Vitória 02/10/2023
Eu não sou a maior fã do Brandon Sanderson. Na verdade, tendo lido a primeira trilogia de Mistborn inteira, e agora esse, eu posso dizer que não gosto quase nada do cara, já que, desses 4 livros, eu só tenho elogios pra um. Cheguei nesse com baixas expectativas, tanto pela minha experiência com o autor como por ser o primeiro livro escrito e publicado por ele, mas as coisas foram ainda piores do que eu pensava que fossem.
Vou começar pelo começo, já que essa é a única parte boa do livro. Acabei relendo o prólogo de O Império Final ontem e tenho o mesmo a dizer a respeito dos dois livros: o cara começa com os dois pés no teu peito e te deixa com uma vontade desgraçada de ler esse negócio. Toda essa coisa dele apresentar os elantrinos como divindades que por algum motivo que a gente não sabe qual é perderam os seus poderes, e de uma cidade que morreu de uma hora pra outra há 10 anos é muito interessante. Ele sai do clichê básico que a gente vê nas fantasias do mundo todo estar sendo ameaçado por uma força desconhecida e delimita isso a um espaço físico pequeno, mas que tem uma grande importância praquele universo. Eu terminei o prólogo gritando enlouquecida, pensando meu Deus, finalmente algo desse homem vai me pegar, mas daí pra frente foi só pra trás.
Não é segredo que eu sou o tipo de leitora que, não importa de qual gênero estejamos falando, preza demais por desenvolvimento de personagem. Se os protagonistas não parecerem reais pra mim, e se eu não conhecer a personalidade deles, todo o resto da história perde a importância e não me serve de nada, e foi exatamente isso o que aconteceu aqui. Temos um grupo de protagonistas e vamos a cada capítulo alternando entre o ponto de vista de cada um deles, e o tempo inteiro eu fazia o ranking na minha cabeça de qual deles era o mais chato. Raoden talvez tenha sido o que menos me irritou, mas acho que isso se deve apenas ao fato de ele ser o único que estava dentro de Elantris, então os capítulos dele eram os mais diferentes, e os que sempre tinham algo acontecendo. Mesmo assim, eu não consegui comprar o negócio do cara ser um líder nato e conseguir mudar toda a estrutura de sociedade da cidade em menos de um mês simplesmente porque não é falado o que aconteceu com o Raoden pra que ele se tornasse esse cara, ele apenas é. Galladon deve ter sido o meu personagem favorito do livro inteiro, mas ele repetia tanto o negócio do "kolo?" que eu só queria bater em alguém toda vez que lia essa palavra.
A Sarene é insuportável. É outra que entende de política como ninguém sem motivo algum, porque não é contado nada sobre a personagem, e que tem como principal estratégia se fazer de burra pros outros pra conseguir informações que ninguém mais tem. Sinceramente, me poupe. Essa coisa da mulher fingir ser uma tapada é um plot fraco que não funciona mais há pelo menos 30 anos. Sem falar que não faz o mínimo sentido que ela consiga enganar pessoas que são colocadas no livro como os grandes vilões dessa forma. O romance entre ela e o Raoden, mesmo que seja algo mínimo, ainda assim conseguiu me dar vontade de bater a cara na parede. É dito que os dois tinham certo envolvimento na época em que foram prometidos em casamento porque trocavam cartas com frequência, mas a partir do momento em que eles se reencontram e percebem que o sentimento ainda está presente ali, eu não conseguia acreditar em nada porque nada dessas cartas é mostrado pro leitor. Além disso, a própria Sarene, ao chegar na cidade e saber que o Raoden "estava morto", dá pouca ou nenhuma importância pro fato, se importando só com as consequências políticas disso, então nada nesse plot faz o mínimo sentido.
Mas o pior de todos foi o Hrathen, porque é nos capítulos dele que um dos grandes problemas do autor nessa obra fica mais escancarado. Aqui nós temos cidades, povos, línguas, religiões com suas organizações internas e credos que não são explicadas pro leitor em momento algum. Eu li um livro de quase 600 páginas e se você me perguntar agora qual era o papel do Hrathen dentro da religião do qual ele era adepto e no que esse pessoal acreditava eu não vou saber responder, porque a única coisa que me foi dita durante essas 600 páginas foi que ele tinha poder e influência suficiente pra mandar numa galera. Sem falar que a única construção que o cara tem durante o livro inteiro é o fato dele ser o vilão da história, pra chegar no final e ele mudar de lado sem motivo algum quando as coisas parecem sem solução. Quando a gente chega nos capítulos dos outros protagonistas depois desse fato e eles próprios falam que não sabem o que aconteceu com o Hrathen pra que ele fosse contra tudo o que ele acreditava e morresse por isso eu tive que me segurar pra não jogar o meu Kindle na parede de tanto ódio.
Como se não bastasse os personagens, o resto do livro também é péssimo. O autor não explica nada, seja sobre a sociedade desse mundo ou a própria fantasia, tanto que a única coisa que eu aprendi sobre a magia desse universo é que os elantrinos conseguiam seus poderes desenhando coisas no ar. E vamos combinar que, pra um autor que claramente não sabe o que está fazendo, deixar as coisas confusas pro leitor é uma ótima saída pra que, em pontos de virada da narrativa, ele possa enfiar qualquer plot ali no meio sem fazer com que isso vá contra as regras da história, já que sequer temos regras. O Brandon Sanderson pode até enganar um leitor iniciante desse jeito, mas comigo isso não funciona. E a grande revelação do motivo por trás da morte da cidade é de fazer chorar de tão ruim. Você quer mesmo me fazer acreditar que os caras que eram deuses e que faziam magia com grafias baseadas no mapa desse mundo se deixaram morrer porque ninguém pensou que o surgimento de um desfiladeiro faria essa língua mudar um pouquinho? 10 anos de desgraça pra um Zé ninguém passar um mês na cidade e descobrir isso?
No fim das contas, essa é uma fantasia fraca, com uma construção de universo e de magia quase que negativa. O livro claramente não precisava ter 600 páginas. O autor gasta capítulos e capítulos com discussões políticas das quais o leitor não entende nada porque sequer nos é dito quem são esses reinos envolvidos no meio da treta e o motivo deles estarem ali, e no fim das contas isso sequer tem alguma contribuição pro desfecho da história. Por outro lado, pontos importantes que deveriam ter espaço no livro, como é o caso do desenvolvimento dos protagonistas, de certos flashbacks que deixariam a história mais rica, e da explicação da fantasia, são jogados pro canto como se não valessem nada. Terminei minha quarta leitura do Brandon Sanderson ainda sem entender o que os fãs de fantasia épica veem nesse cara, porque até a Sarah J. Maas que eu já disse milhões de vezes aqui que não sabe construir bem um mundo fantástico que faça sentido me entrega histórias melhores do que as desse cara.