Gabriel 21/12/2016
Alterando as percepções.
Terceiro volume de A Roda do Tempo, embora seja um dos menores livros da série, O Dragão Renascido ainda assim é capaz de deixar alguns leitores temerosos com o que podem ser assustadoras 656 páginas. Todavia, mesmo curto se comparado aos demais, essa nova parte da obra criada por Robert Jordan ainda assim oferece, a meu ver, um conteúdo de qualidade equiparável aos seus dois predecessores, conclusão perceptível desde o eficiente prólogo que expõe a turbulência que os acontecimentos estão tomando. Porém, o terceiro capítulo da jornada dos Ta’veren apresenta um dilema um tanto quanto interessante: ao mesmo tempo que é diferente dos dois primeiros livros, O Dragão Renascido também é mais do mesmo. Não falo dessa última característica, no entanto, como um ponto negativo. Vamos entender direito esses aspectos a princípio dissonantes.
Vejo que nessa parte da saga, Jordan busca mais aprofundar o que já foi apresentado ao seu universo criado do que acrescentar novos elementos, dessemelhante ao volume antecessor, A Grande Caçada, que expõe novos povos como os Seanchan, introduz o aspecto político da série, e aborda os conflitos de Tar-Valon. Assim, as Ajahs e suas dissidências, já faladas em outras ocasiões, recebem um maior trato do autor aqui, criando um senso de insegurança entre os protagonistas; os Aiels, que vinham aparecendo vagamente antes, destacam-se mais, preparando o caminho para o próximo volume, que promete uma grande abordagem desse povo; e o conflito do Rand com o seu destino chega em seu ápice, com o personagem surpreendendo seus amigos em suas ações. Dessa forma, O Dragão Renascido enriquece a saga de uma maneira diferente, desenvolvendo aquilo que o leitor já sabe, amarrando as pontas soltas, sem se tornar, em minha opinião, enfadonho.
Ao mesmo modo, Robert toma aqui uma atitude ousada: o nosso principal protagonista, Rand al’Thor, é simplesmente escanteado nesse volume. Há poucas passagens com o personagem nessa parte da história, o leitor mal chega a desfrutá-lo, seus trechos são tão curtos que cheguei a achar que a sua maior participação em O Dragão Renascido certamente seria no título do livro. Ganham mais atenção aqui Egwene, Nynaeve e principalmente Mat e Perrin, cujos conflitos e personalidades são mais abordados. No entanto, não pense que a grande trama desse capítulo não envolva o Dragão. Pelo contrário, Rand está no cerne da história e de quase todas as motivações dos outros personagens. Mas, diferente dos volumes predecessores, em O Dragão Renascido o seu arco não é visto sob o ponto de vista dele, mas através da percepção de seus colegas. Assim, Jordan não só desenvolve aqueles que não receberam atenção antes, consertando o que alguns considerariam um problema da série até então, como também não foge do plot principal, a história de Rand, fazendo isso de maneira primorosa, na minha opinião.
Mas, se os protagonistas aqui crescem ainda mais, não me vejo no direito de dizer o mesmo aos antagonistas da série, e, portanto, abro aqui um espaço para uma reclamação da série. Tenho sentido a falta de um outro vilão de peso, além do Tenebroso, dos Filhos da Luz e da misteriosa Lanfear. Vejo que não parece muito ser o foco do autor abordar as motivações de personagens que fazem frente aos heróis da série, como os Abandonados, e mesmo tratando em um trecho ou outro, acho ainda muito pouco. E até quando bem desenvolvido, a sensação que tenho é que somente no próximo livro haverá um confronto de ideias. Já é a segunda vez que se tem no final um embate entre o herói e um vilão que se conhece tão pouco que é criada uma falsa impressão de que esse foi colocado ali apenas para finalizar a trama.
Então, embora não considere esse o melhor dos três primeiros volumes de A Roda do Tempo, ainda que tenha encontrado mais trechos maçantes do que antes e ache que Robert se alongue consideravelmente em certas passagens, analiso O Dragão Renascido como mais um ótimo livro de Fantasia do autor, com um final que consegue instigar o ledor a partir para o quarto volume da saga o quão rápido puder, mesmo que esse não seja tão turbulento, no bom sentido, quando o de A Grande Caçada. Para mim, Jordan consegue deixar aqui os elementos singulares da história ainda mais épicos, deixando claro a emergência da situação, fazendo com que eu concorde ainda mais que essa é uma grande saga.