Ratinha de Biblioteca 03/09/2019As sinopses dos livros deveriam ser como as dos filmes...Sabe quando lemos a sinopse do filme, num serviço de streaming ou na caixinha do DVD/Blue Ray (para aqueles das antigas! Ou VHS! Vixi!) e há uma frase explicando qual o gênero e o conteúdo? Pois é, gostaria que nos livros viessem na capa também indicando o gênero e o conteúdo.
Por exemplo, em "O Poder" o gênero seria: ficção científica e distopia. Melhor que dizer "Jogos Vorazes encontra O Conto da Aia", como está na quarta capa! Porque não explica nada para quem, por acaso, não tenha lido esses livros e, falta a parte da ficção científica! Afinal, neste livro as mulheres soltam raios pelas mãos por meio de uma "trama" eletromagnética na clavícula!
Já o conteúdo seria: violência física, sexual e psicológica. Ou: contêm descrições de estupro, tortura e demais violências extremas. Para aqueles que têm estômago fraco para múltiplas violências, evitem esse livro. Não é o meu caso, ainda bem, pois ela está do início ao fim da história e não se tem essa noção ao se ler a sinopse. Mas a violência não é gratuita: é parte primordial do enredo, quase uma personagem, como o "poder" do título também o é.
Fazendo um resumo de forma bem simples: um dia as adolescentes verificam que conseguem emitir energia eletromagnética pelas mãos. De repente, todas as meninas começam a nascer com esse poder e as mais jovens podem despertar "o poder" nas mulheres adultas. A história é contada como se fosse um livro. O "autor" aparece no início e no final da história, trocando mensagens com uma amiga dele, que leu o livro e irá opinar sobre o mesmo.
Acompanhamos os fatos por meio dos depoimentos de Roxy, Tunde (a personagem masculina mais representativa da história), Margot, Allie, Jocelyn e Darrel (irmão de Roxy). Por meio desses relatos, temos a visão de mulheres que eram humilhadas, espancadas, estupradas, seviciadas e que, agora em uma posição de superioridade física, vingam-se a ponto de seus antigos maus tratos, sofrimentos e torturas serem considerados "leves".
Diferente do livro "O Conto da Aia" em que não se explica como a "mudança" ocorreu ou com é a religião existente, aqui temos todas as explicações. O surgimento da nova religião é relatado desde o seu início, destacando a personagem Allie, que irá focar nas forças femininas de todas as religiões existentes (Judaísmo: Moisés é substituído por Rute, Islamismo: Maomé é trocado por Fátima, Cristianismo: Maria é venerada no lugar de Jesus, etc.) e Deus passa a ser uma entidade feminina; Mãe ao invés de Pai. As citações e referências bíblicas permeiam todo o livro. Já ouvi mais de um canal literário dizer que, para compreender melhor algumas obras da literatura ocidental, a leitura da bíblia poderia ser considerada uma "leitura de apoio". Nesse livro, já se inicia com uma longa citação do Velho Testamento.
Assim temos o poder político passando das mãos masculinas para as femininas; as expressões religiosas focando no feminino e não mais no masculino; a mulher passa a ser a "chefe" de família, etc. Com essas transformações, nas ocorrências de violência doméstica o homem passa a ser a vítima; eles agora são os prostitutos; em um país de maioria feminina, eles não podem sair sem a companhia delas, não podem dirigir, não podem possuir bens... E então percebemos que, tirando o fato de os homens não terem um poder eletromagnético, é esse o mundo em que vivemos! Só que são as mulheres que só puderam votar e serem votadas em meados do século XX; no Brasil, por exemplo, as mulheres não podiam ter conta em banco e abrir um negócio próprio em seu nome, sem a autorização do marido ou pai, até a década de 60! A Arábia Saudita só recentemente liberou as mulheres para dirigirem, irem aos estádios sozinhas... Mas as sauditas ainda precisam da autorização de pais e maridos para deixar o país. E se esse pai ou marido for o seu agressor, estuprador, torturador?!
Então você percebe que está lendo um livro de ficção científica e distopia, mas os fatos narrados nele parecem tanto com a sua realidade! É de embrulhar o estômago.