Fernando Lafaiete 07/12/2018Fome: Quem será o próximo a morrer?******************************NÃO contém Spoiler da série******************************
Confesso que esta série veio para quebrar algumas certezas que eu possuía quando o assunto era histórias juvenis. Nunca imaginei que fosse encontrar tantas questões psicológicas, tantas incertezas e tanta brutalidade em uma série cujo público alvo eu supostamente não me encaixava mais; apesar de ainda ser leitor assíduo deste tipo de livro.
Michael Grant tem uma escrita deliciosa que juntamente com sua narrativa fluída nos envolve e nos deixa tensos do começo ao fim. O autor cria um universo que mistura X-men com Sob a Redoma de Stephen King e não deixa de brincar com a temida e já conhecida questão: Quem será o próximo a morrer?
Ler a série de Grant é um excelente exercício pra quem deseja um dia ler As Crônicas de Gelo e Fogo de George Martin. Se apegar a algum personagem é algo inevitável, mas não deixa de ser uma decisão insana.
O ambiente criado pelo autor é claustrofóbico, sanguinário e instigante. Acompanhar adolescentes tendo que se adaptar a um mundo sem adultos, tendo que cuidar de si próprios e tendo que moldar uma nova sociedade, já seria um plot no mínimo interessante. Agora junte a tudo isso uma redoma que os aprisiona, jovens que começam a desenvolver super-poderes, animais que passam a sofrer mutações, a terrível fome que começa a dar as caras graças o início da falta de comida e vilões que adoramos odiar.
O autor trabalha muito bem o psicológico da trama de maneira que nem todos os personagens soam unilaterais, bons ou maus. As situações apresentadas mostram para o leitor de maneira plausível o que o desespero pode fazer com o ser-humano. As cenas de ação continuam muito boas e as mortes ocorridas são muito bem descritas... Absolutamente gráficas.
Os vilões são um show a parte. Todos são excelentes e colaboram com maestria com a movimentação da trama. Como um fã de vilões, não consigo não amar e odiar todos nas mesmas proporções. Os mocinhos também são bacanas, mas eu continuo sem saber o que pensar de Sam, o protoganista. Os problemas que cito em Gone: O Mundo Termina Aqui, permanecem nesta continuação. Minha relação com este personagem oscila demais, e isto me incomoda.
Esta série de fato se diferencia de qualquer outra que eu já tenha lido, onde o público é uma galera mais jovem. O autor não se intimida com isso e não tem medo de jogar nas nossas caras muito sangue, corpos decepados, e jovens psicopatas que se divertem com o sofrimento alheio.
Mas esta série não possui grandes problemas?
Todas as ressalvas que citei na resenha do primeiro volume ainda estão aqui e acredito que permanecerão até o último volume. (Aconselho a lerem a resenha de Gone para se situarem sobre o que estou falando).
O autor poderia também ter pesquisado um pouco melhor alguns assuntos para que nenhum soasse raso demais ou até mesmo desrespeitoso para alguns leitores. Gordofobia, homossexualidade, anorexia, autismo, todos estão presentes, mas nenhum me convenceu completamente.
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Não posso deixar de citar que as personagens femininas são muito bem desenvolvidas. Suas personalidades são identificáveis, suas motivações plausíveis e elas não são em momento algum apagadas pela presença dos personagens masculinos. O equilíbrio de gênero existe e é um dos pontos altos deste magnífico universo.
Michael Grant merece ser lido. É pra mim o George Martin dos adolescentes, e só por me lembrar mesmo que de maneira sutil o meu autor favorito, já o indico. Tem como X-men sanguinário não ser bom?