Lola444 10/03/2020Eu realmente não sei o que pensarJá faz quase duas semanas que terminei esse livro e eu ainda não sinto que ele amadureceu o suficiente na minha cabeça. Existem passagens assombrosamente bem escritas, sentimentos e pensamentos crus, reais, sem qualquer nível de piedade do leitor. Maaas, pra mim tem um grande porém.
Ao ler esse livro eu tiver uma sensação muito estranha, de ficar buscando sempre uma explicação melhor do porque Laura odiava tanto sua mãe, um tipo de expectativa para um clímax que nunca chegou. A filha falava muito sobre o ódio, a mágoa, a monstruosidade da mãe, sua mesquinharia, egoísmo e possessão, mas em pouquíssimos momentos o livro retrata a prática dessas características de maneira enfática. A infância/adolescência de Laura é muito pouco explanada, nós vemos um ou dois episódios do abuso da mãe, e mesmo sendo terrível, ainda assim eu achei pouco para embasar a atual relação delas.
(Antes que entendam mal, "pouco" que eu falo é no sentido narrativo mesmo - não na crueldade dos atos em si -, tendo em vista que a proposta do livro é trabalhar justamente essa hostilidade nada mais justo que construí-la de forma bastante aprofundada)
Por outro lado, a infância e adolescência da mãe é ricamente explorada, me levando a ter mais empatia por Maria Lúcia do que por Laura porque conhecemos toda a formação de caráter o que a levou a ser o que ela é hoje. Eu cheguei até a cogitar que talvez a autora quis fazer uma espécie de analogia, em vez de mostrar as mesmas situações duas vezes, mostrou só a da mãe sofrendo nas mãos do seu pai, mas querendo dizer que ela fez as mesmíssimas coisas com a filha no futuro, porém isso se contradiz quando lemos as poucas cenas que demonstram os abusos da mãe e verificamos que são comportamentos muito distintos (até opostos algumas vezes, dado que a forma do pai de controle era a indiferente distância e a de Maria Lúcia a proximidade sufocante), ainda que rimadas de alguma forma com o abuso que a própria sofria, precisavam ter ganhado um espaço maior com sua própria identidade tendo em vista que foi um reflexo e não uma reprodução dos mesmos atos.
Bom, na minha opinião, sendo livro sobre a relação de mãe e filha, mesmo que mostrasse essa construção da mãe, ela não deveria se sobressair à narrativa da desconstrução desse relacionamento, e para mim foi justamente o que fez. Se me perguntarem o que ficou de mais memorável da leitura para mim, sem dúvida, foi a narração da vida da mãe.
Se eu já estava achando difícil me conectar com a Laura (particularmente, o que aconteceu com o gato no início já me fez não conseguir me apegar nenhum pouco com ela) para piorar eu tampouco encontrei justificativa dentro da história para o nível de debilidade psicológica que ela apresenta, todo aquele ódio, toda aquela fúria. Não estou diminuindo o que a mãe fez, mas eu senti carência de mostrar MAIS para poder solidificar melhor todo o rancor que as rodeia.
Gostaria de ressaltar que não estou fazendo discurso de que tal problema não justifica depressão na vida real, óbvio que a vida real é diferente, pessoas sem qualquer trauma podem apresentar depressão, mas dentro de um livro que trata sobre um trauma específico e a quebra da maternidade perfeita eu faço sim questão que ele se estenda e justifique de maneira satisfatória toda a desgraça entre elas, pois esse é o objetivo dele.
Eu não desgostei do livro, ele tem partes absolutamente incríveis (99,9% da Maria Lúcia), porém eu acho que tinha potencial para ser MUITO melhor, além da escrita da Eliane Brum ser maravilhosa ela criou uma puta premissa, pena que encontrei essas lacunas que prejudicaram muito minha leitura.