z..... 14/12/2016
Para algumas pessoas o "Diário de Anne Frank" é um livro estrategicamente forjado. Isso porque o texto oscila entre percepções pueris e construções consideradas "adultas demais" para uma adolescente. Exemplos estão nos textos sobre as colegas ou relação com o diário, a "Kitty" (nas duas citações destaca-se o lado adolescente, que tem o entusiasmo e enfado inocentes de uma menina) e as considerações que tece em assuntos como o antissemitismo, religião, direitos femininos e a guerra em si, que soam como discursos políticos para certas pessoas. Particularmente, acredito piamente no relato do livro e tenho a intuição de que algumas partes podem ter sido "melhoradas" (uma questão de melhor organização de uma ideia já expressa, como trabalham alguns biógrafos, mas o texto de Anne por si mesmo é positivamente dissertativo e por que a dúvida?). Ora, ela era crítica e refez algumas vezes seus textos como escritora que desejava se tornar.
É aí que entra o valor dessa obra, que mostra, sobretudo, uma Anne Frank em realçada e típica pré-adolescência, como certos críticos desejavam ver na leitura do diário. A literatura é infantojuvenil, tem ilustrações joviais e aquela tensão maior do diário em análise de mundo não é tão enfática na abordagem. Também não se acentuam os conflitos com a mãe (que em certas passagens é pesada e, na minha visão, com disposições negativas da Anne), nem a depressão que, às vezes, à levava a desejar a morte, e nem sua libido aflorada e desejosa de descobertas.
Em linhas gerais, o livro traz para uma narrativa em prosa as páginas do diário, em estilo juvenil, abrindo liberdades também para determinadas reconstituições ou projeções que teriam sido embasadas em relatos fidedignos. O que mais achei interessante, e o que se destaca a meu ver, foi a continuidade da história desde a prisão pelos nazistas até o derradeiro e melancólico fim. É triste, mas é uma lacuna nova (até então apenas na imaginação que o diário instiga no final) a história de Anne como prisioneira e vítima do holocausto.
O livro mexe com minha sensibilidade e provoca angustias. Sofri ao final do relato do diário, naquelas miseráveis e frias linhas anexadas no posfácio. Imagina aqui, com a reconstituição de tudo, como o encontro no campo de concentração com uma de suas amigas da escola (o livro não cita mas, segundo apurei na net, esta menina morreu na câmara de gás). Não tive uma leitura de percepção histórica, mas de afloramento de coisas que acredito serem boas como ser humano. E tem também um pequeno álbum de família com fotos que nunca tinha visto da menina.
Ah, deixaram uma personagem de fora. Não repararam? Para um livro de valorização juvenil não poderiam deixar de fora o gato (ou será gata?) que a família teve por um tempo no anexo escondido. Tô lembrando de um quando li o diário... Tinha ou não tinha? Acho que no diário foi até citado o nome do bichano e agora a autora o deixou de fora... Ah, falha de Janny Van Der Molen.
Legal o livro!