DIRCE 25/12/2016
Um livro para se levar em uma ilha deserta
“As Ondas “ exigiu de mim uma releitura, pois terminei a leitura com muitos pontos carentes de esclarecimentos, entretanto, não foi de forma alguma um castigo, foi sim, puro deleite.
Enquanto eu “ouvia” as vozes - não fiquei maluca, ainda não- ( ocorre, que o livro é uma meditação da vida por meio dos monólogos interiores de seis personagens), lembrei-me de uma frase do Gullar de Andrade: “A arte existe porque a vida não basta”.Bingo!!!! É isso: a vida não era o bastante para Virginia Woolf, daí sua necessidade de criar. E como ela foi pródiga ao criar “As Ondas” ... Virgínia criou essa obra com parágrafos e frases com tamanha beleza que não foram raras às vezes que tive a sensação de que ela trocara sua caneta por um pincel. E com que genialidade ela usa a metáfora de um só dia ( do amanhecer até o anoitecer) aos estágios da vida humana : infância , adolescência, juventude, maturidade e a velhice, se utilizando para tal, de seis personagens , dos seis amigos- Jinny, Rhoda, Suzan, Neville ,Louis e Bernard. Cada um desses personagens refletem de forma desordenada ( o tal fluxo de consciência) sobre cada um desses estágios. De forma, que somos levados a acompanhar o olhar ingênuo da infância, a incompreensão do mundo, os arroubos da juventude, as desilusões amorosas, a sensação de não pertinência, as frustrações advindas das aspirações ( como a de Susan com relação ao casamento e filhos), o homossexualismo, a culpa nossa de cada dia, a dor pela partida, pela perda – esta representada por Percival ( um amigo comum a todos) e também por Rhoda, e acompanhamos o olhar multifacetado de Bernard que é quem mais detém as palavras,( embora a minha personagem favorita seja a Suzan ) sobre a felicidade , sobre vida e sobre a inimiga implacável do ser humano.
As Ondas é o livro. As ondas é o livro que eu levaria para uma ilha, visto que ele não tem um enredo, não tem uma história e, portanto, não tira o sabor da leitura por conhecer o final. E mais: é um livro que o leitor abrindo-o em páginas aleatórias irá se deparar com frases ora contundentes, ora de extrema beleza , ora de um brilhantismo que surpreende. Brilhantismo surpreendente e extasiante foi o cenário criando por Virgínia – a trajetória do sol: a incidência da sua luz no mar e em toda a paisagem. Lindooooooooo!!!!!!
Embora Virgínia evoque muitas vezes as ondas, a praia, e possa ser essa uma explicação para o título, no meu entendimento ( e sei que ele não é nada ortodoxo- sequer confiável ele é) o título as Ondas é uma referência à Vida, pois há uma série de repetições, de acontecimentos, de ações humanas, dos dias da semana , repetições estas que são inerentes à vida e que se assemelham aos repetidos fluxo do mar, inclusive , no instantes finais Bernard diz:” (...) A madrugada é uma espécie de caiação do céu; uma espécie de renovação . Outro dia; outra sexta-feira; outro vinte de março; janeiro ou setembro (...) E ainda: “ Sim, esta é a eterna renovação, o incessante erguer-se e cair, cair e erguer-se outra vez”. (pg. 230) .
Bem, não intenciono ir para uma ilha deserta, mas sei que em 2017 encontrarei as mesmas repetições de 2016 ( não é pessimismo – é uma constatação, uma certeza), e eu estarei às voltas com repetidas salas de esperas, então meu livro As Ondas, edição de bolso ( infelizmente – não gosto de edições de bolso ) estará nas minha bolsa e farei repetidas leituras de diversas páginas, como as repetições das ondas