regifreitas 22/06/2023
A FÁBRICA DE CRETINOS DIGITAIS: OS PERIGOS DAS TELAS PARA NOSSAS CRIANÇAS (La fabrique du crétin digital: les dangers des écrans pour nos enfants, 2019), de Michel Desmurget; tradução Mauro Pinheiro.
Antes de tudo, acho muito importante conhecer as credenciais do autor deste livro. Até por ser uma leitura controversa para muitas pessoas.
Assim: "Michel Desmurget é um pesquisador francês especializado em neurociência cognitiva. Em 2011, foi nomeado diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica da França (INSERM). Atuou por quase oito anos em várias universidades americanas, incluindo o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), a Universidade Emory e a Universidade da Califórnia em São Francisco".
Desmurget procura, nesta obra, explorar o impacto negativo da tecnologia e das redes sociais, principalmente sobre as crianças. Logo de início, ele contesta o otimismo de psiquiatras, universitários, pediatras, sociólogos e jornalistas sobre os chamados "nativos digitais". Estes seriam parte da atual geração, já nascida nos tempos digitais e que, por conta disso, teriam o cérebro já adaptado - para melhor - aos novos tempos. Esse cérebro teria se tornado "mais rápido, mais reativo, mais apto à multiplicidade simultânea de tarefas, mais competente para sintetizar o imenso fluxo de informações, mais adaptado ao trabalho colaborativo".
Contudo, o autor cita inúmeros estudos e pesquisas que demonstram justamente o contrário - influências negativas dos dispositivos digitais atuais sobre o desenvolvimento. "Todas as dimensões estariam sendo afetadas, desde o somático (obesidade, maturação cardiovascular), até o emocional (por exemplo, a agressividade, a ansiedade), passando pelo cognitivo (por exemplo, linguagem, concentração)[...]". Os maiores danos se concentrariam na faixa até 10 anos, justamente por ser este um período crítico na formação e desenvolvimento cerebral destas crianças. Mas o autor também sugere que os jovens até 18 anos - ou até um pouco mais -, deveriam ter um regime diário de uso do digital - mesmo em sala de aula - reduzido ao essencial, por conta das influências negativas das telas.
É uma leitura muito interessante e importante, muito bem fundamentada e fartamente documentada. Para se ter uma ideia, são 67 páginas apenas das fontes e referências citadas pelo autor. Contudo, mesmo eu, que me interesso muito pelo tema, achei a obra cansativa às vezes, por conta do excesso de números e percentagens dos vários estudos citados por Desmurget. Em virtude disso, a leitura demandou um tempo maior do que costumo dedicar a esse tipo de obra. Mesmo valendo muito a pena, talvez esse seja, infelizmente, um empecilho que pode afastar muitos leitores, principalmente pais e professores, de conhecer uma obra tão relevante para os dias de hoje.