spoiler visualizarIsa Beneti 15/05/2024
Colonialismo espacial numa era pós-tecnológica
Apesar da escrita lenta e pouco envolvente, o universo complexo e enigmático de Frank Herbert foi suficiente para que eu devorasse esse livro, e ainda me deixou querendo mais.
A história se passa num futuro distante, em que os robôs foram destruídos e proibidos de voltarem a existir. Os humanos, então, aprimoraram suas capacidades mentais, por meio de treinamento, realizado por escolas como a das Bene Gesserit, exclusivas para mulheres e que formam Reverendas Madres (Sacerdotisas), ou os Mentat, que são computadores humanos capazes de computar possibilidades do futuro. Ambos têm suas capacidades mentais expandidas quando se utilizam de Melange, preciosa especiaria extraída no planeta de Arrakis (ou Duna), e cujo comércio é controlado pela Guilda.
Tanto as Bene Gesserit quanto os Mentat são contratados por aristocratas das Casas Maiores, que vivem ao redor do imperador padixá buscando aumentar suas terras, que eles controlam num sistema quase feudal, com títulosde condes e barões. Uma dessas casas é a Artreides, a quem o imperador dá a posse do planeta Arrakis, que há 80 anos estava sob domínio Harkonnen.
É nesse contexto que se inicia o livro: a família Artreides se mudando do planeta Caldan para Arrakis, sua nova posse: um planeta escasso em água e povoadopor vermes e por fremens. Paul Artreides, filho do duque Leto Artreides com a Bene Gesserit Jéssica, tinha apenas 15 anos quando a historia fomeçou, e teve de lidar com a traição de seu professor Yueh, morte de seu pai, fuga para o deserto num ornitóptero e posterior abrigo num sietch (tribo) fremen.
No sietch, foi desafiado por um guerreiro (Jamis) e ganhou, o que só reforçou a crença que começava a existir entre alguns dos fremen de que Paul pudesse ser um messias. Lá, Paul também conhece sua futura concubina e mãe de seu filho: Chani, filha de Liet, um ecólogo que desenvolvera todo um projeto para tornar Arrakis um planeta mais habitável e úmido na superfície.
Esse projeto já vinha sendo executado por fremens como Stilgar, chefe do sietch que os acolheu, e dependia do suborno de agentes da Guilda, que controlavam os satélites, para que ninguém visse o que estava sendo realizado.
Paul se aproveitou dessa premissa e do contexto messiânico/religioso para reunir os fremens sob seu comando e conseguir ser nomeado duque de Arrakis novamente. Com ajuda de sua irmã Alia a Aberração, matou o seu avô (por parte de mãe) barão Harkonnen e, numa batalha, o seu sobrinho Feyd-Rautha. Além disso, força o imperador a casar sua filha, princesa Irulan, com ele, garantindo, então, a sucessão ao trono.
Todo esse enredo é permeado de reflexões muito interessantes de Paul, que desde o início se questiona da sua posição como líder, e busca evitar um jihad (revolução religiosa extremista). Entretanto, ao longo desse romance de formação, percebe-se que o protagonista vai aceitando seu papel como messias e se aproveitando dele para chegar ao poder.
O livro, como um todo, exige bastante do leitor, por criar um universo complexo de personagens, psiques, macro e microeconomias e até mesmo ecologia- um assunto pouco abordado na época em que foi escrito (década de 60). Fora isso, as discussões filosóficas, políticas e morais que permeiam o livro também trazem muita complexidade à história. Afinal, todo capítulo se inicia com um trecho de um livro da princesa Irluan sobre a vida de Paul, e que frequentemente envolve muita reflexões políticas:
"É impossível evitar a ação da política dentro de uma religião ortodoxa. Essa luta pelo poder permeia o treinamento, a educação e o disciplinamento da comunidade ortodoxa."
Além disso, muito da disciplina Bene Gesserit está descrita no livro:
"Não terei medo. O medo mata a mente. O medo é a pequena morte que leva A aniquilação total. Enfrentarei meu medo. Permitirei que passe por cima e através de mim. E, quando tiver passado, voltarei o olho interior para ver se o rastro. Onde o medo não estiver mais, nada haverá. Somente eu restaurei."