Leila de Carvalho e Gonçalves 11/07/2018
O Símbolo De Uma Nação
Macunaíma, o Herói sem Nenhum Caráter", foi escrito em poucos dias, em dezembro de 1926. Mário de Andrade, o autor, estava de férias na chácara da família em Araraquara e o ponto de partida foi a leitura da obra "Vom Roraima Zum Orinoco", do etnógrafo alemão Koch-Grünberg, que colheu uma série de lendas dos índios taulipangues e arecunás na Amazônia.
Seu gênero é a rapsódia, pois condensa em si as tradições orais e folclóricas de um povo, mas tal qual a "Ilíada" de Homero, possui um caráter épico, a medida que narra a vida de uma personagem que simboloza uma nação.
Inserido na Semana de Até Moderna de 1922, sua proposta é elaborar o perfil de nosso povo. Indubitavelmente, uma proposta ousada, pois exibe um nacionalismo distinto dos escritores românticos que idealizavam a figura do índio. Em síntese, através de uma perspectiva crítica, Mário de Andrade tenta esclarecer o que é ser brasileiro.
Sua história contraria a lógica e a realidade, sobretudo, exige que o leitor estabeleça um pacto com a fantasia, isto é, aceite que o protagonista morra duas vezes ou embranqueça ao banhar-se na poça de um rio. Alguns aspetos merecem destaque, por exemplo:
- Macunaíma é um "herói do mato", ameaçado pela civilização urbana e pelo progresso industrial. É "sem caráter", a medida que representa uma nação "sem identidade", semelhante a uma colcha de retalhos formada por diversas culturas.
- No livro, o autor usa e abusa da linguagem. Despreza a norma culta, emprega neologismos, vocábulos indígenas, africanos, expressões e provérbios populares. Esse fato, torna a narrativa linguisticamente rica, mas em alguns momentos, cansativa.
- Intencionalmente, a narrativa brinca com a geografia do Brasil: "a personagem vai de um Estado para outro como quem atravessa uma rua."
- O desconhecimento das lendas e do folclore latino-americano causa estranheza, provocando distanciamento e uma certa incompreensão por parte do leitor.
"Macunaíma" é uma aventura arriscada, enriquecedora que merece ser conhecida. Apesar de toda dificuldade a ser superada, é reconhecidamente genial e de importância fundamental na literatura brasileira.