Ana Lima 15/09/2016O leitor do trem das 6h27 é Guylain Vignolles. Solteiro, vive sozinho e tem cerca de 30 anos, todas as manhãs lê fragmentos de diversas obrar em voz alta no trem que o conduz ao trabalho, numa usina destinada a destruir livros encalhados nas estantes e transformá-los em páginas para novos livros.
Parece contraditório que um leitor assíduo trabalhe num local como esse - e é. Mas é justamente de lá que Guylain retira seu estoque de pequenos trechos de livros que serão lidos no trem. A maioria desses fragmentos é retirada justamente do que resta dos livros na chamada Coisa: a máquina responsável por destruir os livros e a qual o personagem opera.
Um dia, numa de suas viagens de trem, Guylain encontra um pendrive no banco em que costuma sentar. Ao chegar em casa e vasculhar os arquivos presentes no dispositivo, ele acaba encontrando diversos documentos que, juntos, formavam uma história escrita aparentemente por uma mulher responsável pelos banheiros de um grande shopping. O que ele não sabia é que esses escritos mudariam muito na sua vida e em sua forma de enxergar o mundo ao seu redor.
O livro é bem curtinho e tem ritmo de conto. Acredito que o ponto principal e que mais me cativou nessa leitura foi a construção dos personagens. O autor não poupa esforços (e nem características) para criar personagens únicos e peculiares! São o tipo de pessoa que não esbarramos por aí em qualquer lugar.
Por exemplo, o porteiro da usina é um senhor fascinado por versos alexandrinos. Além de lê-los a todo momento, muitas vezes ainda os encorporava em seu vocabulário, e os diálogos com o personagens se tornam verdadeiras obras de arte a medida em que são descritos.
Há também um ex-funcionário da usina, que perdeu suas duas pernas ao ser engolido pela Coisa. Esse poderia ser o fim de sua vida... Isso se não encontrasse uma motivação ainda maior para seus dias: perseguir todos os exemplares dos livros originados a partir do papel que era esmagado pela Coisa no momento em que ela o engoliu e que, consequentemente, também continha o resto das suas pernas.
É bizarro, sim. Mas a motivação e o orgulho do personagem ao reencontrar cada livro perdido deixam de lado essa parte macabra.
Amei a experiência de ter lido esse livro, e me imaginei trabalhando num local destinado a destruir aqueles que hoje são considerados meus melhores amigos - os livros. Acredito que toda pessoa apaixonada pela leitura precisa conhecer esse livro e seus personagens peculiares. O livro é curtinho, tem uma arte gráfica maravilhosa e além de tudo vem numa versão pocket exclusiva, pra você carregar por aí e, quem sabe, não se tornar o leitor do transporte público da sua cidade!
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