Lisa 02/05/2024
Fantasia nacional em sua finesse.
Esbarrei com a saga Escarlate à muitos anos atrás no twitter, fiquei encantada, salvei na lista de desejados e... foi isso. Anos se passaram desde então, até que encontrei como leitura coletiva do grupo de leitura da minha cidade, recomendado a mim por uma prima. ?Essa é a chance, ou você lê agora ou deus sabe quando.?, pensei comigo e, assim o fiz, AINDA BEM.
Superar a relação com Harry Potter e as inevitáveis comparações ao começar a ler e vislumbrar elementos tão familiares a nação potterhead foi um desafio inicial para mim, no entanto quanto mais nos aprofundamos mais a saga se afasta de HP e ganha força própria. Renata Ventura criou um ambiente único, semelhante a tudo que nos é familiar como brasileiros e ao mesmo tempo diferente do que estamos acostumados. Os constantes acessos nacionalistas de Vinny rejeitando o estrangeiro nos serve como lembretes de que estamos lendo algo nosso, não JK Rowling. Ri a cada comentário dele, me lembrando Suassuna.
Embora uma fantasia em F maiúsculo, é também inegavelmente realista. Ventura tem a coragem e a audácia de expor o Brasil como ele é. Seu protagonista é um moleque malandro, menino preto, sem pai, de uma grande favela no Rio, revoltado com seu contexto, desconfiado de tudo e pronto para fazer o que for preciso para se dar bem, metido com o tráfico. Hugo é, para mim, um dos personagens mais interessantes que já li, justamente por ser real. Se você trabalha/trabalhou em colégios públicos ele é um dos muitos desse tipo sentados em salas de aulas. É impossível gostar de Idá, ao mesmo tempo, que também o é odiá-lo.
Em suma, em uma trama cheia de reviravoltas, escorrendo política e acidez, extremamente bem pensada, temos uma saga brasileira e que se orgulha disso, dos feitiços iorubás até o nosso folclore. Em um primeiro livro magnífico, Renata Ventura nos deixa cheias de dúvidas e loucas para continuar lendo. E agora passo a aguardar meu pombo, pois com certeza não aceito ser mequetrefe. Por fim, esse é mais um exemplo de como nossa literatura vive e lidera, sem ficar atrás de nenhuma outra.