spoiler visualizarGisele Servare 03/11/2016
Dez Coisas que amei nesse livro
Cada livro que lemos nos toca em uma determinada parte de nosso coração. Esse livro mexeu com o meu coração de mãe. Ele me fez rir e chorar e morrer de preocupação com o protagonista, - mas me consolou ao mesmo tempo, por não ser uma mãe perfeita. “O estranho caso do cachorro morto” é um livro que vai te mostrar o que é a vida de um menino com Síndrome de Asperger. E mais que isso, mostrar como é o seu mundo e sua influência direta na vida de seus pais, despreparados para o grande desafio que é cuidar de Christopher e protegê-lo. Ignore a capa mal feita e o titulo estranho e embarque nessa história delicada e sensível!
Breve sinopse: Christopher tem 15 anos e sofre da síndrome de Asperger, um tipo de autismo. Um dia vai ao seu jardim e vê, no quintal ao lado, o poodle da vizinha, morto de forma violenta. Acusado pela vizinha de ser o assassino, ele sai da sua concha, lutando contra suas fobias sociais e muitos medos para tentar desvendar o mistério do assassinato do cachorro. Acaba descobrindo muito mais que esperava e queria sobre seus pais.
Dez coisas que amei no livro
1-O livro é uma narração em primeira pessoa, Mark Haddon transforma Christopher em autor do livro, o qual escreve como uma ferramenta para estudar e analisar o caso do assassinato do cachorro. Dessa forma nos aproximamos do jeito especial de Christopher e colocamos suas lentes de leitura do mundo. Enxergar a vida e os fatos sob a ótica de um autista é uma experiência única. A linguagem é simples, mas o livro é profundo.
2-A numeração dos capítulos é uma grande sacada de Mark Haddon: Christopher ama números primos, por isso, os seus capítulos são numerados nessa ordem: 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29, 31 etc. Diversas fórmulas matemáticas, esquemas e desenhos fazem parte do livro, ilustrando diversos momentos em que o personagem tem que lidar com emoções. Tocou-me profundamente o papel que ele carregou por algum tempo no bolso com diversos smileys, que sua professora desenhou para que ele usasse como “cola” quando não entendesse o que alguém estivesse sentindo no momento: raiva, tristeza, medo, etc.
3- Christopher tem 15 anos e estuda numa escola para crianças especiais, o que no Brasil seria mais ou menos o equivalente à Sociedade Pestalozzi. Ele é extramente inteligente, seu domínio da matemática é superior ao de muitas crianças “normais”, mas devido à sua síndrome ele não tem como frequentar uma escola comum. Ele não suporta o toque físico, nem mesmo de seus pais. Não tolera as cores amarela e marrom (não come nada dessas cores) e tem muitas manias, como, por exemplo, não comer mais se os itens que compõem o seu prato tocarem um nos outros. Uma de suas condições especiais é que Christopher não fala com estranhos. Mas desde que o cachorro foi assassinado e ele resolve descobrir quem foi o autor do crime, ele começa a conversar com seus vizinhos e passa a relatar a sua professora todos os seus progressos.
4- A professora, aliás,é a única pessoa na história que sabe lidar com Christopher, que o entende e que o ajuda de forma concreta a lidar com a sua condição. Fiquei tocada com esse papel da professora, que ensinou a Christopher a entender o mundo e a manter a calma, como também vencer o medo e se defender. Aumentou meu respeito pelos colegas professores, que a despeito dos salários baixos e todo o estresse da profissão, ainda tem o poder de mudar a vida de muita gente e vontade de fazer isso.
5-Uma das coisas que mais me chamou atenção no livro é a figura do pai, que tentando acertar na educação do filho comete erros que Christopher nunca perdoará – mas que o leitor vai entender. O pai não tem a menor condição de cuidar – sozinho – de Christopher. Ele não tem condições psicológicas, intelectuais ou financeiras para isso, mas ama o filho, tanto que acaba cometendo o crime que move toda a história.
6- A mãe é outra personagem sem a menor condição de cuidar de Christopher, tanto que acaba o abandonando com o pai – que aliás, sem ter como explicar isso ao filho especial, acaba inventando uma grande mentira, de que mãe havia morrido – o que Christopher acaba descobrindo. Quando abandona a casa e Christopher, a mãe acaba percebendo que não saberá lidar com o autismo do filho, mas que ele precisa de seu amor. Uma lição de vida para todos nós que temos mania se sentir culpa por tudo na maternidade.
7- Quando descobre que a mãe ainda está viva e que o pai é o assassino do cachorro, Christopher não consegue mais confiar nele e foge para Londres, vivendo dezenas de situações que exigem demais de suas limitações psicosociais, como lidar com lugares e pessoas desconhecidas, ficar num ludar fechado com muita gente…. Meu coração ficou apertado durante a narrativa de sua fuga para Londres, cada vez que ele se jogava no chão em posição fetal, gemendo para se acalmar. Tive medo de que algo acontecesse com ele, medo dos ohares criticos, medo das risadas, da maldade humana.
8- Detesto matemática, mas com esse livro consegui entender porque tantos autistas têm facilidade ou fascínio pelos números. Os problemas matemáticos, mesmos os mais difíceis, conseguem ser resolvidos com base na lógica e no raciocínio. Os problemas cotidianos na vida não.
9- O livro me encheu de respeito pelos autistas, e mais ainda pelos pais deles. Não deve ser nada fácil enfrentar os problemas do dia a dia que essas pessoas especiais enfrentam. Não deve ser fácil enfrentar o olhar crítico da sociedade, que espera respostas baseadas num padrão. As crises, as manias, a lógica do mundo autista não foi feita para o mundo em que vivemos. Mas Christopher nos mostra que na verdade seu mundo é simples, desde que haja entendimento e aceitação.
10. Chorei muitas e muitas vezes durante a leitura. Por todos os meninos e meninas que enfrentam tantos medos em seu dia a dia – medos esses que não são compreendidos pelos outros. Chorei por pena dos pais, que não podem nem abraçar os seus filhos, por que esses tem fobia do contato físico. Por imaginar as noites em claro desses pais, que se sentem impotentes diante da condição de seus filhos. Mas sorri ao final do livro, que mostrou que é possível encontrar a felicidade mesmo diante de tantos obstáculos.
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