Camila Roque 18/05/2023
Para empretecer o discurso
Somos a história que contamos sobre nós mesmos. Cada pessoa possui um discurso próprio, acerca de quem é, qual o seu lugar no mundo, seus grandes feitos e fracassos. Essa história é muito poderosa, capaz de determinar a forma como nos portamos e sentimos perante a nossa realidade.
Para pessoas negras no Brasil, é difícil ter uma história positiva. E olha que não há nada de errado conosco. O problema, no entanto, é que fomos ensinados a perseguir um ideal branco. É sobre isso que se trata o livro de Neusa Santos Souza.
A história de sucesso, nesse país, é branca. Como nos casos estudados por Neusa, branco é limpo, é rico, é desejável. Preto é pobre, é sujo, é perigoso. Neusa nos mostra o quanto fomos condicionados a acreditar nessas palavras, no mito negro. Vidas inteiras marcadas por inúmeros tipos de violência, tão poderosas que se refletem no mais profundo de nossos seres e ferem aquilo que não pode jamais ser mudado: somos negros.
Ser preto em uma sociedade racista é desejar ser branco, porque ser branco é ser bem tratado, é não precisa estar sempre em alerta com medo do próximo ataque. Vivemos em um mundo onde somos tratados como o “outro”, onde quem define o que é belo, certo e justo é a branquitude. “Onde o inimigo decide se ofendeu”, como diz Emicida.
Entendem quão triste é isso? Impedidos de alcançar esse “ideal” branco, esse padrão, temos nossa autoestima destruída ou somos compelidos a ser cada vez mais e melhores (de uma forma bem doentia).
A menos que…
Nos tornemos negros. Precisamos nos atentar para isso e empretecer nossos discursos. Perceber que há um processo ideológico no nosso entorno que nos aprisiona nessa imagem alienada. Tornar-se negro é uma tarefa política, é tomar consciência da dignidade da nossa história. Uma história preta.
Ou será que, como diria Djonga, “tu vai ser mais um preto que passou a vida em branco?”