Márcia 21/10/2023
Uma história ambientada na Somália
Pela leitura podemos viajar pelo mundo, conhecer outros povos, culturas, dores, angústias, sonhos. Dessa vez, a parada do @comfbook foi na Somália, descrita e narrada pela escritora somali-britânica Nadifa Mohamed. A moça não é pouca coisa! Além de prêmios, foi considerada, em 2013, pela revista Granta, como uma das melhores jovens escritoras britânicas. Ela nasceu na Somália, mas foi educada em Londres, onde estudou história e política. Mas isso não lhe tira o lugar de uma fantástica escritora somali, pois, como sabemos, nas nossas raízes nos encontramos.
A história é ambientada na cidade de Hargeisa, às vésperas da guerra civil que assola o país. Por meio de sua própria história e de entrevistas, Nadifa nos conduz para a vida, língua e cultura do povo somali, mas em um contexto amargo de guerra, cujas consequências envolvem questões como violência de gênero, exploração, deslocamento forçado e as dificuldades enfrentadas pelos mais vulneráveis em tempos de crise.
A obra é construída em torno de três protagonistas mulheres presas no caos da ditadura e da guerra na Hargeisa de 1987: Deqo, uma menina refugiada de 9 anos, sem família, que vive nas ruas; Kawsar, uma viúva que perdeu a filha pequena, morta ao protestar contra os crimes cometidos pelo exército; e Filsan, uma ambiciosa militar de 30 anos que está cansada dos assédios sofridos dentro do exército. À medida que a trama se desenvolve, acompanhamos a vida individual de cada uma dessas mulheres e, no final, essas vidas se cruzam, para surpresa do leitor, tocado por um realismo devastador, desse tipo aqui:
?O cheiro do banheiro é repugnante, a única janela não é suficiente para secar as paredes úmidas, nem para eliminar o fedor das privadas entupidas: grampos de cabelo retorcidos, pentes quebrados, lâminas de barbear enferrujadas, roupas de baixo manchadas, tudo junto abandonado atrás da porta? ? relato de Filsan, p. 201.
Texto duro e cruel, porém com uma escrita delicada que encanta e provoca reflexões.