Adriana F. 30/08/2010
Ratos por todos os lados
A História, todos já conhecemos. Quantos livros e filmes já foram feitos sobre o Holocausto? Quantos documentários sobre a Segunda Guerra Mundial já foram vistos, discutidos, aclamados? De fato, o tema não é novidade.
Mas de todas as releituras que já tive a oportunidade de conhecer, nenhuma é tão intensa, tão profunda, tão triste e tão dolorosa quanto Maus. Ler o relato de um filho sobre a vida miseravelmente sofrida de seu pai e ainda assim não usar eufemismos para esconder seus defeitos foi de uma sensibilidade extraordinária, a despeito de, a princípio, parecer frieza. Impossível ler sem chorar, mesmo que sem derramar lágrimas.
Vladek é um judeu polonês com um talento formidável para os negócios. Graças a essa característica (que muitos consideram inerente aos judeus), sua passagem pelos campos de concentração foi menos torturante que de muitos. A fome que passou foi levemente mais amena. As surras que levou foram levemente menos brutais. E suas esperança e determinação de sair vivo de Auschwitz eram absurdamente maiores que de qualquer outro.
Além de cuidar de si mesmo tentando sobreviver dia após dia, Vladek tentava cuidar da sobrevivência de sua esposa Anja, também presa nos campos. E também cuidava de outros parentes, amigos ou apenas conhecidos menos fortes, adoentados, desafortunados, desamparados. Caridade? Talvez. Oportunidade de fazer negócios num futuro ainda que sombrio? Certamente.
Art Spiegelman narra como seu pai sobreviveu à Guerra e ainda conta como o velho judeu continuou sendo uma pessoa mesquinha, sovina, oportunista e racista. Sim, como disse no começo, o autor não usa eufemismos e nem santifica seu pobre pai. Ainda assim, era um senhor carente, atormentado, precavido, amoroso.
A grande sacada de Maus está, no meu ponto de vista, no fato de que todos são ratos. Todos são vilões, todos são vítimas. Nazistas, judeus, poloneses que só queriam que aquilo terminasse, todos eram ratos acuados, desesperados pela sobrevivência, apegados em migalhas de esperança. Enquanto o maior de todos eles estava a salvo dos mísseis, em perigo ante seus próprios fantasmas.
Terminada a Guerra, resta a pergunta: o Holocausto também terminou? Judeus que sofreram atrocidades por conta da raça são racistas, alemães que viram a queda de sua nação ainda se consideram superiores, americanos que foram tidos como os heróis da liberdade são os maiores escravocratas dos tempos atuais. Judeus, negros, homossexuais, deficientes físicos e mentais e toda e qualquer diferença AINDA HOJE são perseguidos, julgados, condenados, mandados para os fornos.
Vivemos o holocausto diariamente e não nos damos conta. Acho que isso fica muito visível no relato do autor, pois se nem os judeus, como protagonistas de sua própria desgraça desde os primórdios, aprenderam a ser mais generosos, mais humanos e menos separatistas, que dirá daqueles que assistiram tudo do sofá de suas casas?
Sendo assim, passado e presente fundem-se neste livro que sangra história.