar e some pelo céu, pétalas amarelas que cobrem a vila, uma infestação de formigas de fogo, uma peste de insônia. Muita, muita coisa acontece nesse livro. Mas o que mais me chamou atenção foi a repetição da história através das gerações.
Fiquei por um bom tempo durante a leitura pensando sobre quem seria a protagonista desses cem anos de solidão. Se seriam os primeiros José Arcádio e Aureliano ou seus filhos e toda a família Buendía. Talvez a vila, Macondo, que tem seu nascimento e seu esquecimento narrados do primeiro ao último parágrafo do romance. Ou se não seria a própria solidão a protagonista dessa obra, por ser o sentimento que domina a todos os personagens, até o fim da estirpe dos Buendía. Contudo, foi quando pensei sobre Macondo sem os Buendía, ou os Buendía em outro lugar que não Macondo, que ficou mais claro que aquela terra e aquela família eram um só, começaram juntos e se encerram juntos também, e possuíram a solidão ligadas a elas durante anos, passando dos pais para os filhos e deles em diante.
Macondo nasce apenas como uma fuga do casal "original" dos Buendía, que fugiram por serem primos e o incesto não ser aceito onde viviam, o que gerava uma angústia nos dois, ainda mais quando o marido teve de matar um homem em um duelo de honra, então preferiram outro lugar isolado daquele. Disso nasceu a primeira solidão da linhagem, em consequência da culpa que os ligava, por causa maldição lançada por aqueles com que viviam. Têm filhos que nascem e crescem na solidão daquela casa criada na solidão também, e o mesmo acontece pelas próximas décadas; os nomes se repetem, os erros se repetem, e o gelo, anunciado por ser o grande invento daquele tempo, do qual todas as casas seriam construídas, toda a vila, todas as pessoas, passa a ser confundido por espelhos, com todos os personagens através de um século parecendo que são um só, até o fim do ciclo, quando nasce alguém de uma relação não baseada na solidão, uma relação que não vai de acordo com o "correto" daquela vila e ainda assim mais profunda que as outras, quando todo o passado daquelas pessoas e daquele lugar é enfim conhecido e calculado e o os personagens e Macondo parecem enfim fugir do ciclo, mas tarde demais, pois logo são esquecidos. Já estavam condenados desde o início, talvez pela maldição lançada sobre eles, talvez por se condenarem ao tentar fugir dela, como acontece com muitos Aurelianos e Josés Arcádios por muitas Macondos.
(Nem consegui falar dos paralelos com a Bíblia e a história da América Latina porque se não a resenha ia ficar ainda mais gigante, mas esse livro fala de MUITO mais coisas, essa foi só uma parte mais pessimista que eu me interessei bastante).