Felipe 02/06/2020
Victor Hugo e o Elemento Natural
A história de Os Trabalhadores do Mar se passa em meados do século 19. Gilliatt é um estranho habitante da ilha de Guernesey, no canal da Mancha. Tido como feitiçeiro pela supersticiosa população local, ele leva uma vida solitária e reclusa até se apaixonar por Deruchette, a sobrinha do famoso armador local, Mess Lethierry. Quando Durande, o navio a vapor de Lethierry, vai a pique, Gilliatt empreende uma jornada improvável a fim de resgatar sozinho o motor da embarcação e obter, assim, a mão de sua amada.
Publicado em 1866 pelo aclamado escritor francês Victor Hugo, Os Trabalhadores do Mar compõe a tríade de seus mais famosos romances, ao lado de Os Miseráveis e Notre-Dame de Paris. Como o próprio autor disse, a obra retrata a relação conflituosa e tensa entre homem e natureza. Nessa senda, mostra que, apesar de este dispor de enormes capacidades e poderoso engenho, é ainda deveras impotente diante dos caprichos naturais, os quais podem subjuga-lo sem esforço. Não obstante, há espaço para conquistas, estas reservadas aos bravos e intrépidos espíritos. Gilliatt é um desses, e é capaz de lutar contra os priores elementos a fim de obter aquilo que mais almeja: o amor de Deruchette.
O livro inicia despertando a curiosidade do leitor a respeito do peculiar povo da ilha de Guernesey. A história se torna cada vez mais interessante, ainda que não se apresente um enredo central bem definido. À medida que se aproxima da metade, o enredo toma forma e o descritivismo que domina praticamente oitenta por centro da obra é intensificado.
Vários recursos de linguagem são utilizados, como a gradação, assíndeto, metáforas e prosopopeias, a fim de estabelecer uma ilustração de como se dá o imaginário daquele povo insular. Importa destacar que o autor viveu em um período de exílio em Guernesey, podendo ser o livro interpretado como uma espécie de homenagem aos seus habitantes.
O principal ponto negativo do romance e o descritivismo extenso. Seria possível abreviar um pouco a obra, retirando um pouco desse peso, sem que houvesse empobrecimento. Essa característica acaba por tornar a leitura forçada e enfadonha aos leitores que não são apreciadores do lirismo típico do autor, poeta por excelência. Para compensar, vale dizer que o final é surpreendente e tocante.
Por fim, compete ressaltar o valor que a obra possui, tanto para expor as reflexoes acerca da relação homem/natureza, quanto como uma descrição sociológica do pensamento de um povo. Ademais, o livro claramente serviu de inspiração a outras obras primas, como o excelente 20 Mil Léguas Submarinas de Julio Verne, estabelecendo um marco na literatura classica francesa.