gleicepcouto 26/01/2013http://murmuriospessoais.com/?p=5838
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O Lado Bom da Vida (Intrínseca), é o primeiro livro do norte-americano Matthew Quick. O autor se formou em Literatura inglesa e lecionava inglês, mas abandonou seu emprego para escrever. E já começou bem, pois o livro foi adaptado para o cinema, estrelado Bradley Cooper e Jennifer Lawrence, com Robert De Niro e Chris Tucker. Quick foi finalista do prêmio PEN/Hemingway Award de 2009 e seu trabalho tem sido traduzido em várias línguas. Em 2012, seu romance YA, Boy 21, recebeu uma boa crítica do The New York Times. Também é autor do livro Sorta Like a Rockstar (2010).
Pat Peoples acabou de sair de uma clínica psiquiátrica, e nem se lembra por qual motivo foi para lá. O ex-professor de história só quer saber de sua esposa, Nikki, que não vê desde que entrou no “lugar ruim”. Esse “tempo separado” de sua amada só serve para deixá-lo mais ansioso para o reencontro. Há coisas mais urgentes na vida de Pat a serem tratadas, porém, e ele nem faz ideia disso. O seu lapso de memória ofusca um pouco o seu passado e, se não resolvido, pode idealizar um futuro impossível.
Ele precisa juntar as peças do quebra cabeça para poder lidar com o pai, que mal fala com ele; com a mãe carinhosa, mas que sempre está chorando; com o irmão e com os (poucos) amigos, que se recusam a falar do tempo pré-internação. Ah, sim. Ainda tem que sobrar tempo para seus exercícios físicos, claro – Pat é viciado neles. Para ajudá-lo nessa missão de (re)descobertas, ele vai contar com a ajuda de seu psiquiatra e da irmã de seu melhor amigo. Ao tentar, a todo custo, reencontrar sua esposa e ser feliz com ela, Pat vai perceber que, mesmo que nem tudo saia como planejado, há sempre um lado bom da vida.
Um dos melhores livros de estreia que já li. Quick fez bem em parar com esse negócio de lecionar para se dedicar à ficção. De cara, conseguiu desenvolver um livro original, bem escrito e, o principal, sensível.
O Lado Bom da Vida é narrado em primeira pessoa por um personagem diferente. Pat é tudo aquilo que não conseguimos ser mais na sociedade moderna: otimistas e ingênuos. Talvez, por isso, seja um personagem tão fácil de se gostar e torcer por.
O diferente que disse no parágrafo anterior não tem relação com o fato de ser psicologicamente instável. Na verdade, essa é uma das questões pertinentes que o livro aborda subjetivamente: o que é ser diferente? É ter alguma patologia psiquiátrica? É acreditar que tudo vai dar certo? É crer nas pessoas? De maneira ágil, mas com uma linguagem simples (quase infantil), Quick, vai, aos poucos, respondendo a essas perguntas e outras mais.
Como, por exemplo, o fato de Pat ter se viciado em praticar exercícios físicos. A questão pode ser vista por diversos ângulos. Como o culto à aparência física, uma vez que ele pensa que, quando a esposa o ver sarado, vai querer voltar para ele. Ou então como os exercícios servirem como uma válvula de escape, uma fuga de uma realidade que ele, no fundo, percebe que não é tão otimista como ele quer que seja. A mesma fuga pode ser percebida no fato de Pat não se lembrar porque foi parar no “lugar ruim”, nem porque existe o “tempo separados” com Nikki.
Como se pode perceber, as referências são diversas e, em cada uma delas, o autor não pede o foco. Por detrás, há sempre uma palavra de esperança e de superação de limites. Quick criou um herói não herói Melhor dizendo, criou um herói bravo, mas falho – como eu, como você – e, elevou à categoria de feitos importantes as batalhas cotidianas – que eu e você enfrentamos também.
Assim, todos nós estamos sujeitos às situações abordadas pelo autor ao longo da obra – principalmente, o drama familiar (que o autor descreve muito bem e, o mais legal, consegue traçar um ponto de congruência na família: o esporte). Dessa forma, mais uma vez, o leitor se sente transportado para a trama. Até porque a carga emotiva é bem dosada. Quick trata de assuntos sensíveis, sem soar piegas. Poucos conseguem isso. Basta uma palavra ou expressão no lugar errado, que tudo pode acabar virando uma novela mexicana. Até o romance no livro é sensato e sem firulas. Ok, é previsível, mas, ao menos, é bem desenvolvido.
A única coisa que me incomodou um pouco no livro é ele parecer tão milimetricamente escrito para emocionar. Você vê na trama as fórmulas de sucesso que percebemos em outros livros, e isso me soou um pouco artificial. Quase o vi pensando: vou usar um pouco disso, mais uma pitada disso e mais uma colherada daquilo e voilá! Senti falta de ser pega de surpresa, de alguma reviravolta que não imaginava acontecer no livro.
Mas O Lado Bom da Vida cumpre seu papel direitinho. É bem escrito e tem uma mensagem bacana, que te faz refletir. No mercado editorial atual, temos que dar graças a Deus por qualquer livro nesse nível.