Leandro Matos 11/08/2014O LADRÃO DO TEMPO | A SAGA DE UM HOMEM QUE NÃO ENVELHECEMeu primeiro contato com o trabalho do autor irlandês John Boyne, foi com o romance infanto-juvenil O Menino do Pijama Listrado, que utilizando o Holocausto como pano de fundo, relata a improvável amizade entre dois garotos, Bruno e Shmuel. O primeiro é filho de um comandante do alto escalão de Hitler e o segundo um garoto judeu vestindo um pijama listrado.
O Ladrão do Tempo foi publicado originalmente em 2000 e logo nas primeiras páginas já é notório o talento e a fluência da escrita do autor. John Boyne possui vários trabalhos publicados no Brasil, mas é interessante perceber sua habilidade como um grande contador de histórias já nesse seu primeiro romance.
A história é simples e original. Simples, pois o enredo não apresenta grandes subtramas ou reviravoltas, mas segue firme e contínuo entre duas linhas agradáveis narrativas (de presente e passado). O original da história fica por conta da concepção do autor em contar a saga de um homem que não envelhece. Matthieu Zéla (o narrador da história) parou de envelhecer com a aparência de 50 anos e até os anos 2000 linha de tempo que segue como presente durante o livro vai vivendo plenamente os seus 256 anos.
A história é a seguinte. Apenas escute. Existe uma coisa sobre mim que você não sabe e que provavelmente não vai ser fácil entender, mas vou tentar explicar mesmo assim. É o seguinte: eu não morro. Apenas fico mais e mais velho.
A história da vida de Matthieu começa em 1758, quando aos 15 anos e já órfão de pai, decide fugir de Paris com seu meio-irmão Tomas, após ter presenciado a trágica (e banal) morte da mãe. A partir desse ocorrido Matthieu decide tomar a atitude que vai permear toda a sua vida: se manter vivo para poder oferecer algo de bom ao seu irmão. Logo os dois empreendem uma viagem de navio que se destinava a Inglaterra. Durante a viagem Matthieu conhece Dominque Sauvet, uma jovem um pouco mais velha que ele, e que logo o fascina em todos os sentidos. Aportando em terra nova e almejando viver como marido e mulher, além de ter Tomas no papel de filho, não foi nada fácil para Matthieu e os outros dois, manterem essas aparências e posteriormente se estabelecerem como empregados em uma grande fazenda pelo caminho. O que atrasaria um pouco o plano inicial de chegar a Inglaterra, mas ao menos era uma forma honesta e digna de viver, onde se deixava de lado pequenos crimes que Matthieu cometia para ir levando o dia a dia dos 3 pela localidade. Só não tão importante na sua jornada quanto seu meio-irmão Tomas, que após a morte deste, Matthieu assume seguir com o compromisso de cuidar da sua linhagem, era Dominique. Essa relação ia marcar toda a sua vida como um amor conturbado e incompleto, onde uma única noite de amor, bastasse para guardar um sentimento por anos.
Ouvir muitas vezes a afirmação de que é impossível se esquecer do primeiro amor; o ineditismo das emoções seria, por si só, o suficiente para assegurar uma lembrança duradoura em qualquer coração pulsante.
Na linha narrativa que se segue entre o século XIX e o que se entende como presente, John Boyne foi mais meticuloso aos inserir pessoas e acontecimentos históricos entrelaçados na vida de Matthieu. É onde (particularmente creio eu) que a narrativa flui melhor. O autor mostra um personagem maduro, que segue vivendo o seu tempo à sua época, porém sempre honrando o compromisso iniciado com Tomas. Com mais de dois séculos de vida ele esteve presente direta e indiretamente em fatos importantes da História mundial. Guerras, a Revolução Francesa, a criação das Olimpíadas, o Crash de 29 e muitos outros que por vezes, foram apenas brevemente mencionados. Amigos e mulheres não faltariam na vida de uma pessoa que não morre, afinal. Durante a leitura vale um destaque para a esposa que conseguiu matá-lo e para o contexto no qual é inserido o cineasta e ator Charles Chaplin.
Aproveite tudo o que sua época oferece, estou lhe dizendo. Essa é a essência da vida.
O Ladrão do Tempo apresenta uma excelente história sobre a vida, sobre sobrevivência e acima de tudo, sobre a vontade viver. Apesar de ter vivido por tantos anos, o personagem ainda se permite errar, sorrir, sofrer e se alegrar. A cada novo amigo, ele se permite acreditar. A cada trabalho, ele persevera. A cada amor, ele se entrega. Afinal isso é viver. É permitir que cada momento, cada pessoa tenha seu devido valor na nossa história, no nosso tempo.
site:
http://nerdpride.com.br/literatura/o-ladrao-do-tempo-a-saga-de-um-homem-que-nao-envelhece/