Lauraa Machado 06/09/2020
Sem graça, carisma e tensão. Bem entediante em geral
Eu nunca fui com a cara desse livro. Essa capa me passa uma impressão tão estranha, tão ruim, que nunca quis realmente ler. Minha curiosidade sobre ele me levou só a pesquisar algumas resenhas e decidir finalmente que não queria ler. Mas aí eu ganhei ele de presente alguns anos depois e, quando passou mais do que um com ele na minha estante sem ler, resolvi que tinha passado da hora de eu dar uma chance.
Meus instintos estavam certos. Nas primeiras cinquenta páginas, eu ainda estava curiosa, ele ainda tinha potencial, mas tudo começou a desandar tão rápido, que eu cheguei a pensar em abandonar. Enquanto eu lia, aparecia tanta coisa que me incomodava, que até fiz uma lista. Vou mencionar todas aqui, todas que acho que valem a menção. A primeira delas foi a que mais me incomodou: o livro é bastante gordofóbico. Tem pelo menos uns seis ou sete comentários aqui que me deixaram extremamente desconfortável e me ofenderam. O mais triste é ver que praticamente ninguém se incomoda com isso.
O que mais me fez não ser atraída pelo livro foi a capa, mas sua história provou que encaixa muito bem com a parte gráfica dele. O mundo é tão sem graça, desconfortável e bidimensional quanto a imagem da capa. Nada aqui me faz querer fazer parte dele, nada é divertido, atraente, interessante. Não tem nada de descolado também, que faça a experiência de passar pelo que os personagens passam ser intrigante. É tudo tão sem graça, que os truques do autor de tentar deixar mais atraente são óbvios.
E falharam espetacularmente. O vilão, que mais tinha a chance de tentar deixar o mundo dos ceifadores descolado, não consegue. Esse prazer que ele tem em matar parece e tenta muito, mas não consegue ficar interessante. É tudo tão qualquer coisa, quase lá, quase legal, quase intrigante, mas nunca é. No final da segunda parte, o autor ainda tentou introduzir um elemento para deixar o final mais determinante, mas fez um total de zero sentido. É algo tão pouco característico do mundo utópico do livro, que nem parecia ser da mesma história. Em um mundo sem morte, miséria, com nanites que controlam suas emoções automaticamente, não deveria existir pessoas que tomam decisões como aquela.
Essa é a maior falha do livro. O mundo é tão perfeito, que nem deu espaço para ter falhas. É utópico demais, a ponto de eu nem conseguir acreditar que tinha algo realmente em jogo para os protagonistas. Acabou com a tensão de tudo, e o vilão não foi forte ou complexo o bastante - definitivamente não foi plausível o bastante - para salvar a história. O pior é que o mundo nem é crível. Distopias ou livros futurísticos não precisam ser uma adivinhação do futuro, nem precisa ser plausíveis, só críveis dentro de si mesmos. No começo, até tentei fingir que era algo lúdico, aceitar as regras desse mundo sem questionar, mas suas próprias regras não faziam sentido dentro desse universo.
Ou seja, as pessoas pareciam viver do mesmo jeito que a gente em quase todos os sentidos, com os mesmos hábitos. Por quê, exatamente? Por que estudar em uma escola normal, com colegial e provas se você consegue acessar literalmente todo o conhecimento do mundo pela internet? E por que os ceifadores têm essa liberdade de matar todo mundo do jeito que eles quiserem, quando até hoje em dia procuram jeitos mais humanizados de aplicar a pena de morte? Por que eles aprendem a lutar e a lidar com armas? Achei que foi uma tentativa descarada de deixar o aprendizado mais interessante, mais atraente para o leitor, mas não tem explicação boa o bastante para isso existir, então nem cumpriu seu papel. Aliás, as próprias aulas e ensinamentos dos protagonistas só são passados por cima, não tem substância nenhuma neles e nas cenas em que eles "ocorrem". Falar que eles estão aprendendo não é o mesmo que mostrar, sabe?
Vamos aos personagens? Os mentores foram legais, gostei da Curie, do Faraday e do Volta. No começo, eu gostei até da Citra, mas a maior parte da história dela é contada bem por cima, sem verdadeiras emoções, só uns resumos de acontecimentos, até nas partes que eram para ser as mais tensas. O Rowan me conquistou desde sua primeira cena, mas gostei ainda mais dele no final. Se algum dia eu decidir ler o segundo, o que duvido muito que vou fazer, vai somente por ele. Só que sua relação com a Citra não fez sentido e tirou muito da credibilidade dele como personagem, o que foi forçado à toa, pois o livro não precisava de um romance.
Infelizmente, o romance foi mesmo uma das piores partes, na minha opinião. Eles não têm a mínima química. Até o final, pareciam ser dois colegas de sala que mal sabiam o nome um do outro, mas é claro que o autor fez o favor de tentar enfiar o romance goela abaixo mesmo assim. Faltou tensão aqui também, como faltou no resto do livro.
Esse problema de tensão tem uma causa bem clara. A escrita é okay, mas alguma coisa nela me incomodou desde o primeiro parágrafo. Eu já devia estar na metade do livro quando percebi o que era: detesto narrador onisciente. Não havia a menor necessidade de ser um onisciente aqui. Seria tão mais interessante se fosse narrativa em terceira pessoa, mas focada e limitada em um só personagem por vez. Quem sabe aí eu conseguisse ver mais carisma na Citra.
O enredo é bem chato também, a grande revelação do livro é bem previsível e o desenvolvimento dos acontecimentos de cada personagem são bem sem graça. Foi o aprendizado mais chato da minha vida, e olha que eu mal suportava as aulas de física. Nas últimas páginas, me peguei pensando várias vezes, "Tá, tá, já sei, continua, faz qualquer outra coisa," para trinta mil coisas, pronta para pular parágrafos só para acabar. Não pulei uma palavra sequer, em compensação. Já estava cansada de tudo, é verdade, porque nada aqui me agradou. Foi bem entediante.
E aqui vai o comentário que talvez faça muitas pessoas desistirem de levar a minha opinião em consideração: acho que esse livro, essa ideia e esses personagens teriam sido muito melhor desenvolvidos se tivessem sido escritos por alguém como a Marie Lu. Ou talvez até mesmo como a Suzanne Collins e a Cassandra Clare. Por alguém que conseguisse introduzir carisma, interesse e algo atraente em seu universo sem ter que forçar.
Os personagens dizem que têm nanites (não sei como traduziram) em seu sangue que controlam muita coisa, como suas emoções (emo-nanites), deixando-os sempre calmos. Foi assim que me senti o livro todo, como se emo-nanites estivessem me deixando tão sem emoção que estava apática em relação a tudo nessa história. Não recomendo, mas muita gente gosta, então você tem que decidir o que quer. Só sei que prefiro passar longe dos livros dessa série daqui para a frente e vou começar a confiar mais em meu próprio instinto, que estava certo desde o começo.