spoiler visualizarBeatriz3345 29/07/2024
"Bastilha à razão humana"
Em primeira mão, O Alienista deixou-me confusa. Após uma breve reflexão, compreendi que tal confusão dava-se pela multiplicidade de temas abordados numa obra de tão poucas páginas. Além do tema mais explícito, a volatilidade e imprecisão da ciência, Assis faz alegoria as disputas de poder entre governos e revoluções. A marcante declaração dos Canjicas, "bastilha da razão humana" evoca no leitor a antecipação dos eventos de Itaguaí com base na história da França. Assim como na Revolução Francesa, aqueles que se propuseram a defender os itaguaienses e lideravam a marcha contra a Casa Verde, quando alcançado o poder, revelaram-se tão audaciosos e impiedosos quanto os antigos vereadores. Interpretei O Alienista como um juízo aos revolucionários, que nada mais são que audaciosos que utilizam de pautas da massa para subir até o poder. Utilizando a declaração da defesa às minorias, a revolução tornou-se uma maioria que busca, não equalizar a população, como dizem, mas inverter os valores e poderes. Esses, desejam mais que tudo, pisar na cabeça dos que, outrora, os "oprimiram", os quais chamam "inimigos". Como escreveu Charles Brenner, "quem, antes, era o adversário da tirania, hoje é o tirano". Ao apontar outro como o tirano, os gananciosos tiram de si o julgamento e os atribui a outros, permitindo-lhe fazer o que bem entender. Interessantíssimo é que, impelido contra o inimigo da vez, numa luta desastrosa, porém necessária, parece ao povo está fazendo o correto. O problema é que esta revolução já falhou, uma vez que os líderes da cidade falharam em exercer seu papel e o povo falhou em eleger seus líderes. A declaração "bastilha da razão humana" carrega esse tema com ironia e contradição. Os Canjicas convidam o povo a derrubar a ciência e toda a razão que há, deixando-se desorientado na paixão. Ora, sem razão, sobra-lhe apenas a emoção. E é disto que os gananciosos utilizarão para tornar-lhe o poder nas mãos. A moral da história, a meu ver, pode-se resumir em que a população saiba, com maestria e sensatez, escolher aqueles que se chamarão "líderes".