iagofelipeh 08/05/2020
Brutal
Ler Edyr Augusto pela primeira vez foi uma boa experiência. Selva Concreta traz a narrativa visceral da brutalidade urbana de Belém e das cidades circunvizinhas. Drogas, prostituição, traficantes, álcool, milicianos, fama e a própria vida como algo efêmero, além, é claro, de colocar em pouco mais de cem páginas boa parte da essência do que é o Brasil, não apenas no Pará.
Sou do interior do Ceará, atualmente moro na capital. Aqui as paradas estão no mesmo nível ou até piores. Mídia oportunista, alarmismo, fake news, facções criminosas, pessoas acima da lei, etc. O livro gira, especialmente, em volta do delegado de polícia Gil que é um cara extremamente problemático, longe de ser um modelo pra ninguém e, muito menos o que se espera de um profissional (embora essa realidade já seja batida); ainda assim, ele é o mais próximo de um "herói" aqui. Mesmo errante, sempre mostra-se disposto a combater os "chefões do crime", ainda mais quando muitos dos casos denotam interesses pessoais dele, geralmente por envolvimento com mulheres.
Um ponto curioso é que a narrativa traz diversos inícios (e algum desenvolvimento em determinados casos, mas nunca uma solução real pra nada) e frusta o leitor posteriormente. Querendo ou não, esperamos algum tipo de "redenção", mesmo que fosse algo trágico ou subversivo. Todavia, não. Além da linguagem não convencional e, ainda assim, extremamente fluida, temos o que citei como parte da obra, no sentido de que a tal "conclusão" é esta mesmo. Já era, não tem o que fazer em muitos casos. Outros que parecem resolvidos para o público, não passam de um início para o novo ciclo de barbárie. Eis o realismo colocado de modo sutil, contudo tão brutal como a violência narrada.
Vale muito a pena a leitura. E sei que, provavelmente, ele tem livros ainda melhores, isso é incrível.