O filho eterno

O filho eterno Cristovão Tezza




Resenhas - O Filho Eterno


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Felipe 22/10/2009

“O filho eterno” de Cristovão Tezza. Record (2009), 224 páginas.
Se fosse preciso dar apenas um adjetivo ao livro de Tezza, minha opção seria por corajoso. O enredo se passa em torno da vida de Tezza a partir do momento em que foi pai pela primeira vez, Felipe é portador de síndrome de down. A partir da relação entre Tezza com o filho e com toda a sua vida desde seu nascimento é que a trama se desenrola.
A coragem do livro se refere a que o autor não tem pudor de expor aos leitores os seus sentimentos em relação ao filho portador de down. Incluindo o alento que uma suporta expectativa de uma vida curta de Felipe lhe deu logo depois de seu nascimento, e da decisão quase duas décadas depois de parar de fumar para poder viver mais e assim cuidar do filho por mais tempo (o que ele julga que ninguém pode fazer melhor que ele).
Entre seus a narrativa em torno de seu filho, tendo como coadjuvante quando ausente a filha de Tezza que nasceu pouco depois de Felipe e sem síndrome de down, Tezza traz fatos de sua vida antes da paternidade que fazem o leitor entender melhor o autor. Entre eles: a experiência com drogas, os conflitos com a polícia, os furtos, a vida como ilegal na Alemanha, a vida de ator de teatro amador, os primeiro amor, a frustração de ter seus livros rejeitos por editoras e a busca por um emprego estável como professor.
Um detalhe que pode parecer despercebido por alguns leitores é uma alusão a ministra Dilma Rusself quando Tezza conta como foi à resistência ao regime militar no Brasil da década de 1970. Outro detalhe que chama atenção é que esta auto-biografia de Tezza é narrada em terceira pessoa, que é uma opção que chama atenção em “O filho eterno”.
Sem dúvida trata-se de um livro comovente, onde o amor de pai supera todos os preconceitos em relação a uma criança com síndrome de down. Particularmente, considera “O filho eterno” uma das duas melhores auto-biografias que já li; junto com “Feliz ano velho” de Marcelo Rubens Paiva.
A única frustração, inerente a toda auto-biografia, é que o livro conta uma história incompleta, com início, meio, mas sem final. A narrativa de Tezza termina em 2006, e o leitor fica com curiosidade digna de novela da Globo: Será que Felipe continua pintando? Será que ele ama ainda o Atlético Paranaense? Será que ganhou um iPod do pai de mesmo modo que ganhou computador antes? Será que Tezza voltou a fumar?
Para quem pretende ler um livro corajoso, emocionante e que expõe a maneira como o amor paterno pode superar todos os obstáculos, “O filhos eterno” é altamente recomendável.
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Luhhh ^___^ 26/03/2010minha estante
Adorei o teu texto!

Gostei de como terminou o livro =)

realmente dá curiosidade de saber como o Felipe está, Tezza consegue cativar os leitores ^^




lfcardoso 25/02/2010

Um relato corajoso e original
No romance o autor fala sobre a experiência de ter um filho com síndrome de Down. Apesar de autobiográfica, a história é narrada na terceira pessoa. O narrador e o pai da criança doente não são a mesma pessoa. O primeiro não participa da narrativa, apenas mostra o que os personagens pensam e sentem. O segundo é um dos personagens principais da obra.

O livro não é um amontoado de discursos misericordiosos e politicamente corretos sobre a síndrome de Down. Tezza optou por uma abordagem original e corajosa, cruel em alguns momentos. No início, o pai sentia-se injustiçado pela natureza e desejava que o filho morresse de alguma complicação da doença, como problemas e coração.

"Numa das crises, ela [a mãe da criança] lhe diz, no desespero do choro alto: Eu acabei com a tua vida. E ele não respodeu, como se concordasse – a mão que estendeu aos cabelos dela consolava o sofrimento, não a verdade dos fatos."

Filipe, o “filho eterno”, nasceu no começo da década de 1980. Naquela época, a síndrome de Down não era tão estudada e tinha uma aura de mistério.

"Não há mongolóides na história, relato nenhum – são seres ausentes. Leia os diálogos de Platão, as narrativas medievais, Dom Quixote, avance para a Comédia humana de Balzac, chegue a Dostoiévski, nem este comenta, sempre atento aos humilhados e ofendidos; os mongolóides não existem. (…) Eles só surgiram no século XX, tardiamente. Em todo o Ulisses, James Joyce não fez Leopold Bloom esbarrar em nenhuma criança Down, ao longo daquelas 24 horas absolutas. Thomas Mann os ignora rotundamente. O cinema, em seus 80 anos, (…) jamais os colocou em cena. Nem vai colocá-los. Os mongolóides são seres hospitares, vivem na ante-sala dos médicos."

As visitas a clínicas e consultórios médicos, a leitura de livros sobre o mongolismo e os programas de exercícios para o filho fazem o pai revisitar o passado (a vida em comunidade na adolescência, a vida de imigrante ilegal na Alemanha, a breve carreira de relojoeiro, o fato de ser um escritor com livros de gaveta e a desejada estabilidade financeira com o cargo de professor universitário). Isso faz com que ele reflita sobre o que passou e reorganize a própria vida.

Com pequenas conquistas, como os primeiros passos e a ida à escola, Filipe vai conquistando o seu lugar de filho. O pai já não o vê mais como uma espécie de maldição, mas como alguém que precisa de carinho e cuidado. Ao falar sobre o crescimento e desenvolvimento do primogênito, o autor apresenta algumas informações sobre a síndrome de Down e mostra que, apesar de serem lentos e demorados, os avanços de Filipe são gratificantes. A paixão pelo futebol é um dos elementos cotidianos que ajuda a unir pai e filho.

Sem recorrer a fórmulas sentimentaloides e apelativas nem a discursos prontos, e com uma prosa intensa, Cristovão Tezza aborda de forma original e corajosa o velho tema da relação entre pais e filhos. Sem sobra de dúvidas, é o melhor romance publicado em 2008. Os diversos prêmios ganhos pela obra, entre os quais estão o Jabuti e o Portugal Telecom, comprovam isso.

Mais resenhas em http://www.literatsi.com/category/resenha/
Luhhh ^___^ 26/03/2010minha estante
Belo comentário, realmente, o Tezza ñ faz uma apelação pq tem q criar um filho com Síndrome de Down.

E o final do livro é tão lindo *-*


Ricardo Rocha 03/09/2016minha estante
desculpe mas premios não comprovam coisa alguma




Ferreirinha 24/05/2017

Senti que faltava algo
O início do livro tem uma dinâmica bem interessante. A narrativa é forte, coloca muito o sentimento do autor diante da situação de ter um filho especial. Depois me senti meio deslocada da história. Os problemas não se aprofundaram, a mãe some da história e ela gira em torno basicamente de pai e filho. Obviamente que por não ser ficção não se pode esperar um "fim impactante" mas não sei também se gostei como ele aconteceu.
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Day 16/04/2021

Mudei minha visão de filho após esse livro
Eu não quero ser mãe, não tenho vontade, nunca tive. Sempre pensei que mudaria com a idade e não mudou. Mas acho crianças e as relações de pais e filhos, emocionantes, envolventes, cativantes. Quando eu li esse livro, eu me imaginei tendo um filho especial, e os desdobramentos dessa criança que nunca deixará de ser criança, nunca voará do ninho (dependendo da sua característica), e que nunca deixaria de ser mãe de uma criança. Não estou dizendo que é assim, pq nunca tive essa experiência! Mas o que livro nos traz é essa reflexão, é um outro quesito de aprofundamento de relação. Muito forte, mesmo! Comecei a ver esses pais com outros olhos! Olhos de admiração, de empatia, olhos de quem encarou um desafio, não para os outros, mas para si mesmo! Certa vez fui visitar um templo budista em Maringá/PR. Anexo a este templo tinha uma casa de repouso para idosos. Nesta casa de repouso, um dos administradores nos contou que tinha um pai bem velhinho, e seu filho, velho tbem, mas especial. O pai estava muito doente, mas não morria, pq segundo o administrador, não se permitia morrer e deixar o filho especial sozinho. Não é a mesma história do livro, mas o que senti foi muito parecido. Espero que vcs gostem tanto quanto eu.
Renato 08/07/2021minha estante
Tem um momento do livro em que o personagem diz que não pode morrer, se não o filho ficaria desolado em um mundo que o tornaria ínvisivel.


Day 01/08/2021minha estante
É verdade! Essa invisibilidade deve ser muito dificil para os pais.




Gaby 26/02/2022

Vou sentir falta do Felipe
Eu li o livro pq minha faculdade conseguiu que autor ingressasse numa reuniao via google meet pra responder as perguntas dos alunos do curso de letras. Foi uma experiência incrível, é maravilhoso conhecer um escritor. Tal oportunidade me impeliu pra ler o livro. Enfim, é um livro super interessante, nunca havia lido nenhum livro sobre síndrome de Down. Esse livro me ensinou muito coisa sobre a vida e sobre a síndrome de Down. É um livro complexo até msm pra mim q sou leitora, esse é o único defeito. Mas no resto o livro esta impecável. Acho que vou sentir falta do Felipe ❤
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KatiaMaba 16/04/2009

O Desabafo.
Em minha opinião trata-se de um trabalho de verdadeiro desabafo do autor. Determinadas afirmações do autor levam o leitor a se perguntar "que espécie de pai é este", mas, no decorrer da leitura se não justificar certamente será possível conhecer seus motivos.

Para o leitor que já teve a oportunidade de constituir a sua família com filhos legítimos ou via adoção, por conhecimento de causa, certamente vai reviver ou experimentar alguns sentimentos e conflitos de um pai que esperava muito mais do que um filho pode proporcionar.
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Ricardo Rocha 06/09/2016

O livro é bom, mas não há como ignorar os gritos exaltados da contracapa e da orelha. É constrangedor. Vou pegar um outro livro “qualquer” na estante. Vejamos. As ondas, de Virgínia Woolf. Na capa, o nome dela, do tradutor, O título e o autor do prefácio. Na primeira orelha, um trecho (maravilhoso, por sinal, “O sol, alto, não mais encostado no colchão verde...”). Na outra capa, a importância de Virgínia para a literatura, baseada na superação dos limites da ficção naturalista. Breve notícia biográfica. Conhecida por suas posições feministas. Na contracapa, uma singela árvore. Tudo bem, outro. No caminho de Swann. Na capa, o nome da coleção, do autor, o título, o tradutor. A coleção. Na contracapa, uma palavra sobre o duplo e o realismo psicológico, as técnicas que Proust utiliza, a luta do espírito criador para deixar sua marca no tempo (bacana isso). Ah, mas que prêmios eles ganharam? Ok. Proust ganhou o Goncourt de 1919. A referência está na contracapa das |Moças em flor, entre parênteses, como informação final, acessória. O resto é igual ao anterior, difere ao especificar o lirismo desse volume em particular, o que significa na obra, como esboça o tema dos volumes futuros. Um terceiro. Um Nobel. Neruda. Canto geral. O nome dele. O título. Um passarinho. O nome da editora. Contracapa: Uma citação de um livro do autor em que diz que “naquela época escrevi meu livro mais importante”. Abaixo, contextualiza, fala do amor de Neruda pelo Chile e seu povo. Diz que Canto é uma história marginal da América Latina. Outro Nobel: O engate, Nadine Gordimer. Capa título nome dela editora (inclui a coleção “Premio Nobel”. Orelha, sobre o que é o livro, uma história de amor, choque cultural, o estilo do monólogo interior de onde a história nasce quando os personagens se cruzam. Na segunda orelha, uma foto da autora, outros livros dela, e no final, informa que ela ganhou, “além de inúmeras distinções, o Booker Prize” e que em 1991 “foi agraciada com o prêmio Nobel. A contracapa é um resumo das orelhas. Os prêmios estão juntos com a sinopse e a questão estilística. Começa e termina com a história. A capa de “O filho eterno é bonita”, chama a atenção, a sombra do menino. A primeira orelha faz uma meio que sinopse, preparando o coração do leitor para um “livro corajoso” de um dos “maiores escritores brasileiros”. O máximo que fala sobre o estilo do autor é “precisão literária”, quem em termos de precisão é bem vago. A segunda orelha não traz a biografia do autor mas do seu sucesso. De passagem diz onde nasceu para emendar que escreveu dezenas de livros, ganhou um monte de prêmios (especifica cada um). Que ele foi finalista de um premio em lingua inglesa. O site do autor. A contracapa, onde a gente vai procurar informações sobre a obra, tem a fotona do autor, um trecho de três linhas do livro. Um pouco menos da metade do espaço. Na metade abaixo, não apenas cita, mas especifica, não num texto corrido mas em separado, uma linha para cada prêmio, todos os prêmios. Para a maioria não faz diferença, possivelmente. Eu quase deixei de ler por conta de tanta exaltação mas não só, pela falta de informação, nesse primeiro contato que se tem com o objeto livro, sobre o estilo do autor e até mesmo sobre a pessoa, uma biografia decente. Não tivesse sido um presente, eu teria deixado de ler esse bom livro. Mas é bem constrangedor. Cristóvão Tezza e seu romance são maiores do que os prêmios que recebeu.
Ricardo Rocha 06/09/2016minha estante
sobre o livro fiquei sem ter o que dizer depois de tanta exaltação da editora




beatriz 16/04/2016

Eu estava com muita expectativa para o livro, achei que ele teria um enfoque maior na história do pai com o filho. A escrita do Tezza é incrível porém quando a história fugia do filho para falar sobre o passado do pai a leitura ficava massante, houveram poucas partes que demonstravam o amadurecimento do pai em relação ao filho. No geral o livro é mediano, não me prendeu muito durante a leitura.
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Cardoso 23/09/2015

Uma atordoante, aflitiva e impactante análise da maturidade, da paternidade e da vida, "O filho eterno" é uma das mais gratas surpresas que eu já tive; de uma narrativa pós-moderna e ágil, ainda que profundamente ligada ao campo dos pensamentos e das memórias, que impedem e prendem o amadurecimento de um pai de primeira viagem que se vê progenitor de um garoto com síndrome de down.

Acima do politicamente correto, a personagem de Tezza tenta superar seus preconceitos, entender-se tardiamente no mundo e em si próprio de maneira desesperada; envolvente, intimista, furioso e profundo em sua auto-consciência de intelectual rasteiro. Clausuras psicológicas, claustrofobias identitárias são comuns em seu universo particular de indecisão e incerteza.
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Adilson 12/09/2015

Livro muito bom
Conta a visão de um pai durante o processo de educação de seu filho com síndrome de Down, misturando com algumas passagens de sua vida quando solteiro.
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Jéssica Bruna 10/01/2015

A história de um pai que cria diversas expectativas à cerca do filho que está prestes a nascer. Espera-se um filho saudável, mas se depara com um portador de Síndrome de Down. Diante disso, chega a desejar a morte e sentir vergonha do próprio filho, e culpa-se por tal sentimento. Um pai que vivencia o desespero de não saber o que fazer com o recém-nascido e, sobretudo, não saber o que fazer com a própria vida. A narrativa leva o leitor a se colocar no lugar do pai e a pensar sobre a questão do que é ser "normal" diante de um padrão imposto pela sociedade, além de refletir sobre o preconceito. É notório que o pai não sente-se envergonhado por mera crueldade, mas por pura frustração. Uma frustração que ele carrega pela carreira de escritor que não caminha bem, e pelos vários livros guardados em sua gaveta que não puderam ser lançados por nenhuma editora. Ele vive uma conturbação com seu próprio eu, e se esconde por trás da fragilidade do filho por medo de saber que são tão parecidos. Com o avanço dos dias e o crescimento da criança, esse relacionamento vai tomando outra forma e cria-se um laço afetivo muito forte. O menino, Felipe, mostra-se teimoso e pouco sociável e o pai enxerga nele a sua própria solidão. Com as dificuldades que o filho encontra no dia-a-dia em atividades simples, o pai vê a sua ânsia perante o mundo. É um livro sensível que mostra uma jornada de transformação para ambos, e que transborda emoção!
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Leonardo 09/07/2012

Muitas razões para ler, todas elas válidas
Disponível em http://catalisecritica.wordpress.com/

Desde que li O Fantasma da Infância eu aguardava ansiosamente a oportunidade de ler outra obra de Cristovão Tezza, respeitadíssimo escritor brasileiro. Seu livro mais premiado é O filho eterno, em que ele relata sua experiência de ter um filho portador de Síndrome de Down. Finalmente pus as mãos nele e é possível compreender o porquê de tantos prêmios. Cristovão Tezza entrega ao leitor sua alma. Impossível ler O filho eterno e não se lembrar das Confissões de Santo Agostinho, preservando, naturalmente, cada um em seu devido lugar.

Tezza não é o primeiro pai de uma criança com Down, qualquer um sabe disso. Muito certamente não foi ele o pai que passou por mais momentos difíceis ou que viveu mais aventuras. O que ele narra não entra no campo dos fatos extraordinários. Há duas diferenças, contudo, na sua experiência de pai, que tornam a leitura desse livro tão pungente: primeiro, Tezza é um grande escritor, e segundo, a honestidade de seu relato é desconcertante.


O livro é narrado numa terceira pessoa disfarçada, aquilo que se costuma chamar de discurso indireto livre: o autor descreve as ações dos personagens, sempre do ponto de vista do personagem principal, mas também se imiscui em suas emoções e pensamentos. E o personagem principal é um homem sem nome: um escritor que de envergonha por muito tempo de preencher fichas e colocar “escritor” como ocupação; que escreveu poesias que julga péssimas; que se sente transparente demais; que é tímido; que se sente culpado por não saber como lidar com seu filho com Síndrome de Down.

“A porta se abre e uma jovem médica residente, gentil, os recebe com um sorriso – olha com um carinho maternal para a criança, que dorme suave no colo da mãe. É preciso preencher alguns papéis, ela diz, em tom amigável. Ele se sente um animal chucro, puxando o pescoço para se livrar do freio na boca, aquela prisão incômoda que o arrasta para trás: responder a perguntas idiotas diante de uma mesa, há sempre uma invasão de intimidade – o que você faz, do que você vive, quem você pensa que é -, e aquela irritante compreensão humanista dos que têm poder mas o usam com moderação. Aceite a regra do jogo, é o que eles dizem.”

Sem autoindulgência, Tezza rasga seu coração com confissões tocantes. Não, ele não quer levar ninguém às lágrimas, nem vender mais livros ao incluir declarações polêmicas. A impressão que tive é de que O Filho Eterno é o mea culpa de um pai que ama muito seu filho, mesmo que ao longo de todo o livro não tenha precisado escrever isso uma única vez.

O pensamento que lhe veio quando soube da condição de seu filho pareceria cruel se não fosse tão verdadeiro e humano. As falhas do pai-escritor são relatadas lado a lado com sua luta diária, vivendo sempre o presente, nem passado, nem futuro, enxergando dez metros à frente.

Enquanto narra esses fatos, Tezza mostra que o livro também é sobre ele ao relembrar fatos de sua vida, desde suas experiências de trabalho e roubo na Alemanha, suas aventuras de hippie, sucessivas rejeições de seus originais, as cervejas com os amigos, o primeiro livro publicado.

Escrito num ritmo irresistível, o livro acompanha os vinte anos de seu filho sem que você perceba como o tempo vai passando. É quase impossível parar de ler.

Abaixo uma passagem em que Tezza, crítico e autocrítico, analisa o futebol, uma das paixões de seu filho eterno:

“Nesse universo repetitivo, o futebol foi lentamente se transformando num estímulo poderoso. O futebol, esse nada que preenche o mundo, o pai imagina, logo o fotebol, uma instituição de importância quase superior à da ONU e que ao mesmo tempo congrega em sua cartolagem universal algumas das figuras mais corruptas e vorazes do mundo inteiro, um esporte que onde quer que se estabeleça é sinônimo de falcatrua, transformado num negócio gigantesco e tentacular, criador de mitos de areia, a mais poderosa máquina de rodar dinheiro e ocupar tempo jamais inventada, a derrota final das inquietações do dasein de Heidegger, o triunfo definitivo das massas, o maior circo de todos os tempos, vastas emoções sobre coisa alguma – o pai vai se irritando sempre que pensa, escravizado também ele àquela dança defeituosa que jamais completa mais de cinco lances seguidos sem um erro, um esporte que sequer tem arbitragem minimamente honesta até mesmo por impossibilidade do olhar dos juízes de dar conta do que acontece (em todos os jogos do mundo acontecem falhas grotescas), e no entanto urramos em torno dele, a alma virada do avesso – pois o futebol, essa irresistível coisa nenhuma, passou lentamente a ser para o Felipe uma referência de sua maturidade possível.”

O poder de observação de Tezza acrescenta ao livro, como demonstrado no trecho acima, um sabor próprio. Pensando nas limitações do seu filho, por exemplo, ele diz que o menino jamais seria capaz de formular uma frase na voz passiva. Pequenas informações como essa que dão vida a uma história, que dão também valor literário à narrativa.

É possível apontar diversas motivações para ler O Filho Eterno: qualquer uma delas faz a leitura valer a pena.

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Inácio 23/02/2012

O filho eterno, segundo o Caótico
publicado originalmente no blog Caótico: www.caotico.com.br


Afundei na rede sob o peso de uma bigorna imaginária. E ainda estava na página 27 do livro. Mais uma página, mais outra e outra, agora mais devagar para não me distrair, para não deixar escapar uma vírgula sequer.

A respiração sempre pesada. A custo, avancei até o final do capítulo. Mais adiante não consegui ir. Pelo menos não naquela noite.
Abandonei o livro e a rede com a falta de ar de quem acaba de levar um soco no pé da barriga, na boca do estômago. Só retomei a leitura no dia seguinte e não a larguei mais.

Há tempos um livro não entra nas minhas veias e não sai dos meus pensamentos como O filho eterno, de Cristovão Tezza. Em poucas páginas, soube que estava lendo um romance fundamental, um clássico publicado há menos de cinco anos.

Do autor já tinha ouvido falar dos seus prêmios, do seu nome sempre presente na programação de tudo quanto é evento literário. De tanto folheá-lo em livrarias de aeroportos, acabei mergulhando de cabeça exatamente no seu livro mais premiado. Voltei à tona com a sensação de que há justiça nessas premiações.

Como é possível constatar nas dezenas de resenhas, críticas e sinopses que é possível encontrar na internet, Tezza converteu em literatura sua experiência pessoal a partir do nascimento do seu filho com síndrome de Down.

O romance é narrado em terceira pessoa, recurso técnico que permitiu ao autor manter o narrador distante de sentimentalismos. Ao longo do relato, o leitor acompanha o amadurecimento do pai autor/personagem e da sua relação com o menino. Essas informações também se repetem nos sites que encontrei. Mas, cá entre nós, tudo isso não diz muito de um livro que me deixou do jeito que deixou.

No pai ansioso, prestes a descobrir que papel deveria desempenhar como pai e como marido da mulher que acabou de parir, me vi há exatos 18 anos, quando Pedro nasceu, às 9h de um 18 de dezembro.
No sujeito que sente-se sempre deslocado, claustrofóbico num trabalho e numa vida que não é a sua, me vi nos últimos 10 anos, enclausurado em reuniões e mais reuniões que jamais me interessaram, apesar do meu fingimento.

Nos trechos em que o pai se percebe como um espelho do filho, um homem inseguro, incompleto em tudo que faz, com dificuldades em mudar de direção, de abstrair e fazer as coisas de outro modo, cheguei a anotar ao lado, de lápis: “Esse cara tá dentro da minha cabeça”.
Rabisco semelhante ao que, agora, existe em meu exemplar nos trechos em que o narrador descreve como se refugiava da própria insegurança no humor ou no discreto sentimento de superioridade de quem leu um bocado de coisas.

A opção de não escrever em primeira pessoa permitiu a Tezza que se expusesse ao extremo, com uma coragem sem igual. Sua linguagem é crua, sem qualquer resquício de autopiedade, pieguice nem culpa. Ele revirou as vísceras de sua dor e as expôs como literatura.

Antes da publicação, ele temia que seu livro fosse encarado como uma autoajuda para filhos de pais especiais (clicando aqui você assiste a um vídeo em que ele revela isso). É preciso muita má-vontade para reduzi-lo a apenas isso.

Felizmente os críticos literários e as comissões julgadoras também foram atingidas na boca do estômago, como prova 0 artigo de Marcelo Coelho, na Folha de S. Paulo que encontrei em minhas chafurdações.
Ao “dar nome às coisas” com pontaria certeira, Cristovão Tezza proporciona aos seus leitores a possibilidade de se reconhecer e crescer junto com seu pai-personagem. Foi assim que saí da leitura, sentimento que, em anos recentes, lembro de ter me tomado ao ler Crime e Castigo na tradução de Paulo Bezerra e, depois, A trégua, de Benedetti.
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