Ju 22/01/2013Cruzando o Caminho do SolCruzando o Caminho do Sol trata de um assunto muito delicado e doloroso: o tráfico de seres humanos. É um livro que mexe com a gente. Eu me senti uma inútil por não estar fazendo nada a esse respeito.
O livro conta a história de Sita e Ahalya, duas irmãs que vivem na Índia, com os pais e a avó. Têm uma vida sossegada, ao lado do mar. Até que um tsunami atinge a região em que vivem. As meninas perdem sua família, mas conseguem entrar em contato com o colégio que frequentam. Lá, estão dispostos a acolhê-las, só que para isso elas precisam chegar até o lugar, que fica em outra cidade. Sem parentes, sem dinheiro, sem amigos, as garotas caminham até a cidade vizinha para tentar conseguir um meio de transporte.
Encontram um conhecido de seu pai, e pedem ajuda a ele. É quando começa o martírio que elas passam. São vendidas pela primeira vez. O que se espera delas? Que se tornem prostitutas (ou beshyas, como são chamadas por lá). A mente das garotas é constantemente trabalhada para que aceitem seu destino, e se resignem com a situação, com falas como as seguintes:
"Não adianta lutar contra o seu carma. Aceite a provação que Deus impôs e talvez você renasça em um lugar melhor."
"O desejo é meu inimigo. O desejo pelo passado, pelo futuro, por um amor, por uma família. Por tudo. Uma beshya tem que se desapegar de todos os sentimentos e aceitar seu carma."
Felizmente as personagens principais são pessoas fortes, que não se esquecem em momento algum de quem são. Fazem o necessário para sobreviver, mas apenas para que possam continuar lutando para um dia reconquistar sua liberdade.
Ela seguiu as instruções da mulher e construiu dentro de si uma blindagem contra o sofrimento. Instintivamente, ela compreendeu que demonstrar fraqueza serviria apenas para promover novos abusos.
O livro passa-se inicialmente da Índia, mas depois o cenário muda, incluindo a América do Norte e a Europa nos acontecimentos. Acompanhei, boquiaberta, a rota do tráfico de seres humanos, e pude conhecer várias facetas dele. Aterrorizante.
"Não quero ser pessimista. A guerra pode ser vencida. Mas não colocando os traficantes atrás das grades. O tráfico vai acabar quando os homens deixarem de comprar mulheres. Até lá, o melhor que podemos fazer é vencer uma batalha de cada vez."
No fim, tudo se resume à velha lei da oferta e da procura. Sem demanda, não há oferta. Mas a procura é grande. Triste fato, mas real.
Acredito que Cruzando o Caminho do Sol não possa ser encarado simplesmente como um livro de ficção. A meu ver, está mais para um documentário do tráfico de seres humanos, embora utilize uma história de fundo para cumprir seu papel. Um livro que tem algumas partes felizes, mas que não traz de forma alguma uma história bonitinha.
Sim, eu sempre soube da existência do problema. Mas nunca com tantos detalhes. Apesar de uma leve mensagem de esperança, o livro é um tanto quanto deprimente. Leia quando estiver bem.
Postada originalmente em: http://entrepalcoselivros.blogspot.com.br/2012/08/resenha-cruzando-o-caminho-do-sol.html