Mauricio (Vespeiro) 01/10/2017Uma chatíssima perda de tempo.Sob o pretexto de explicar o funcionamento de hábitos nocivos e como alterá-los para que possamos viver melhor, Charles Duhigg transforma uma premissa potencialmente intrigante numa longa e enfadonha pesquisa não-científica. “O Poder do Hábito” nos traz 400 páginas do mais puro empirismo, onde um jornalista tenta embasar seus estudos em relatos, publicações, estatísticas manipuladas e crenças infundadas.
Se você já teve alguma conversa de boteco que tratou de hábitos e rotinas, com uma forcinha do marketing poderá lançar um livro como este. Porém, não é apenas a superficialidade que incomoda. O estilo narrativo de Duhigg é irritante. Seus estudos de caso são relatados de forma fracionada, intercalados com outras histórias. Um método tosco para dramatizar e criar expectativa acerca das conclusões, fazendo com que o foco se perca facilmente. Na ficção talvez funcionasse melhor. O livro foca demais em supostos hábitos corporativos e sociais, porém é vendido como tendo a pretensão de vender soluções e métodos para otimizar hábitos individuais. Isso não acontece. Aliás, muito do que ele denomina como “hábito” (conceito psicológico) nada mais é do que “ciência social” abordada de forma simplificada, sem qualquer credibilidade e - pior - usando números parciais para embasar apenas a parte da história que o apoia. Liguei meu desconfiômetro no vermelho lendo o capítulo sobre a “fantástica” e “extraordinária” Starbucks.
Algo profundamente irritante foi concluir que as últimas 100 páginas (78 com notas) são perfeitamente dispensáveis. Inúteis para quem não quer ler títulos de estudos e publicações, além de longos agradecimentos. Terrível se deparar o tempo todo com o robótico termo “verificação de dados”. Parece que o autor escreveu o livro amparado por três advogados cuidando para que não escrevesse nada que resultasse num processo contra ele. Duhigg é tão teórico que a maior parte dos entrevistados - segundo consta nas próprias notas - NÃO CONFIRMA o que foi escrito no livro.
Por fim, foi desanimador ver o autor inserir furtivamente seu dispensável proselitismo religioso, como se sentisse na obrigação de sufocar o leitor com sua fé. Não é uma forma honesta de abordagem, especialmente controversa quando ele tenta colocar a religião - dissociada de outros valores - como uma nova rotina a fim de alterar um hábito nocivo. Em suma, as 400 páginas poderiam ser resumidas num curto artigo - que, na verdade, existe e foi publicado antes do livro, com bastante sucesso - complementado por alguns exemplos, poupando uma infinidade de árvores de um destino infame. Sinceramente, eu esperava encontrar algo como li em “Freakonomics”, mas voltado ao tema proposto. Profunda decepção.
Está tudo perdido? Não. Pude aproveitar algumas referências a matérias e publicações interessantes, mas invariavelmente sobre temas associados ao principal, não propriamente sobre hábitos. Foi curioso ler a teoria (e, como tudo que li, é apenas teoria) das “pequenas vitórias”. Este é um princípio que adotei durante toda minha vida sem conhecer métodos, rotinas e os tais hábitos angulares. Tive novamente despertado meu interesse sobre o comportamento do consumidor e a ciência do mercado, temas apenas citados, mas não abordados no livro. Gostei de ler sobre os métodos da Target, usando pesquisas comportamentais para individualizar os hábitos de cada comprador.
Mais uma vez há que se lamentar a edição brasileira, com muitos erros de revisão (mesmo trazendo o nome de TRÊS revisores nos créditos), especialmente a partir do capítulo 6.
Nota do livro: 6,31 (3 estrelas).