Jana 27/03/2019
Ainda tentando descobrir se gostei
Mais uma distopia para a conta. Novamente, temos uma jovem lutando contra um antagonista com mania de dominação, num mundo destruído. Acabei de terminar a leitura e estou num embate interno, tentando pesar os prós e os contras, para descobrir se invisto meu rico dinheirinho na sequência - porque, né, TODA distopia tem que ter sequência atualmente. É praticamente uma regra.
Enfim.
Na narrativa de Young, temos um mundo destruído (não sabemos como, mas dá a entender que o ser humano finalmente devastou tudo o que podia), e que foi precariamente reconstruído a moda Mad Max. Há algumas cidades esquisitas onde acontecem lutas de "gladiadores", grupos fechados de ladrões e justiceiros, terras distantes, e por aí vai.
Em uma dessas terras distantes, chamada Lagoa da Prata, vivem os irmãos gêmeos Saba e Lugh. Ele é todo solar, louro, alegre, esforçado. Ela tem cabelos escuros, é mal humorada, soturna e só se importa com uma única pessoa no mundo - o próprio Lugh. Eles ainda tem uma irmãzinha, Emmi, para quem Saba não dá a mínima, e o pai deles, já meio doido e do qual sequer lembro o nome porque ele nem aparece muito.
Todos vivem uma vida tediosa, até que soldados vindos de uma das cidades (na qual vive um autoproclamado rei) aparecem e sequestram o Lugh, porque aparentemente precisam dele para uma espécie de ritual. No ataque, o pai deles acaba morto e Saba toma para si a missão de resgatar seu precioso irmão. A contragosto, ela leva a irmã junto, porque sabe que Lugh ficaria p* da vida se ela abandonasse a guria.
No início, eu gostei da Saba. Ela é super malvadinha, muito mal humorada, bem diferente das protagonistas que costumam surgir nesse tipo de livro. Não tem nada de heroica, em razão de que, mesmo sua missão de resgatar o irmão é mais egoísta do que nobre; Saba quer Lugh de volta porque, simplesmente, não consegue viver sem ele.
Bem, claro que nessa jornada de resgate, Saba acaba conhecendo diversos personagens. Cabe aqui destacar alguns:
- Jack: quase um co-protagonista. É safado e inteligente. Eu realmente pensei que iria adorá-lo, e no início, gostei dele. Mas... Comento a respeito mais para baixo.
- Gaviãs Livres: grupo de ladras/justiceiras que acabam ajudando Saba em diversos momentos.
- Ike: fortão e engraçado, é um grande amigo de Jack. Tem como sua "sombra" um menininho chamado Tommo.
- O Rei e seus Tonton: governante que se auto elegeu, e seus soldadinhos. Controla os súditos com uma espécie de droga em forma de planta, chamada chaal.
- DeMalo: principal soldado do rei, é um cara suspeito, soturno, frio como um freezer.
A jornada de Saba é o que move a narrativa, e tudo o que acontece é em torno do objetivo de salvar Lugh. Já aviso de antemão que a linguagem usada pela autora pode incomodar alguns - como as pessoas são muito simples em seu estilo de vida e naquele cenário distópico não receberam nenhuma educação formal, a fala deles é meio diferente, com algumas letras faltando. E, talvez, para intensificar a sensação de imersão do leitor, Young escolheu escrever exatamente do jeito que eles falam - então tu vai se deparar com palavras como "liberano", "correno" e por aí vai. Achei interessante esse toque, não foi algo que me incomodou.
O que me incomodou foi que essa atenção para o estilo simples dos personagens incluiu também o nosso acesso a informações importantes. Explico: o livro todo é na perspectiva de Saba, e ela não é alguém que reflete muito. Por isso, não temos boas descrições de lugares, ou maiores considerações acerca do tipo de governo, do que aconteceu naquele mundo, porque a sociedade é do jeito que é, etc. Assim, em vários momentos fiquei confusa, com a sensação de que tudo era meio jogado para cima de mim.
Outro problema foi o vilão. Temos um rei, que é o principal antagonista, mas ele foi tão mal desenvolvido que, em nenhum segundo, me passou aquela sensação de perigo, de medo, de tensão. Enxerguei ele como um idiota que só conseguiu algum controle porque chapou todo mundo com o tal do chaal.
Outra situação negativa foi com relação a abordagem de certos personagens: dois em especial, que mereciam maior atenção, e acabaram descartados. Não vou citá-los para não dar spoiler, mas um deles imagino que vá aparecer mais na sequência... O outro é alguém bem legal, mas que desde a primeira aparição eu pensei "hm, esse aí tem jeito de quem vai morrer de forma inútil". Não sou nenhuma guru da literatura, ou seja, se eu pensei isso, quer dizer que estava bem óbvio que esse era o destino dele - e, de fato, sem surpresas, foi o que aconteceu ao personagem.
Tudo isso porque a autora decidiu dar suma importância para o casal.
Acho relevante dizer que cheguei até esse livro porque me disseram 'vai, esse é legal. Não tem triângulo amoroso e o casal não é o foco. Ah, e o casal é super legal, só brigam!'
Ok, pensei, vamos dar uma chance. Até porque, amo casal que fica se bicando.
Mas, cara, não deu. E por essa razão foi que, lá em cima, eu repeti duas vezes "no início". Porque, no início, eu tava gostando da história pelo motivo de que o foco não era o casal. Contudo, depois que Saba e Jack se unem na empreitada, ficou chato. Tensões romântico-sexuais sem graça, briguinhas enfadonhas... O que me encantava na personalidade da Saba ficou entediante, e o Jack me pareceu forçado. Tudo porque os momentos entre eles ficavam repetitivos e tinham espaço demasiado, enquanto que os episódios de ação e de luta eram rápidos demais.
Os pontos positivos continuam sendo a personalidade da protagonista, e a relação que ela desenvolve com outros personagens (que não o Jack). A aproximação da Saba com a Emmi e os progressos que elas vão fazendo conforme vencem os obstáculos é, para mim, o foco do livro. A dinâmica com as Gaviãs Livres também é interessante.
Mas, no fim, na minha opinião, houve falhas na exposição do mundo, na construção do vilão, e no impacto das cenas de ação. Além da previsibilidade na condução da narrativa.
Finalmente, aviso que vááárias pontas soltas ficam ali, se balançando, quando fechamos o livro. Por esse motivo, ainda que haja mais pontos negativos do que positivos, chego aqui com a impressão de que SIM - vou comprar as sequências. Com a esperança de que personagens sejam melhor aproveitados e rezando muito para que a autora não caia na tentação mais popular dos últimos temos ~ o triângulo amoroso.