Jaqueline 27/12/2010Para começo de conversa, esqueça o “Pleno de fantasia e romantismo” que a revista Vanity Fair usou para caracterizar esta obra. Alma sempre teve pesadelos, mas desde que adquiriu um caderno roxo em uma misteriosa papelaria sua mente encontra-se repleta de trevas. Não, não pense no anime japonês “Death Note”: o esquema de “Escuridão” é bem diferente.
Nossa protagonista tem 17 anos e vive em uma cidade decadente. Estuda em uma escola precária e, ao contrário do que vemos em muitos livros jovens, não possui dinheiro para esbanjar. Mesmo assim, é a rainha da sua escola: ela e as amigas Agatha, Naomi e Seline são as verdadeiras donas do pedaço, aliando inteligência e beleza. Sua família é formada pela mãe, que atualmente namora o dono de uma lanchonete, e os irmãos mais novos, frutos do segundo casamento de Jenna. Contudo, desde que o cara se suicidou, tudo entrou em declínio: a irmãzinha mais nova não falou mais uma palavra daquele dia em diante e o irmão de 15 anos age como um adolescente revoltado, usando roupas rasgadas e cheio de piercings.
As mortes com que sonha passam a tomar as páginas de seu caderno, e tudo vira de ponta-cabeça quando ela descobre que estes crimes aconteceram exatamente como apresentados no caderno, de modo bárbaro e cruel. A narração dos crimes é muito boa, um dos pontos altos do livro. Alma não consegue se lembrar de escrever aquelas páginas e passa a ser atormentada por dores de cabeça fortíssimas. Para piorar, ela passa a ser seguida por estranhos homens de chapéu, casacos compridos e óculos.
Adianto que Alma não é uma protagonista das mais fáceis: ela age como se estivesse sob o efeito de algum antidepressivo de uso prolongado, fazendo com que reste apenas um existencialismo juvenil e um sarcasmo na sua forma mais amarga. Fora isso, nos primeiros capítulos ela é fútil além da conta, sempre fria e autocentrada. Para ela, o único bem real em sua vida é ser bonita, coisa que ela ressalta usando roupas justas e botas de saltos altos. Uma protagonista bem chatinha, salva apenas por algumas frases que apontam seu lado mais observador, mais analítico, que cresce ao passar das páginas.
Apesar de um bom plot, a trama se desenvolve de modo arrastado, principalmente em sua primeira metade. A narrativa em primeira pessoa não consegue criar a devida conexão com o misterioso mocinho da história, Morgan. O romance não é a tônica do livro, então se você espera suspiros, juras de amor e beijos sôfregos, “Escuridão” não é para você. É ele quem cita o nome dos Masters, homens de quem Alma deve fugir, mas maiores detalhes sobre eles não são revelados.
Ao lado de todo este caos pessoal, as amigas de Alma parecem ficar mais estranhas, afastando-se umas das outras por motivos inexplicáveis. Tudo começa com um vídeo de Seline seminua que cai nas mãos dos colegas de escola. A garota entra em crise e suas amigas se vingam de Adam, menino com quem ela estava saindo e foi o autor do vídeo. Em seguida, a jovem Naomi conhece e começa a sair com um garoto bastante suspeito, Tito. Já Agatha torna-se cada dia mais agressiva e fechada, isolando-se de todos com a desculpa de cuidar da tia doente com quem vive.
Um anel com o símbolo de um dragão marinho incrimina Adam em um incidente escolar, mas é Tito o rapaz realmente assustador. O tenente Sarl e o jornalista gatinho Roth são fundamentais no auxílio à Alma, de modo que ela consegue resolver algumas das situações secundárias do livro ainda neste primeiro volume da trilogia da italiana Elena P. Melodia.
A história não chega a nos dar medo. Quem já leu alguns contos de Edgar Alan Poe ou até mesmo o moderno “Noturno” (de Chuck Hogan e Guillermo Del Toro) não fica com medo algum, mas apenas levemente interessado no que a autora vai apresentar em seguida. Apenas quando Alma visita a estranha moradia de sua amiga Agatha a história atinge pontos mais sinistros. Aliás, bem sinistros: a menina esconde um dos maiores segredos do livro, e o único que Alma consegue desvendar neste primeiro volume da trilogia. No entanto, a ausência de respostas ou pelo menos pistas para o que realmente importa me deixou muito insatisfeita com a história.
>> Resenha originalmente postada em www.up-brasil.com