Lygia 21/03/2012Delírio - Lauren OliverAMOR: uma única palavra, algo delicado, uma palavra que não é mais larga ou longa que uma lâmina. É o que ela é: uma lâmina, uma navalha. Ela corre pelo centro de sua vida, cortando tudo em duas partes. Antes e depois.
O restante do mundo cai em ambos os lados. "
(página 211 da versão digital)
Lena está aguardando ansiosamente pela sua intervenção. Um pouco mais de 3 meses e então ela se verá livre da doença, da ameaça que fica à espreita, o amor deliria nervosa. O 'Shhh', código de conduta que estuda desde criança, destaca todos os pontos negativos dessa doença horrorosa que costumava assolar toda a população, há tanto tempo atrás, e a garota não consegue imaginar um mundo onde as pessoas se amavam. Aliás, ela nem conhece essa palavra e nem sequer pode pensar nela - é proibido, é errado, não é seguro. Graças aos céus os cientistas de seu tempo conseguiram descobrir a cura para ela, e é através dessa intervenção, assim que a garota completar 18 anos, que a mesma não sentirá mais nada e ficará livre do amor para sempre. Ou assim ela pensa.
Hana, a melhor e única amiga de Lena, quer mais. Ela sabe que contatos físicos são desestimulados desde que ela se entende por gente e apesar de levar uma vida confortável (afinal, são poucos os que tem carros na cidade e a família dela é uma delas), a garota não se sente bem. Ela sabe que algo está errado. E começa a procurar, e quem procura acha: pessoas ainda conseguem encontrar festas normais, garotos e garotas interagindo. Mas é errado e proibido, e se forem pegos pelos reguladores, coisas não muito agradáveis acontecerão. Mas elas já passaram por suas avaliações- o processo que te atribui notas e determinante para escolha do seu par assim que você passa pela intervenção - e Hana sabe que elas tem pouco tempo. Ela quer aproveitar, pois assim que passar por seu processo e ficar livre de dor, livre do amor, com certeza nem sentirá mais falta da amizade de Lena.
Além do motivo óbvio de se ver livre da doença, Lena quer passar logo pelo intervenção e exibir publicamente com orgulho a marca que a cirurgia gera porque, quando ela ainda era criança, sua mãe se matou, dominada pelo amor deliria nervosa, mesmo que tenha passado pelo processo 3 vezes. Ela quer que as pessoas parem de olhar torto para ela, como se fosse uma aberração, ou até mesmo uma Inválida. Aliás, essa é outra palavra proibida. São chamados de Inválidos todas as pessoas que por algum motivo não passaram pelo procedimento e estão fora da fronteira que o governo estipulou como seguro. Pessoas que o governo prefere ignorar que existam.
As pessoas seguras e felizes, como determina o livro do 'Shhh', vivem sem o amor e casadas com uma pessoa determinada para elas através da avaliação. Alex trabalha em um dos laboratórios onde são realizadas as avaliações e as intervenções. Com mais de 18 anos, ele tem a marca e provavelmente já foi pareado com alguém. Mesmo assim, Lena não pode evitar sentir algo diferente quando o vê pela primeira vez. E depois de novo, e então, mais uma vez. Será que ela já está infectada com o amor deliria nervosa, como sua mãe? E se tudo o que aprendeu durante sua vida toda estiver errado e a intervenção não for o procedimento correto?
Pois bem, Delírio é o ponto de partida para a distopia criada por Lauren Oliver, e por esse motivo, como todo livro introdutório de série e/ou trilogia, temos um ritmo mais lento de leitura. E foi assim pra mim até a página 200, aproximadamente. Detesto fazer comparações óbvias, mas é inevitável falar que até o número da página dita, eu tive a impressão de estar relendo 'Destino', da Ally Condie. Muita introdução para explicar como a sociedade funciona e inserir de vez o leitor no universo criado. As páginas finais, por outro lado, são de ação pura, e talvez seja por esse único motivo que eu desejei ter Pandemonium em mãos para saber o que acontece em seguida.
É inegável o dom que a autora possui de prender o leitor com sua forma de escrita. Tal como 'Antes que eu vá', por mais que eu não tenha amado a história de paixão, não conseguia parar de virar as páginas, só para saber o desenrolar dos fatos. Acho que a decepção rolou justamente por ter a impressão de ler algo duplicado, e também, porque encontrei algumas incoerências com a questão da população viver de forma harmoniosa, digamos assim, sem ter sentimentos, mas serem capazes de gerar filhos. Esses, que até aos 18 anos, tem todos os sentimentos à flor da pele, mas convivem com pais que não conseguem amar, porque é errado. A criança é criada, imaginei eu, sem nenhum elo, nenhuma referência para as emoções, e elas nem sabem lidar com isso, porque seus pais, após a intervenção, nem mesmo conseguem dar palavras de conforto e ânimo. Sinceramente, isso não fez sentido pra mim. Só lendo para entender. Mas recomendo a leitura justamente porque levanta as discussões acerca das escolhas, livro-arbítrio. E é ótimo acompanhar as emoções intensas vivenciadas pelos personagens quando fazem parte de um universo cheio de restrições e proibições.
Resenha em: http://www.brincandocomlivros.com/2012/03/resenha-delirio-lauren-oliver.html