mpettrus 31/12/2022
O Adeus Literário Para Michelle Rice
?Na penúltima resenha do ano de 2022, esse que foi um ano movimentadíssimo quanto ao meu hábito de ler, porque, acreditem-me, eu li além dos livros aqui publicados nos históricos de leitura, muito material de concursos e trabalhos acadêmicos, Catálogo CAPES já é um site favoritado no meu navegador, e infelizmente não tem como adicionar aqui no site do Skoob, eu quero lhes falar brevemente das minhas impressões da releitura do romance de Anne Rice, o clássico horror gótico ?Entrevista Com o Vampiro?.
A primeira vez que ouvir falar o nome desse título foi por conta do filme, inspirado e adaptado do livro da Rice, o filme que tem no elenco Tom Cruise e Brad Pitt e na época, a pequena notável Kirten Dunst. Eu já era fã do filme ?Drácula de Bram Stoker?, logo era fã da sua literatura vampiresca. Adorava a novela da TV Globo, a memorável ?Vamp? com a icônica Cláudia Ohana e Ney Latorraca, interpretando o emblemático Conde Vlad Polansk e passei a amar cegamente os vampiros quando conheci a eterna Buffy Summers, interpretada por Sarah Michelle Gellar, na inesquecível série ?Buffy the Vampire Slayer?.
Todas essas obras seguem as principais características da mitologia vampiresca. Não se expor ao sol, o vampiro só morre de fato quando tem a cabeça decepada do corpo, a água benta queima suas peles brancas, são sanguinários e verdadeiras máquinas de matar seres mortais. Claro que dentre essas obras, oscilam bastante essas principais características, mas o principal sempre ficou em evidência. Quando li o romance da Rice pela primeira vez, anos depois de ter assistido ao filme, eu simplesmente fiquei maravilhado com a narrativa riceana, e compreendi o porquê no meio literário a chamavam de ?Rainha do Terror Gótico?.
Por conta do lançamento da série baseada nesse romance, comprei uma nova edição e comecei a ler pela segunda vez. Releituras de obras de qualquer gênero artístico sempre me deixam apreensivos, por medo de descobri que tal obra venerada por mim envelheceu muito mal e ficou datado. Felizmente, aqui isso não aconteceu. Não totalmente!
Depois de uma década de decepções no começo do século XXI com obras que retratavam a mitologia vampiresca, vulgo o horrível ?Saga Crepúsculo? e a pessimamente série de TV ?The Vampire Diaries?, ler esse romance da Rice foi o recomeço de tudo e, mais uma vez, foi pelas mãos de meu irmão, o escritor da família, quem me jogou de volta nesse mundo gótico de mascarilhas e jugular. E eu descobrir que a Rice elevou o nível de narrar sobre o mundo dos vampiros ao nos contar a trágica história de Louis, Lestat e a pequena Cláudia, reacendendo todo o meu amor pelos vampiros e que continua forte até hoje.
Sabemos que das ?Crônicas Vampirescas?, Lestat é o favorito da ampla maioria dos leitores dessa saga e, ao meu ver, o era também da própria Rice. Eu sempre o vi como um perfeito egoísta. Mas essa é uma impressão minha da personagem muito restrita ao primeiro volume da saga. No decorrer das histórias das crônicas, Rice vai lapidando a personagem que é difícil ficar incólume na sua presença. Ele é de uma força descomunal que te hipnotiza.
Louis, de longe, sempre me pareceu o menos interessante. Sempre me perturbei com a sua pasmaceira e o fato dele não assumir a responsabilidade pela sua própria e trágica infelicidade sempre me irritou. Mas confesso para vocês que as melhores reflexões filosóficas advêm dos diálogos de Louis. Costumo dizer que a personagem Louis é o alter ego da própria autora. Para mim, sempre me soou sua voz quando lia os pensamentos existenciais de Louis.
Cláudia sempre foi a minha personagem favorita. Ela era cruel porque foi transformada em vampira quando tinha apenas 4 anos, ou seja, ela não tinha memórias reais de quando ainda era humana e nenhuma conexão real com seres humanos para nutrir sua compaixão. Ela sempre conheceu essa espécie como comida.
Para piorar mais ainda a sua trágica existência, ao ser transformada em vampira, seu corpo de criança de 4 anos, como numa espécie de maldição, nunca iria mudar ficando presa nesse corpo para sempre. A sua mente cresceu e se expandiu, mas seu corpo não. Exatamente por isso o mundo sempre a tratou como uma criança.
Entretanto, Cláudia nunca desistiu de lutar, de buscar uma salvação para si mesma. E é fascinante acompanhar sua luta para tentar escapar de sua situação e poder retomar o controle de sua vida. Ela não aceita ser essa triste boneca trágica. E é isso que me encanta na personagem. Essa força descomunal que reverbera da sua existência, capaz de amedrontar até os mais poderosos dos Vampiro como Armand e o próprio Lestat.
Outro ponto crucial que me faz amar a personagem, e aqui entra uma leitura muito pessoal e subjetiva da minha análise, que é o fato de que a autora escreveu esse romance, segundo dizem as lendas, num rompante só após a morte de sua filha, Michelle Rice.
Enquanto lidava com o luto, Rice escreveu Cláudia e, para mim, foi sua maneira de expurgar a sua dor de mãe. E não só: também sua forma de questionar suas questões existenciais ante uma perda tão dolorosa, tão cruel e, quem sabe, tão sem sentido. Os paralelos que eu faço da sua vida com essa obra em específico, me faz crê que para além de ser a sua válvula de escape do mundo real, esse romance foi também sua longa carta em homenagem à memória de sua filha. Foi sua despedida simbólica com Michelle.
Gostei desse romance do começo ao fim. É uma história de puro horror gótico vampiresco, apresentando personagens imortais que tem emoções humanas e problemas interpessoais. O que torna esse romance tão único são as emoções que a Rice dá as suas personagens. Ela sabia escrever bem as suas emoções intensas ao mesmo tempo que você não tinha a ilusão de que os vampiros eram humanos.
O tom da narrativa é sombrio e gótico, justamente porque os vampiros são reais que matam pessoas, seja para se alimentar ou simplesmente para viver a emoção de caçar seres humanos. Gostei demais das descrições ao longo da história: da Louisiana dos anos 1700 à sombria Europa do Velho Mundo.? Lindamente bem escrito, a carta de despedida de Rice para Michelle é o verdadeiro retrato do desencanto pela vida que a humanidade já vivenciou.