jota 17/05/2015Cotoquices...Cotoco é sobre um ano (1990) na vida de John Milton, um garoto branco sul-africano de 13 anos, classe média baixa (daí que ele é bolsista no internato em que estuda), cujo pai quase enlouquece ao saber que Nelson Mandela está próximo de ser libertado e que o apartheid se aproxima do fim. O pai teme que a África do Sul se transforme num país comunista.
Apesar dessa paranoia, Cotoco (também o apelido do narrador por conta de uma característica física) não é um drama, não é um livro, digamos, sério, mas uma história cômica contada em forma de diário, se não de modo hilariante, pelo menos engraçado. “Perversamente engraçado”, como está destacado no subtítulo do livro.
No diário são registradas não apenas as impressões que o garoto tem de sua própria família (pai, mãe e avó, todos esquisitos de alguma maneira), mas especialmente as peripécias, as aventuras e sobretudo as brincadeiras (muitas delas estúpidas) de um grupo de garotos endiabrados, alunos de um tradicional internato particular durante o ano da libertação de Mandela.
Quando Cotoco, que tem o mesmo nome de um poeta inglês, John Milton (1608-1664), está sem os companheiros, sozinho em seu quarto, também nos divertimos acompanhando seus pensamentos originais sobre diversas coisas que o preocupam ou divertem. Da mesma forma, quando ele nos conta seus sonhos com uma garota que apelidou de Sereia, alguns deles de conteúdo erótico. E sexo é um dos assuntos mais comentados pelos garotos. A maior parte do tempo grosseiramente, claro.
Quase sempre Cotoco traz consigo um livro – o que não é muito bem-visto pelos demais internos, “coisa de boiola”, julgam -, a maioria das vezes recomendado pelo professor de inglês, um sujeito que nem sempre está exatamente sóbrio em seu tempo livre, pois se embebeda de vinho em várias ocasiões. E ainda pode servir meia taça ao menor Cotoco.
Bem, algumas coisas que acontecem nesse internato sul-africano definitivamente não estão no gibi. Mesmo monitorados por estudantes mais velhos e inspetores, os internos vivem aprontando o tempo todo e dificilmente são expulsos, pois lá também a propina (em forma de doações para o estabelecimento) falava alto. Não à toa, a África do Sul faz parte dos BRICs, não? Brincadeira...
John Van de Ruit coloca na boca de seus personagens menções a filmes e atores dos anos 1980-1990, também cantores, canções etc. Para quem gosta de listas (ou dicas literárias), aí vão alguns livros que são citados durante a narrativa, vários deles que o professor de inglês recomenda ou empresta para Cotoco, alguns que li e outros não: Senhor das Moscas, de William Golding; Esperando Godot, de Samuel Beckett; O Apanhador no Campo de Centeio, de J. D. Salinger; Ardil 22, de Joseph Heller; O Senhor dos Anéis, de J. R. R. Tolkien; À Espera dos Bárbaros, de J. M. Coetzee; O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway e Oliver Twist, de Charles Dickens.
Achei estranho que o professor de inglês tivesse dado a peça de Beckett para Cotoco ler. Ele não apenas leu, como releu e achou genial, diz que adorou. Mas confessa: “Talvez eu esteja mesmo ficando doido! (Preciso notar se ando falando sozinho por aí...)” E desses livros todos, qual o melhor? Para o professor e também para Cotoco: o livro de Tolkien, O Senhor dos Anéis, “o melhor livro já escrito”. Há controvérsias...
Acho que Cotoco ficaria bem com uma nota 3,8, que não existe aqui no Skoob. Então vai 4,0 mesmo. Lido entre 10 e 17/05/2015.