Bia 11/02/2018Arrastado e inacabadoTalvez eu deva começar a crítica avisando que esse é o primeiro trabalho do Martin que eu leio. Peguei esse livro justamente para conhecer a escrita dele em uma história completa em um único volume antes de pensar em mergulhar numa série. Depois da leitura, o objetivo foi parcialmente concluído.
Não posso dizer que A Morte da Luz é um livro mal escrito, as palavras são bem pensadas e existe um claro planejamento por trás da história, além de um grande cuidado com a construção do universo. Mesmo assim, não é um bom livro. Durante a leitura cheguei à conclusão que ele, apesar de bem escrito, era muito mal pensado.
O protagonista da história é Dick, um homem que aparentemente está perdido em sua vida até que recebe um chamado de Gwen, sua ex. Mesmo o relacionamento deles tendo acabado há sete anos, ele atravessa o espaço para encontrá-la em Worlon, planeta errante onde aconteceu um festival uma década antes e agora está basicamente abandonado e cada vez mais próximo de morrer.
Nesse plano de fundo, o livro busca ser um drama romântico e uma aventura de ficção científica, mas não alcança nenhum dos dois. Por mais que todo o cenário tenha sido planejado (com direito até há um glossário no fim do livro), ele nunca brilha ou fica totalmente claro. Na verdade, a primeira parte do livro pode ser resumida em um monte de nomes e conceitos que só os personagens entendem e pouco fazem diferença para o decorrer da história. A maior parte das explicações são superficiais, parece estar esperado do leitor já saber daquilo. É escrito de modo que parece estar sendo mencionado coisas do dia a dia na terra, como se dizer "Ávalon", "Baldur" e todos os nomes que permeiam o livro fosse o mesmo falar "Japão" ou "Estados Unidos". É uma mitologia enorme que tem tanto significado e importância para a história quanto uma folha de uma árvore. Parece trabalho jogado fora.
Na verdade, todo o universo de planetas citados acabou me parecendo mais um universo de países mesmo. Apesar de tudo que é feito para que pareça ter uma grande diversidade, todos se julgam humanos e são humanos. Isso faz com que as grandes diferenças entre os personagens sejam apenas choque cultural de costumes (já que todos também aparentam falar o mesmo idioma) e a diversidade não pareça muito maior do que na própria terra atual. Apenas plantas e animais fogem do terráqueo com espécies novas.
Na questão romântica do livro as coisas ficam ainda precárias. Dirk é o centro da história, tudo é focado nele, mas não há nada de especialmente interessante nele. Após ir para Warlon, basicamente tudo que ele faz é falar de seu suposto amor por Gwen, mas esse sentimento parece ficar mais falso a cada página. Dirk ama seu passado, a pessoa que ele era antes, e acredita que Gwen pode torná-lo aquele homem mais uma vez. Não existe o mínimo entrosamento entre os dois, nada da famosa química, e nenhum motivo que faça o leitor torcer para que tudo dê certo e eles acabem juntos. Mas mesmo assim a maior parte dos acontecimentos da das primeiras duzentas, talvez até mais, é sobre eles, seu passado e possível futuro.
Talvez por causa do mal uso dos temas, o enredo em geral do livro é um problema. A cada página a sinopse da parte de trás da edição brasileira parece mais e mais falsa, mas seria muito spoiler explicar o porque. Posso dizer apenas que a primeira metade do livro é basicamente insignificante e depois dela a história continua se arrastando em um ritmo torturante. Sempre que algo está próximo de acontecer parece que o livro foge desse possível clímax e volta para as infinitas narrações sobre Worlon, que eu acabei chamando de turismo no decorrer da minha leitura, ou para os pensamentos de Dirk.
Quando a pouca ação acontece ela é sim recompensadora, mas não o suficiente para compensar as outras partes. No último terço do livro a história finalmente começa a se mover e momentos de tensão real são construídos, mas a falta de empatia com Dirk me impediu de sentir qualquer coisa.
Positivamente, há diálogos muito interessantes e a questão do "nome" que muitas vezes aparece na narrativa. A cultura de Alto Kavalaan é diferente e interessante, assim como as mudanças que sua sociedade está passando, e também a única parte da criação de mundo que tenta ser mais clara o que faz com que os Jaan, Garse e o laço que eles têm sejam as melhores coisas do livro, mas estão fadados ao papel secundário.
No começo desse texto eu disse que meu objetivo com o livro era conhecer a escrita do Martin por meio de uma história completa e que esse objetivo foi apenas parcialmente concluído. O motivo de não ter sido completo é que essa história não está concluída. Como acontece no livro todo, mais uma vez uma fuga do clímax atrapalha o desenvolvimento e nesse caso a fuga é simplesmente o final do livro.
Existe uma diferença entre um final aberto à interpretações e a falta completa de uma conclusão. Em A Morte da Luz simplesmente não existe desfecho para nada, os únicos personagens que tem um destino são os que morrem. Esse é mais um ponto onde a sinopse no livro mente descaradamente, já que conceitos mencionados nela estão justamente nesse clímax que nunca chega. É como se o livro parasse em um capítulo qualquer e se era para fazer isso podia ter parado muito antes, talvez ainda no extremamente confuso prólogo.