Laura.Brito 26/12/2021
A língua estrangeira de Peixoto
Como disse Proust, "os mais belos livros são escritos numa espécie de língua estrangeira". Ler Peixoto é descobrir uma nova língua dentro da portuguesa, é descobrir descrições do indescritível.
Morreste-me não trata apenas de morte, mas de viver para viver a morte de alguém. Impossível não emocionar-se e partilhar das dores descritas pelo autor: "procurei-te para lá da memória, nos cantos que só nós conhecemos, e não te vi. Vi apenas, no negro dos cantos antes iluminados, o negro da tua falta, a dor sem fim que só se pode sentir."
Com carinho de criança e profundidade adulta, Peixoto não apenas chora a morte como também presta homenagem ao pai - homenagem a qual compartilhamos para com todos nossos queridos que morreram-nos. É com seriedade e misto de tristeza e esperança que Peixoto norteia-se e norteia-nos em meio ao escuro que nos cabe depois do fechar dos olhos que queríamos olhar mais um pouco.
Morreste-me é um livro curto tal como a vida, para ler e absorver de uma vez só e cujo conteúdo acompanha o leitor para muito além das poucas páginas, para dentro da escuridão. Deste livro, "ficou o teu sorriso no que não esqueço, ficaste todo em mim". Um livro arrebatador.