alinevianadp 12/01/2022
Um livro leve e divertido, que pode ser lido em uma sentada
"No seu caso, teria de se vestir para provar que era normal, voltar a esconder sob a roupa o atributo de sua condição de homem, para ser aceito pelos outros homens."
Eu amo o Fernando Sabino, e tenho muito orgulho de poder dizer que sou mineira como ele. Todas as leituras de obras dele sempre foram, para mim, muito prazerosas! Costumo gostar muito dos temas que ele trata e do tom bem-humorado que ele emprega nas suas narrativas. Com "A nudez da verdade" não seria diferente: embora eu não tenha tido nenhum apego emocional em relação a ele, achei um livro muito gostoso de ler! É um livro bem fininho, com leitura muito leve e fluida: pode ser lido em apenas uma sentada.
O título da obra ("A nudez da verdade") faz remissão a uma citação de Eça de Queiroz em referência à atividade literária e ao seu modo de expressão: "Sob a nudez da verdade, o manto diáfano da fantasia".
Por meio desse livro, Fernando Sabino narra um episódio muito inusitado vivido pelo escritor Telmo Proença no dia em que ele se viu nu diante de grande parte da população do Rio de Janeiro. No início da narrativa, Telmo está se preparando para fazer uma viagem para São Paulo, para lançar um livro. Sua esposa decide não acompanhá-lo, e os dois parecem um pouco tensos com essa decisão dela. Pois bem. No aeroporto, Telmo acaba encontrando um ex-aluno que estava acompanhado de um grupo de amigos (incluindo uma moça) e de instrumentos musicais. Os seis começam a conversar e, entre uma música e outra, descobrem que todos os voos para São Paulo haviam sido cancelados naquele dia por conta do mau tempo. Diante disso (e também do fato de que já havia "tomado umas"), Telmo acaba aceitando o convite do grupo de amigos e acaba esticando a festinha do aeroporto no apartamento de Marialva, a moça sensual e de voz grave que fazia o vocal feminino na banda que havia se formado no aeroporto. Eu não preciso nem dizer no que deu essa noite: enfim, no dia seguinte Telmo acordava nu em plena cama de Marialva. Enquanto ela tomava seu banho matinal, Telmo foi (ainda nu) para a cozinha para preparar o café. Lá fora, no parapeito do muro, o padeiro havia deixado um embrulho com o pão. E, ao sair para pegar o pão, ainda sem roupa, Telmo acaba se trancando do lado de fora do apartamento. Como Marialva estava tomando banho, ele não consegue que ela lhe abra a porta. De repente, aparece no corredor do edifício um vizinho que vê o homem nu; a partir de então, Telmo se acha em maus bocados, tentando fugir da muvuca que surge em torno desse desconhecido que aparece pelado no meio do prédio. Nessa fuga, ele acaba ganhando as ruas do Rio de Janeiro, e vai parar em lugares completamente inusitados, como o armário de uma desconhecida, uma festa de casamento, uma praia que não era de nudismo e um barraco na favela. Obviamente, ao final do dia todo o corpo policial da cidade já estava atrás dele, e surgiram várias conjecturas a respeito de quem ele seria: um tarado? Um ladrão? Um lunático? Um psicopata? E até: um homem-bomba? E é legal que em várias ocasiões o leitor acha que ele será descoberto e capturado pela policia, então a gente fica super curioso pra saber se ele vai ser pego, se a esposa vai descobrir que ele era o homem nu que estava andando pelas ruas da cidade (e que ele a havia traído na noite anterior).
O que eu achei mais interessante foi que eu fiquei na torcida para ele não ser descoberto, mesmo sabendo que ele não era um "santinho" e que ele só tinha entrado nessa barca furada porque ele havia traído a sua esposa.
Um dado curioso sobre o livro é que de forma indireta o autor é citado na narrativa, porque uma jornalista de rádio faz uma reportagem sobre o caso e entra em contato com o escritor de uma obra intitulada "O homem nu" para saber a opinião dele a respeito daquele fato. Fernando Sabino tem uma crônica intitulada "O homem nu", que deu nome a um livro que compilava várias outras crônicas dele. Inclusive, quem já leu a crônica ou quem já assistiu ao filme homônimo (seja o de 1997, estrelado por Cláudio Marzo, seja o de 1968, estrelado por Paulo José) vai notar bastante semelhança com a história de "A Nudez da verdade". Eu mesma, que já havia lido a crônica e também já havia assistido ao filme de 1997, quando li "A nudez da verdade" me perguntei se era a mesma história com um título diferentes. Pesquisando na Internet eu descobri que Fernando Sabino escreveu o livro "A nudez da verdade" justamente pra transformar a crônica em uma novela. Então, a historia é parecida, mas em "A nudez da verdade" ela é mais desenvolvida (a crônica é mais curtinha). Sobre o filme, é bem legal também (desses filmes nacionais de humor levinho, bom pra ver nas férias).
O livro é bacana porque, apesar de contar uma história inusitada, relata um acontecimento que já esteve no imaginário de todo mundo: quem aí nunca sonhou que estava sem roupa diante de outras pessoas, conhecidas ou desconhecidas? E é muito interessante pensar em como algo que parece ser tão banal (como o ato de cobrir o corpo com uma roupa) é algo tão essencial na sociedade, e tão fundamental para o convívio harmônico entre os indivíduos.
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