Danilo Andrade 16/08/2021Primeira frase: "Vivo uma vida repleta de vergonha"Dissipar o torpor que leituras como essa nos causa, leva alguns meses. Costumam se alastrar por entre as sinapses, sístole, diástole, tecidos, células, átomos, e todo vazio que guarda em si a possibilidade de algo existir.
Esse vazio abismal, foi reverberado pelas coincidências que pude estabelecer ao longo da leitura, com o personagem principal, Yozo, como se o mesmo fosse o próprio abismo encarnado me encarando e representando diante de mim alguns dos temores horríveis que assolaram-me até aqui.
Numa narrativa depressiva, melancólica, e conseguinte, niilista, vemos um homem que é terrívelmente interpelado pelos muros instransponíveis, que sua incapacidade castradora de compreender os humanos o confinou. As relações de poder, de sobrevivência, as máscaras necessárias para tocar a vida, o atingem em cheio, e em certa altura, assume a condição de estar abatido sob o solo empoeirado e sujo de seu próprio sangue. A história de Yozo é marcada pelos passos errantes de sua inabilidade em "tomar rumo" na vida, somado ao medo que tem das pessoas, devido à episódios de abuso, e com isso, um forte estigma quanto à confiança que poderia depositar até mesmo em suas relações familiares, causando-lhe uma prostração moral inelutável . Osamu Dazai alça vôos inestimáveis neste livro que me despertou para ler tudo que sua breve vida pôde produzir, mesmo em vertiginosa decadência, mas com uma beleza e sinceridade admirável à cada linha.