Izabella.BaldoAno 29/02/2024
Depois de ler Grande Sertão, fiquei imaginando que é impossível passar ileso a ele. você pode até não gostar, mas não deve ser um livro fácil de esquecer. no meu caso, se tornou uma das melhores experiências de leitura da vida.
aqui conhecemos a história de Riobaldo que, já idoso, fala de suas aventuras - e desventuras - como jagunço, lutando e desbravando os rios (as veredas) ao longo dos sertões de Minas Gerais e da Bahia. ele vai e volta entre passados mais próximos e mais distantes, nos leva pra passear pela sua infância e pela sua juventude, nos apresenta seus momentos de alegria e de dor e, enquanto parece conhecer a si mesmo por meio de sua narrativa, nos permite conhecer a ele, ao seu contexto, seus amores, seus inimigos e tanto mais.
o que primeiro e mais me cativou em Grande Sertão foi a linguagem. Guimarães foi certeiro em dar pra o livro um sotaque muito específico, uma marca poética que é também marca de uma cultura. em muitos momentos, me pareceu que eu estava muito mais escutando do que lendo, tamanha a sensação de oralidade trazida pela narrativa de Riobaldo. as frases que reaparecem como jargões na história, como "viver é muito perigoso" e as dezenas e lindíssimas definições de sertão, são uma forte marca dessa oralidade. eu conseguia ver em Riobaldo um parente idoso contando suas histórias, sentado num banco de cimento na roça, num tempo dilatado de quem aprendeu com a terra a viver sem pressa.
e, claro, junto às guerras de jagunços e a toda a sensibilidade desenvolvida em torno de personagens que aparecem na história do nosso país como um símbolo de brutalidade, o mais bonito tema em Grande Sertão é o amor. aqui, a singeleza de um amor improvável que nasce na neblina ilumina tudo, desde Riobaldo até a gente. Guimarães desenvolveu nessa história um amor socialmente torto, cheio de delicadeza e cuidado, cheio de pudor e amarras mas ao mesmo tempo carregado de uma liberdade difícil de explicar e expressar. um dos amores mais bonitos - talvez o mais - que já vi na literatura.
amor, guerra, poesia e muito mais: ler Grande Sertão foi um descanso na loucura.